Todo mundo supõe que exista muita
corrupção nas câmaras legislativas. Uma das formas mais canalhas é a formação
de caixa 2 nos gabinetes parlamentares, através da apropriação indébita de até
a metade dos salários dos nomeados para cargos de confiança. Esta condenável
prática é muito comum nas câmaras municipais, nas assembléias legislativas
estaduais e até na Câmara dos Deputados e no Senado.
Trata-se de uma sacanagem praticada
pela maioria dos parlamentares. No entanto, o assunto ainda é um tabu. Embora
grande parte da imprensa especializada na cobertura do legislativo tenha pleno
conhecimento de tudo de errado que ocorre nos bastidores, nada é divulgado
abertamente. Os recentes escândalos na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro
podem ajudar a desvendar como funcionam diferentes modalidades de falcatruas
que passam despercebidas do eleitorado, envolvendo ganhos ilícitos de parlamentares
e servidores públicos.
Felizmente, uma parlamentar que
assume a partir de 15 de março promete romper com o criminoso silêncio. A
advogada Janaína Paschoal, eleita com votação recorde para a Assembléia
Legislativa de São Paulo, já anunciou que vai comprar essa briga. No final do
ano, ela postou um depoimento nas redes sociais que foi absolutamente ignorado
pela grande imprensa. O Alerta Total reproduz o pensamento de
Janaína sobre o grave assunto.
1) Bom dia, Amados! Eu iria tratar
deste tema mais adiante, porém, os fatos me forçam a falar antes. Espero que
entendam que as considerações que farei aqui não têm o intuito de avaliar o
mérito de nenhuma situação em especial, mas discutir (em teoria) prática a ser
coibida.
2) Muito antes do relatório do
COAF, que vem sendo largamente discutido, o funcionário responsável pela
Corregedoria da Alesp montou um curso para os Deputados eleitos, com o objetivo
de alertá-los de alguns problemas que podem
3) O curso, apesar de durar uma única tarde, foi bastante detalhado e o funcionário falou sobre práticas que ensejam a movimentação da Corregedoria naquela Casa. O funcionário falou genericamente, pois os procedimentos são sigilosos. Ele não pode dar nomes.
4) Dentre as práticas investigadas
pela Corregedoria está a devolução de salário por parte de assessores. Explico:
cada deputado pode contratar até 32 assessores (estou falando da Assembleia de
São Paulo). Os salários são muito bons, quando se compara com o mercado.
5) Com os salários oferecidos pela
Casa, o Deputado pode procurar bons quadros, pessoas especializadas e/ou
pessoas dispostas a trabalhar muito em prol do bem público. No entanto, algumas
vezes, o parlamentar prefere contratar alguém com capacitação incompatível com
o salário.
6) E por quê? Porque esse alguém
vai ficar muito satisfeito com uma parte do salário pago e, para mantê-lo, vai
devolver uma boa parte ao parlamentar. Haja vista que essa verba (para
contratação) fica à disposição do Deputado, algumas pessoas acham natural a
devolução (?!)
7) Com a chatice que me é peculiar,
eu perguntei por qual razão os funcionários não denunciam. O funcionário da
Corregedoria me explicou que o funcionário que denuncia é ele próprio
"enquadrado" em irregularidade, exonerado e (pasmem) obrigado a
devolver todos os salários!
8) Entendam, como se não bastasse o
cidadão ter devolvido parte do salário o período todo em que trabalhou, uma vez
denunciada a situação, o infeliz precisa indenizar o erário, entregando o
correspondente a todos os seus salários na íntegra!
9) Diante desse esclarecimento, eu
ponderei: Mas assim vocês não vão pegar ninguém! O funcionário precisa ser
acolhido em seu relato! Claro que precisará provar o alegado, mas se for
tratado como bandido, não vai denunciar nunca! Qualquer Manual de Compliance
ensina isso!
10) O palestrante, gentilmente, me
explicou que o cidadão não é vítima, pois se beneficia do esquema durante muito
tempo e, só quando demitido, decide denunciar. Eu até entendo que seja isso
mesmo, mas precisamos encontrar instrumentos para coibir e não para
incentivar...
11) Um sistema só funciona quando
há incentivos ao comportamento lícito! Punir o funcionário incentiva o
comportamento ilícito!
12) Esse tipo de prática, não
importa a pessoa, não importa o partido, precisa ser coibida. A lógica da
contratação precisa ser a capacidade do contratado e não a disponibilidade em
dividir seus ganhos com o chefe.
13) Tenho tentado explicar às
pessoas que esse tipo de prática é bem mais deletéria do que parece, pois, com
o tempo, o parlamentar para de procurar pessoas competentes e passa a buscar
pessoas rasas e inseguras, que se submetem.
14) Pior, não raras vezes, o
parlamentar contrata pessoas que sequer comparecem para trabalhar, pois o fim é
apenas obter o salário de volta! Quero deixar muito claro que não estou falando
nem de A, nem de B. Quero deixar bem claro que estou falando do Brasil que
queremos ter!
15) Ao conversar com as pessoas
(não necessariamente do mundo político), eu costumo ouvir que sou muito
exagerada, que não adianta economizar, pois o dinheiro volta e outro gasta (de
forma lícita, ou ilícita).
16) Posso ser insuportavelmente
chata, posso viver em um mundo que ainda não existe. Mas estou trabalhando para
torná-lo real. No mínimo, nós precisamos falar sobre isso. Precisamos entender
que alguns hábitos não são naturais, não fazem parte... ou nunca sairemos desse
lamaçal!
17) Uma movimentação estranha, como
toda a Imprensa vem dizendo (responsavelmente), não implica ilicitude. Mas se
os investigadores quiserem mesmo chegar a algum lugar, precisam dar alguma
garantia aos assessores, para que eles falem...
18) Se Deus assim permitir, tomo
posse em 15 de março. Já digo logo, publicamente, se alguém (em qualquer
situação) pedir dinheiro em meu nome (ou qualquer outro tipo de vantagem), por
mais próximo que seja esse alguém, pode chamar a Polícia, pois é bandido.
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Retorno para concluir: O trabalho
corajoso da Janaína Paschoal deveria ser multiplicado pelas câmaras
legislativas do Brasil afora. É fundamental combater as variadas formas de
enriquecimento ilícito de parlamentares e servidores públicos. A usurpação
ilegal de salários dos ocupantes de cargos em comissão é apenas uma delas.
Também ocorre muita fraude com a manipulação indevida das polpudas verbas de
gabinetes.
É por isso que o patrimônio dos
parlamentares e de seus principais assessores evolui, de forma impressionante e
incompatível com seus meros “proventos” de vereadores, deputados e senadores.
Os eleitores esclarecidos e mobilizados devem colaborar com a iniciativa da
Janaína Paschoal, acompanhando o que acontece no submundo das câmaras municipais,
assembléias legislativas, Câmara dos Deputados e Senado Federal.
O Brasil só será efetivamente
passado a limpo se todos colaborarem, fazendo muita pressão e fiscalizando os
mandatos de “Suas Excelências”.
De: Alertatotal.com
Jorge Serrão.