ACABOU-SE O RIO DOCE E AGORA O PARAOPEBAS!
Um refeitório com dezenas de
funcionários almoçando. Uma pousada. Vários veículos. Centenas de hectares.
Tudo foi coberto por uma enxurrada de lama que devastou parte de
Brumadinho (MG), depois do rompimento de uma das barragens da mineradora Vale na
sexta-feira (25). Desde então, equipes de resgate trabalham na busca por
sobreviventes.
Mas a maior parte dos resgatados
são corpos, em uma tragédia humana ainda mais grave do que a que acometeu, há
três anos, a cidade de Mariana -- também em Minas Gerais, também
envolvendo a Vale. Como os resgates ainda estão em andamento e devem se
estender por semanas, o número de vítimas deve crescer.
Imagens mostram o antes e o depois
da área da barragem que se rompeu na mina do Córrego do Feijão, um distrito de
Brumadinho.
E foram 12 milhões de metros
cúbicos dessa terra rejeitada pela mineração que devastou parte de Brumadinho,
cidade próxima a Belo Horizonte com pouco menos de 40 mil habitantes. As
imagens abaixo testemunham o que havia na região e o que restou. A
primeira desta série mostra o centro administrativo da Vale e a pousada
Nova Estância, em imagem captada por um satélite da Agência Espacial
Europeia, antes e depois do desastre. Nas fotos grandes, estão as imagens do
antes e do depois.
Nas imagens, é possível ver a
barragem 6, que tem água para recirculação dos trabalhos da mina Córrego
do Feijão.
Na imagem, nota-se que a onda de lama desceu muito próxima da estrutura da barragem. Ela quase se rompeu no domingo devido ao seu volume de armazenamento após uma forte chuva depois da tragédia --ela precisou ser drenada até não apresentar riscos à população.
Na imagem, nota-se que a onda de lama desceu muito próxima da estrutura da barragem. Ela quase se rompeu no domingo devido ao seu volume de armazenamento após uma forte chuva depois da tragédia --ela precisou ser drenada até não apresentar riscos à população.
O Brasil, lamentavelmente, tem
destaque nessa lista por ser o país com o maior número. Foram três acidentes
com perda humana ou grave dano ambiental de 2014 para cá: rompimento de uma
barragem da Herculano Mineração, em Itabirito (MG), em 2014, com três mortes; o
vazamento na barragem do Fundão, em Mariana (MG), em 2015, com 19 mortes; e,
agora, a tragédia com grande perda de vidas, em Brumadinho
Segundo o relatório da ONU,
publicado no ano passado, o evento mais trágico envolvendo barragens de minério
nos últimos 34 anos foi em 1985, no norte da Itália. Na hora do almoço, 180 mil
metros cúbicos de lama da barragem administrada pela Prealpi Mineraria varreram
as cidades de Stava e Tesero, matando 267 pessoas, entre as quais famílias inteiras.
Em Stava, um memorial com uma estátua de bronze foi erguido em homenagem às vítimas.
A escultura retrata a cena dramática vista pelas equipes de resgates: dezenas de homens, mulheres e crianças foram encontrados mortos, envoltos em lama, com as mãos erguidas na frente do rosto, numa última tentativa de se proteger.
Em Stava, um memorial com uma estátua de bronze foi erguido em homenagem às vítimas.
A escultura retrata a cena dramática vista pelas equipes de resgates: dezenas de homens, mulheres e crianças foram encontrados mortos, envoltos em lama, com as mãos erguidas na frente do rosto, numa última tentativa de se proteger.
"Eles não tiveram chance de
escapar quando o tsunami de lama desceu o vale, na hora do almoço, num dia
ensolarado de julho", descreve o relatório das Nações Unidas. Agora, o
rompimento da barragem em Brumadinho caminha para superar a tragédia da Itália
em perdas humanas. Foram encontrados, até o momento, 65 corpos e pelo menos 279
pessoas continuam desaparecidas.
"A tragédia em Brumadinho estará, certamente, no topo dos maiores desastres com rompimento de barragem de minério do mundo. Infelizmente, é possível que ultrapasse Stava, que foi a maior tragédia do tipo nos últimos 34 anos", afirmou à BBC News Brasil o geólogo Alex Cardoso Bastos.
