Lendo um matéria na Revista Época sobre Régis Debray,
filósofo e mentor do marxismo na França, que foi um dos cérebros da esquerda em
todo o mundo, amigo de Che Guevara com quem pegou em armas e foi até preso, e
de Fidel Castro em Cuba com quem discutia os fundamentos do socialismo e do
comunismo aplicados a América Latina, fiquei surpreso com a maneira como ele
mudou os seus conceitos calcados todos eles nos dogmas de Karl Marx e Lênin.
Nesta resposta sobre a situação dos refugiados que morrem às
centenas quase todo dia tentando entrar na Europa, ele deixa claro que é a
esquerda burra e teimosa, a grande prejudicada pelos fatos que estão ocorrendo
e p-elas hiordas de refugiados que
procuram seu espaço longe dos conflitos em seus países.
Ou seja; o sujeito tem visão e sabe onde deve se mudar
quando se erra na trajetória política.
Coisa que nunca vai acontecer aqui nos trópicos com a estúpida
esquerda petista, que defeca e pisa na caca sem noção de que o fim do
socialismo, passo número para o comunismo totalitário, ou sua mudança já se dá
em todo o mundo:
Inteligente e esclarecedor até para quem, não entende nada
de política mas sofre as consequências de seus desatinos todos os dias!
EPOCA – A migração de massas de refugiados parece colocar os
governos na Europa diante de um dilema sem solução.
Debray – “É nosso problema mais grave e será o maior
fenômeno do século 21. Não migram porque a grama do vizinho é mais verde. Não
há grama nesses países do Sul. Essas populações estão a seco. A esquerda está
diante de uma grande contradição. As camadas mais pobres são as mais alérgicas
à entrada de imigrantes porque arruínam suas chances de emprego e mudam seu
modo de vida. Os ricos não se importam tanto. Os imigrantes não se instalarão
na Place de la Concorde (risos). Eles irão para as banlieues (os subúrbios
carentes, a periferia). É um paradoxo louco: o eleitorado da esquerda
tradicional é hoje formado por privilegiados e o eleitorado da extrema-direita
é formado pelo povo. O eleitor comunista do passado vota em Marine Le Pen (do
partido Frente Nacional). O mundo sem fronteiras é um pesadelo, não um sonho”.
AQUI A ENTREVISTA:
A primeira vez que o parisiense Régis Debray veio ao Rio de
Janeiro foi em 1964, após o golpe militar, para tentar contatar Carlos
Marighella. Tinha 24 anos. Era só uma passagem para Cuba, onde ficou amigo de
Fidel Castro. Debray se lançou à guerrilha armada ao lado de Che Guevara. Foi
preso na Bolívia e condenado à pena máxima de 30 anos de prisão. Ficou atrás
das grades de abril de 1967 a dezembro de 1970, quase quatro anos, e foi
libertado devido a uma campanha internacional de intelectuais liderada por
Jean-Paul Sartre. De lá para cá, mudou muito. De revolucionário, tornou-se um
“reformista radical”. “Porque continuei a viver nestes últimos 50 anos”, diz,
em frente à Praia de Copacabana. Escritor, filósofo, pensador de esquerda,
assessor do presidente François Mitterrand de 1981 a 1985, Debray é proibido de
entrar nos Estados Unidos. Até quando os americanos considerarão perigoso esse
senhor elegante de quase 75 anos, com olhos azuis sagazes? Debray pede “dois
cafezinhos” e escolhe as palavras para não parecer arrogante. O culto obsessivo
do corpo e não do espírito é o que mais o intriga no Rio de Janeiro, onde
esteve recentemente para dar uma conferência sobre globalização e religião a
convite do professor Candido Mendes. Ele se pergunta: como inocular o valor da
palavra, da leitura e das ideias num lugar banhado por tanta beleza natural,
onde “todos são bonitos e musculosos e jogam futebol o dia inteiro”? “Engajado
mas cético”, Debray recusa apaixonadamente o rótulo de intelectual – “são todos
uns farsantes”. Eis alguns trechos da conversa na segunda-feira, dia 10, num
inverno carioca de sol e céu azul.
ÉPOCA – O que o senhor acha do populismo em voga na América
Latina?
Régis Debray – Não tenho mais a informação da experiência na
América Latina. Um brasileiro que desembarca na França e diz que (o presidente
François) Hollande “é um idiota” pode até não estar enganado, mas erra ao
declarar. Estou fora daqui há meio século. Em tese, posso dizer que o
caudilhismo sempre me despertou certa reserva. O caudilhismo está inscrito na
cultura da América Latina, é simpático ao povo, mas impede a construção de um
Estado que crie uma permanência e consolide as instituições. O Estado pode ser
animado por uma pessoa, mas não pode se confundir com uma pessoa. Os regimes
personalistas costumam terminar junto com a pessoa que assumiu o poder. Conheci
(Hugo) Chávez, porque ele ia a Paris. Eu simpatizava com o homem Chávez, mas
nunca aceitei seus convites para ir à Venezuela, porque não queria participar
de nenhuma propaganda.
ÉPOCA – O que dizer a eleitores de esquerda que votaram em
Lula e Dilma atraídos pela bandeira da ética, na crença de que seriam governos
incorruptíveis?
Debray – Depende do tipo de corrupção: do dinheiro ou das
promessas? A corrupção moral na política não é só comum, é indispensável
(sorrisos). Numa democracia, a única maneira de chegar ao poder é fazendo
promessas. Todas as campanhas eleitorais são mentirosas. Prometer é enganar.
Políticos querem seduzir a qualquer preço. O oportunismo é a base desse
exercício. Envolver-se com a política é o mesmo que se preparar para uma desilusão.
A política, por definição, é uma decepção.
ÉPOCA – Não há políticos que não se deixem corromper?
Debray – O incorruptível, na França, era o apelido de
Robespierre (1758-1794). E ele era o terror. Mas não só. Defendeu a abolição da
escravidão nas colônias francesas, por exemplo. Mas ao mesmo tempo mandou matar
na guilhotina milhares de pessoas (entre elas companheiros revolucionários como
Danton). E se intitulava “o incorruptível”. A realidade é a corrupção. Somos
todos corrompidos, de uma maneira ou de outra. A única forma de se manter
incorruptível é permanecer dentro de seu quarto. Se você sai à rua e ainda por
cima assume o poder, já faz concessões, assume compromissos. Para transformar o
mundo, é preciso entrar nele.
ÉPOCA – Como definiria o exercício da política real?
Debray – O poder político consiste em administrar as ilusões.
Quando um político se dirige à esquerda, ele promete justiça e igualdade.
Quando se dirige à direita, promete eficiência, lucro e sucesso. Normalmente,
as promessas não são cumpridas.
ÉPOCA – O voto popular ainda é transformador?
Debray – O que acaba de acontecer na Grécia revelou algo
terrível: pode haver democracia sem povo. Vota-se, mas as decisões finais
ocorrem em outro nível, mais alto e não nacional, de uma burocracia financeira
europeia. Os referendos perderam toda a importância. O povo tornou-se
impotente. Já não tem ascendência sobre seu destino. A elite tecnocrata no
poder não está nem aí para o voto popular, porque decide o que mais lhe convém.
ÉPOCA – A esquerda está morta?
Debray – Sim, na Europa pelo menos. Lá, a esquerda interfere
apenas nos assuntos marginais da sociedade, como a legalização da maconha ou do
casamento homossexual. Temas com repercussão na mídia, mas de menor profundidade.
A social-democracia foi engolida pelo sistema financeiro. E a extrema-esquerda
é fraca e sem voz. O que não pode morrer é a necessidade de se manter à
esquerda. O homem não pode deixar de sonhar. Não pode sucumbir à dominação do
dinheiro e da força.
>> Vladimir Aras: “Hoje você não esconde mais dinheiro
na Suíça”
ÉPOCA – Qual é a oposição mais forte aos partidos
conservadores?
Debray – Na falta da esquerda, o sistema capitalista só
enfrenta uma oposição forte, medieval e teocrática: o islamismo. Infelizmente.
Hoje, os jovens europeus não partem mais para a Bolívia, eles partem para a
Síria e o Iraque. A única contestação séria ao domínio do capitalismo americano
vem de Bin Laden e do Estado Islâmico.
ÉPOCA – Vivemos a era do pós-capitalismo, com autocrítica e a
participação das redes sociais?