"A tragédia em Brumadinho estará, certamente, no topo dos maiores desastres com rompimento de barragem de minério do mundo. Infelizmente, é possível que ultrapasse Stava, que foi a maior tragédia do tipo nos últimos 34 anos", afirmou à BBC News Brasil o geólogo Alex Cardoso Bastos.
Agora, o rompimento da barragem em
Brumadinho caminha para superar a tragédia da Itália em perdas humanas. Foram
encontrados, até o momento, 65 corpos e pelo menos 279 pessoas continuam
desaparecidas. "A tragédia em Brumadinho estará, certamente, no topo dos
maiores desastres com rompimento de barragem de minério do mundo. Infelizmente,
é possível que ultrapasse Stava, que foi a maior tragédia do tipo nos últimos
34 anos", afirmou à BBC News Brasil o geólogo Alex Cardoso Bastos, um dos
autores do relatório da ONU sobre barragem de minério.
Se o rompimento em Brumadinho pode
se tornar o pior das últimas décadas em número de mortos, o da barragem da
Samarco - uma joint-venture entre a Vale S.A. e a anglo-australiana BHP
Billiton - na região de Mariana (MG), em 2015, é o mais grave desastre
ambiental da história provocado por vazamento de minério.
O mar de lama causou destruição à vida marinha no Rio Doce, afetando drasticamente a vida da população local. "O aniquilamento dos ecossistemas de água potável, vida marinha e mata ciliar eliminou recursos naturais insubstituíveis para a vida ribeirinha, para pesca, a agricultura e o turismo", diz trecho do relatório da ONU, intitulado Mine Tailing Storage: Safety is no Accident.
O mar de lama causou destruição à vida marinha no Rio Doce, afetando drasticamente a vida da população local. "O aniquilamento dos ecossistemas de água potável, vida marinha e mata ciliar eliminou recursos naturais insubstituíveis para a vida ribeirinha, para pesca, a agricultura e o turismo", diz trecho do relatório da ONU, intitulado Mine Tailing Storage: Safety is no Accident.
Segundo Alex Bastos, que também é
professor de Geologia da Universidade Federal do Espírito Santo, as Nações
Unidas utilizam um sistema de classificação de gravidade de desastres que leva
em conta volume de rejeitos espalhados, tamanho da área afetada e número de
mortos.
É considerado um "desastre de alta gravidade" um rompimento de barragem que provoque vazamento de mais de 1 milhão de metros cúbicos, afetando uma área de pelo menos 20 km, e causando cerca de 20 mortes.
É considerado um "desastre de alta gravidade" um rompimento de barragem que provoque vazamento de mais de 1 milhão de metros cúbicos, afetando uma área de pelo menos 20 km, e causando cerca de 20 mortes.
A barragem de Fundão, em Mariana,
gerou um vazamento de mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos, que
percorreram mais de 600 km. E 19 pessoas morreram. Já o rompimento da barragem
da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, espalhou 12 milhões de metros cúbicos
por mais de 46 km. O número confirmado de mortos já chega a 65 e o de
desaparecidos, a 279. "O de Mariana não é o pior em termos de fatalidade,
mas em volume e distância percorrida, é o maior desastre ambiental por
rompimento de barragem.
E o de Brumadinho deve ser o maior desastre em termos de tragédia humana das últimas décadas", afirma Alex Bastos, que integra o comitê da ONU sobre barragens de minério.
E o de Brumadinho deve ser o maior desastre em termos de tragédia humana das últimas décadas", afirma Alex Bastos, que integra o comitê da ONU sobre barragens de minério.
"Ou seja, esses dois casos
estão no top 1 e 2 do mundo em termos de gravidade. Infelizmente, os dois
maiores rompimentos de barragem do mundo serão no Brasil. Aliás, no Estado de
Minas Gerais, a menos de 150 km um do outro", lamenta.
O barato que sai caro Atualmente, o Brasil tem 430 barragens de minério, segundo relatório da Agência Nacional de Águas (ANA). Tanto a barragem de Brumadinho quanto a de Mariana são do tipo "à montante", feitas com os próprios rejeitos. Neste caso, os detritos minerais, rochas e terras escavadas durante a mineração - e descartados por não terem valor comercial - são depositados em camadas num vale, formando a barragem.
O barato que sai caro Atualmente, o Brasil tem 430 barragens de minério, segundo relatório da Agência Nacional de Águas (ANA). Tanto a barragem de Brumadinho quanto a de Mariana são do tipo "à montante", feitas com os próprios rejeitos. Neste caso, os detritos minerais, rochas e terras escavadas durante a mineração - e descartados por não terem valor comercial - são depositados em camadas num vale, formando a barragem.
Neste caso, os detritos minerais,
rochas e terras escavadas durante a mineração - e descartados por não terem valor
comercial - são depositados em camadas num vale, formando a barragem. Esse tipo
de "lixão de minério" é mais barato para as empresas. Mas é, também,
o que oferece mais riscos. "Quando a gente imagina uma barragem, tende a
pensar num muro de concreto. Mas essas não são feitas com concreto, são feitas
com a compactação do próprio rejeito. Isso faz com que a manutenção e
monitoramento sejam muito mais importantes, porque essas barragens podem sofrer
erosão por fora", diz Alex Bastos. "Os rejeitos precisam ficar secos
e consolidados, por isso é importante haver um sistema eficiente de drenagem.
Em Mariana, a base da barragem começou a solapar, perder estabilidade, e
rompeu." Uma alternativa mais segura a esse tipo de barragem é a
armazenagem a seco de rejeitos minerais. Mas a técnica é mais custosa.
"O benefício é que os rejeitos
não ficam confinados em barragens que podem romper. Mas o custo para secar os
rejeitos e armazená-los em silos é muito mais alto", diz Bastos. Os erros
mais comuns O relatório das Nações Unidas elenca as principais causas de rompimentos
de barragens. O documento afirma que chuvas fortes e prolongadas, furacões e
abalos sísmicos podem provocar rupturas ou transbordamentos. Mas, mesmo nesses
casos, a ONU considera que houve erro humano, já que o planejamento de risco
para manutenção e construção da barragem deve levar em conta as condições
climáticas do local. No caso da barragem de Mariana, as investigações
concluíram que houve falhas na na construção da barragem, na manutenção e no
monitoramento. "A conclusão do estudo é que existem dois motivos
causadores de rompimentos: erro na análise de risco e negligência na manutenção
da barragem", resume Alex Bastos. "Ou seja, se teve uma chuva
torrencial que causou transbordamento da barragem, houve aí um erro na análise
de risco. Se a região
está sujeita a uma chuva assim, a estrutura da barragem deveria ser outra. A
análise de risco tem que ser precisa", afirma. Um problema recorrente
mencionado no relatório da ONU é o fato de barragens originalmente construídas
para armazenar determinado volume serem modificadas ao longo do tempo para
guardar quantidades adicionais de rejeitos
Nesses casos, nem sempre é feita
uma reestruturação adequada para garantir que a estrutura seja capaz de
suportar o material descartado das minas. "Muitas dessas barragens foram
crescendo, aumentando de tamanho, e isso não seguiu o planejamento inicial da
barragem. É como se você fosse fazendo puxadinhos em vez de consertar e refazer
o projeto", critica Bastos. A barragem que rompeu em Brumadinho foi
construída em 1976 e tinha volume de 12 milhões de metros cúbicos. Ela estava
desativada desde 2015, ou seja, não recebia rejeitos desde então. Em 2018, a
Vale recebeu licenciamento para reutilizar parte do rejeito e depois ser
"descomissionada"- passar por uma extensa obra para deixar de ser
barragem, se tornando, por exemplo, um morro.
Por que Brasil é campeão em
acidentes graves
O Brasil é o país que teve, nos últimos dez anos, o maior
número de casos graves de rompimento de barragens de mineração, conforme o
relatório da ONU.
Outras nações que também tiveram
casos recentes de vazamento de minério são China, Estados Unidos, Israel,
Canadá e México. Por um lado, é importante considerar que o Brasil é o segundo
maior exportador de minério, atrás apenas da Austrália. Tem mais minas,
portanto, estatisticamente a possibilidade de acidentes é maior. Por outro
lado, segundo a ONU, muitos desses acidentes poderiam ser evitados se as
empresas investissem em sistemas mais seguros de armazenamento de rejeitos ou em manutenção eficaz. O relatório das
Nações Unidas aponta que já existem protocolos de segurança e tecnologias
alternativas suficientes para evitar acidentes com rejeitos minerais.