Debray – Não. Vivemos um capitalismo degenerado, que idolatra
o sistema financeiro e não busca produzir o bem-estar interior ou coletivo,
mas sim o lucro e a mais-valia. Um mundo submisso à lei da rentabilidade do
dinheiro. É perverso. A política sucumbiu à economia, que não é uma ciência,
mas uma técnica, falha como tantas. Na França, os jovens brilhantes não entram
mais na política, vão para as finanças, para os bancos e o mercado. A carreira
política é hoje para os imbecis. Ou para quem quer saciar uma vaidade, o desejo
de ser amado. É mais um arrivismo social que uma ambição política de verdade.
Não é um sentimento nobre.
>> John Gray: “Querer a paz perpétua leva a grandes
matanças”
ÉPOCA – Há quem diga que o senhor passou de revolucionário a
reacionário.
Debray – Fui revolucionário há 50 anos, em outro cenário.
Quando se está num país onde não há partidos políticos nem sindicatos, onde se
tortura e o regime é ditatorial, entende-se que você abrace a luta armada e
caia na clandestinidade. Depois disso, eu voltei à França, um país com
partidos, sindicatos, leis. E vivi. Minha opinião de meio século atrás ganhou
nuances e exigências. Eu me tornei um reformista radical na França. Continuo um
anti-imperialista e um patriota, que não quer ver ninguém de fora se metendo
nas leis de seu país. Não um nacionalista, que se acha superior aos outros.
"A política sucumbiu à economia. A carreira política é
hoje para os imbecis"
ÉPOCA – Há espaço na América Latina para revolucionários no
estilo do Che?
Debray – Você se refere a alguém que faça do messianismo uma
questão secular? Acho que sim, mas não
sob a forma de uma guerrilha rural, algo hoje tecnologicamente obsoleto. Todos
têm celulares no bolso. Na América Latina, é verdade que encontramos um certo
frescor ou radicalismo e isso fica claro nas manifestações de rua.
ÉPOCA – A que se deve o poder das igrejas evangélicas em
países como o Brasil?
Debray – Quando os valores de nação deixam de existir, os
homens buscam outra fé. Na falta de poder cívico, saem em busca de valores
seguros, sempre os mais tradicionais. Houve um tempo em que a política era uma
religião. Podia exigir sacrifícios e condenar sacrilégios. Quando existe uma
dessacralização de poderes políticos, chega-se a uma politização dos valores
sagrados. É um fenômeno que testemunhamos em todo o mundo. A Rússia se torna
ortodoxa, dessacraliza Lênin e sacraliza São Sérgio (São Sérgio de Rádonezh, um
dos santos mais venerados pelos russos ortodoxos). Os arcaísmos religiosos hoje
liquidam os progressistas.
ÉPOCA – Como vê o papa Francisco?
Debray – O papa Francisco é uma boa surpresa. É digno de
todos os elogios. Ele compreendeu que a força da Igreja Católica não são os
ricos, mas os pobres. E por isso volta à fonte, às origens. Nós felicitamos a
América Latina por nos ter dado um papa revoltado. Também é preciso felicitar o
papa por enfrentar o mundo protestante. O Ocidente estava sucumbindo à
hegemonia protestante, o catolicismo estava em queda. Além de restituir a
autonomia da Igreja Católica, o papa reinterpreta a Teologia da Libertação – de
maneira mais moderna e globalizada, e sobretudo menos irritante (risos).
EPOCA - A migração de massas de refugiados parece colocar os
governos na Europa diante de um dilema sem solução.
Debray - É nosso problema mais grave e será o maior fenômeno
do século 21. Não migram porque a grama do vizinho é mais verde. Não há grama
nesses países do Sul. Essas populações estão a seco. A esquerda está diante de
uma grande contradição. As camadas mais pobres são as mais alérgicas à entrada
de imigrantes porque arruinam suas chances de emprego e mudam seu modo de vida.
Os ricos não se importam tanto. Os imigrantes não se instalarão na Place de la
Concorde (risos). Eles irão para as banlieues (os subúrbios carentes, a
periferia). É um paradoxo louco: o eleitorado da esquerda tradicional é hoje
formado por privilegiados e o eleitorado da extrema-direita é formado pelo
povo. O eleitor comunista do passado vota em Marine Le Pen (do partido Frente
Nacional). O mundo sem fronteiras é um pesadelo, não um sonho.
Revista Época.