O problema, ressalta a ONU, é que
as empresas, ao investirem em barragens "à montante", avaliam
segurança em conjunto com custo. E, não raro, optam por procedimentos mais
baratos, porém menos seguros. "É preciso que as empresas coloquem segurança
em primeiro lugar, priorizando a proteção ambiental e humana. As agências
reguladoras, as indústrias e as comunidades devem adotar um objetivo de
falha-zero no armazenamento de rejeitos", diz o relatório das Nações
Unidas. Para isso, a recomendação é que "questões de segurança sejam
avaliadas separadamente de considerações econômicas". "Custo não pode
ser um fator determinante." Na noite de sábado, o ministro-chefe do
Gabinete de Segurança Institucional, eneral Augusto Heleno, disse que o governo pretende realizar
vistorias em todas as barragens do país que "ofereçam maior risco".
"É importante e urgente que aquelas barragens, no Brasil inteiro, que
ofereçam maior risco sejam submetidas a uma nova vistoria, para que nós
possamos nos antecipar, na medida do possível, a novos desastres",declarou.
Segundo Relatório de Segurança da Agência Nacional de Águas, 45 barragens
apresentam alto risco atualmente no país. A barragem da Vale em Brumadinho era
classificada como de "baixo risco" e "alto potencial de
danos". Só a segunda avaliação se confirmou. Outros casos graves pelo
mundo O relatório das Nações Unidas afirma que, nas últimas três décadas, o número
de falhas em barragens diminuiu, mas os casos de rompimento foram mais graves.
Entre os piores desastres ambientais, depois de Mariana, está o rompimento da
barragem da mina de ouro Mount Polly, em British Columbia, no Canadá, em 2014.
A barragem se rompeu liberando 25 milhões de metros cúbicos de rejeitos. O
acidente ocorreu numa área pouco populosa, portanto, não houve mortes. Mas a
destruição da fauna e flora locais foi grave. O acidente no Canadá pode ser
considerado um caso típico da prática do "puxadinho" mencionado por
Alex Bastos. Segundo o relatório das Nações Unidas, a barragem aumentou nove
andares de tamanho após entrar em operação, alcançando 40 metros de altura,
além do que previa o projeto original. Pouco antes de romper, a mina ainda
tentava conseguir aprovação para aumentar mais um andar. O mar de lama invadiu
uma área de preservação ambiental e o lago Quesnel, um dos mais profundos lagos
glaciais do mundo, e importante fonte de subsistência para a população indígena
da região, que costumava pescar lá.
O lago possuia uma grande
quantidade de salmões, trutas e outras espécies de peixe. As investigações
revelaram falhas no projeto da barragem, que não levou em consideração
características geológicas da região. Também foram encontrados erros nas
avaliações de risco e nos relatórios de inspeção, que não levaram em conta as
possibilidades de erosão e transbordamento. O Ministério de Minas e Energia
também foi responsabilizado por falhar na fiscalização.
Filipinas
Outro desastre ambiental com
consequências sérias para a população ribeirinha foi o colapso de uma barragem
da Marcopper Mining Corporation, no Monte Tapian, nas Filipinas. Rejeitos da
mina de ouro foram acumulados num poço de concreto. Após quatro anos da
prática, em 1996, um dos túneis do poço cedeu, liberando até 4 milhões de
toneladas de metal no rio Boac e matando o seu ecossistema. "Esse foi um
dos mais catastróficos desastres com mina da história", diz o relatório da
ONU. Mais uma vez erros no manuseio da barragem, na manutenção e no projeto de
avaliação de risco foram citados como causa do desastre 'Pior desastre ambiental
na Europa desde Chernobyl'
Na Europa, o pior desastre causado
por rompimento de mina foi na Romênia, no ano 2000. Metais pesados da mina de
ouro Baia Mare, no condado de Maramures, invadiram o rio Tisza, um dos maiores
afluentes do rio Danúbio. "De 50 a 100 toneladas de cianeto e cobre foram
liberados, fazendo desse acidente o pior desastre ambiental desde
Chernobyl", diz o relatório das Nações Unidas, em referência ao acidente
nuclear ocorrido em 1986, na Ucrânia.
De acordo com a ONU, os rejeitos passaram
da Romênia para Hungria, Sérvia e Bulgária até chegar ao Mar Negro, matando
mais de 1.240 toneladas de peixes.
"A falha foi causada por uma
combinação de erros no projeto de construção, falhas na avaliação das condições
de operação e fortes chuvas e nevascas que resultaram no transbordamento",
diz o documento das Nações Unidas.
Com informações de: