JOSEPH
GOEBELLS, O MINISTRO DA PROPAGANDA NAZISTA.
Tem muita
coisa e muita gente parecidas com ele no Brasil de hoje!
Enfiar na cabeça dura das massas a devoção a Hitler, como o
deus da nova Alemanha, tornou-se o meu objetivo único", escreveu Goebbels
- o novo Chefe da Propaganda - que manobrou magistralmente os recursos da
psicologia individual e de massa para atingir sua meta.
1. O MINISTRO DA PROPAGANDA
Quando se pesquisa sobre os seguidores de Hitler, um fato
logo se torna evidente: por maior que fosse a autoridade que exerciam, eles
permaneciam muito mais que apenas subservientes a Hitler. O fenômeno não se
devia, ao que parece, à personalidade dominadora de Hitler, nem mesmo à sua
posição na hierarquia nazista, mas à indiscutível superioridade que levava
sobre os demais no domínio da técnica da ditadura implacável. Ele possuía uma
habilidade tática e estratégica bem mais desenvolvida que a de Goering, a
despeito da alardeada formação militar deste. A percepção dos problemas da
diplomacia estrangeira que freqüentemente revelava, era superior à do palhaço
Ribbentrop e muito maior que a de Himmler era a capacidade que tinha de
perceber a distância a mais leve intriga, apesar da sinistra reputação criada
pelo Reichsführer-SS.
Também na questão da propaganda e na influência da opinião
das massas, era Hitler quem delineava os princípios básicos; o Dr. Joseph
Goebbels é que os punha em prática. Contudo, deve-se dizer que Goebbels colocou
no desenvolvimento e na aplicação da propaganda espalhafatosa e inescrupulosa
uma diligência, uma percepção e uma imaginação que chegavam às raias do gênio.
"A propaganda, para ser eficaz...", disse Hitler, "tem de se limitar
a uns poucos elementos essenciais... expressada tanto quanto possível em
fórmulas estereotipadas... repetidas persistentemente" - e a partir de
meados dos anos 30 até os últimos dias do Terceiro Reich, o eco estridente de
Deutschland erwache, Ein Volk, ein Reich, ein Führer, Sieg Heil, Heil Hitler e,
já próximo do fim, Sieg oder Bolschewismus Chaos! varria permanentemente a
Alemanha. Nenhuma ambigüidade ou sutileza de significado jamais toldou a
simplicidade cristalina das mensagens de Goebbels às massas.
Contudo, talvez na montagem dos gigantescos circos dos
comícios partidários Goebbels tenha contribuído com algum elemento
particularmente seu, pois, embora Hitler tivesse todas as qualificações para
ser o ator principal, ele, que se saiba, não deixou provas de qualquer aptidão
para direção de cena. Era ali que Goebbels brilhava, e o efeito inspirador ou
aterrador (dependendo da atitude da pessoa para com o Nacional-Socialismo) das
Reuniões Partidárias devia muito ao talento do pequeno Ministro do Esclarecimento
e Propaganda. O diretor de teatro que tão insolentemente o ignorou, quando, na
juventude, Goebbels postulou um cargo no setor de produção de espetáculos,
possivelmente não era tão perspicaz quanto julgava que fosse.
Goebbels também possuía considerável talento histriônico, por
isso que conduzia sempre a um enigma qualquer paralelo que se pretendesse
traçar entre Goebbels e Hitler.
Quem ouviu, se lembra claramente de ter ouvido ambas as vozes
numa época em que o poderio da Alemanha nazista parecia invencível. A voz de
Hitler repercutia pelo mundo, triunfante, brutal, dominadora, assustadora
mesmo, talvez por isso tão absorvente, na sua qualidade e nos desafios que a
todo instante lançava.
A de Goebbels, controlada, primorosamente ensaiada,
profundamente comovente. Ainda se pode ouvir aqueles belos tons na noite de
Natal de 1941 "... Unseres schönes Reich, so Weiss, so Weiss, so Weiss und
wunderschone..."
Ele podia
fazer chorar.
Hitler
fazia tremer.
2. O JOVEM
Paul Joseph Goebbels era intelectualmente o mais interessante dos líderes nazistas. A capacidade instintiva de Hitler como estrategista militar ocultava um cérebro de terceira categoria; a indubitável inteligência de Goering foi corrompida pelo sibaritismo e pela presunção; Himmler era um fanático de espírito tacanho. Mas Goebbels usava o intelecto de maneira criativa. Ele transformou Hitler, homem de caráter irresoluto, no Messias de vontade férrea do Terceiro Reich - ou melhor, ele criou em der Führer a ilusão de força messiânica. E o fez apenas pela fraude verbal. Na atividade política, para cujo exercício a duplicidade é considerada função essencial, ele alcançou um padrão de duplo sentido sem paralelo pa história moderna. Virtuose da mentira, ele dominava de maneira tão completa a arte de engodar, que provar que preto era branco não chegava a ser para ele façanha muito grande, uma vez que podia provar que era a cor que escolhesse no momento.
O
desenvolvimento do seu intelecto foi em grande parte feito por motivo dos
defeitos físicos de que era portador. Quando criança, foi incapacitado pela
poliomielite e, mais tarde, pela osteomielite. Além disso, sua constituição era
frágil e sua estatura, diminuta. As crianças não são em geral muito dadas à
compaixão, por isso, embora nos seus primeiros tempos de escola raramente fosse
vítima de crueldade física, muitas vezes foi ele insultado pela fragilidade e
deficiência que naturalmente o impediam de participar em atividades que exigiam
velocidade ou agilidade. Por conseguinte, ele se esforçou por brilhar no campo
do aprendizado, uma vez que no da façanha física estava condenado ao fracasso.
E brilhou - para grande alegria dos seus pais.
Friedrich
Goebbels, seu pai, era empregado de uma pequena fábrica têxtil, a W.H.
Lennartz, situada na cidade de Rheydt, perto de Düsseldorf. Em 1929, Rheydt foi
reunida com Waldhausen, Odenkirchen e München-Gladbach, chamadas coletivamente
die Textil. W.H. Lennartz se especializava no tratamento químico do tecido de
algodão usado na confecção de camisas de lampião e Friedrich Goebbels começou a
trabalhar ali como mensageiro, chegando a amanuense.
Ele era um
homem solene, orgulhoso por haver subido, pelos próprios esforços, da classe
operária (seu pai, Konrad Goebbels, fora carpinteiro) a membro do escritório
executivo da firma; também era ardoroso católico apostólico romano.
A mãe de
Goebbels, holandesa de nascimento, chamava-se em solteira Katherina Odenhausen.
Era filha de um ferreiro que emigrara da Alemanha para a Holanda e se casara
com uma holandesa, Joanna Coervers. Katherina, também católica, nasceu em
Uebach, Holanda, em 1869.
Os pais de
Goebbels tiveram cinco filhos: Elizabeth, Maria, Konrad, Hans e Joseph, cujo
primeiro nome, Paul, parece nunca foi usado. Elizabeth morreu quando Joseph
tinha 18 anos. A outra filha, Maria, era 12 anos mais moça que ele. Joseph
nasceu a 27 de outubro de 1897, numa casa na Odenkirchener Strasse. Em 1899 a
família mudou-se para a casa de n° 156 da Dahlener Strasse, em Rheydt, onde
Joseph passou o resto da infância e grande parte da juventude.
Seus problemas de ordem física eram bastante compensados por
uma certa beleza. Cabelos pretos, bastos, olhos castanhos bem colocados, bons
dentes e mãos bem moldadas. Desde criança, Goebbels cuidava muito da aparência,
exibindo os elementos do exagerado apuro no trajar que, nos seus dias de poder,
resultaria num guarda-roupa de mais de 300 trajes; os que zombavam dele corriam
o risco de receber de volta, como retruca, o insulto de desleixado e de porco.
Fritz Prang, seu amigo mais íntimo na escola, mais tarde escreveu que,
"durante esses rompantes, a gente se sentia como que fulminada pela
ferocidade da linguagem por ele utilizada contra a pessoa que se apresentasse
com um colarinho sujo ou com a roupa faltando botões".
Dada a circunstância de ter que se isolar fisicamente, ele
era inclinado a meditar, mas construtivamente. Com ele, a introspecção não
significava autocomiseração. Seus pais, no clima de devoção em que viviam,
acreditavam que ele estava juntando forças do espírito de Deus que brilhava
dentro dele. Não era, entretanto, a força do espírito de Deus que ele retirava
da leitura que fazia com avidez, leitura que mais o encorajava ao ceticismo que
à crença na religião cristã. Mas tarde, ele viria a referir-se à missa como
sendo "a asneira mais tendenciosa jamais imposta à inteligência humana,
mas poderosamente útil para provar a capacidade do homem em absorver
absurdos". Contudo, ele considerava vantajoso conformar-se, ansioso como
estava por não deixar passar a possibilidade de obter a ajuda dos que pudessem
fazê-lo progredir em sua carreira. Naturalmente, ele tomou o cuidado de ocultar
o cinismo com que encarava a questão da espiritualidade e de muitas maneiras
expressava as reações dúplices de suas atitudes, como, por exemplo, no prazer
que sentia em imputar falsas informações que resultassem em castigo para os
colegas de escola que zombavam da sua debilidade - o que lhe valeu o apelido de
Ulex (Ulisses), pela sua astúcia. Ele orgulhosamente se enfeitou com o cognome
durante toda a juventude, mas cuidou de observar que Ulisses era famoso pela
coragem, mas também pela astúcia; isto seria igualmente verdadeiro quanto a
Joseph Goebbels.
A sua educação, que seus pais pagaram a duras penas,
iniciou-se no Rheydt Gymnasium. Tem-se afirmado, incorretamente, que Goebbels
se ressentia amargamente da ironia de ser obrigado à violência do atletismo por
pais decididos a fazer com que sua incapacidade física fosse superada, mas isto
não é verdade. Se os pais enfrentaram dificuldades para educá-lo, os resultados
foram extremamente compensadores. O filho era um aluno exemplar. Em latim,
grego; línguas modernas, história, matemática, política, economia e nas
Escrituras, ele estava sempre em primeiro lugar. Isto fê-lo perder
popularidade, mas Goebbels pai muitas vezes o congratulava por "manter-se
firme contra a inveja dos inferiores". O que seu pai não percebia é que
ele se mantinha firme principalmente com as armas do sarcasmo e da arrogância.
A futura, carreira de Joseph era um grande problema. Quando
tinha 17 anos e a Primeira Guerra Mundial estourou, ele se apresentou como
voluntário para o exército e, naturalmente, foi rejeitado por causa dos
defeitos físicos. Dificilmente poderia esperar ser aceito. (Desapontado ou não,
o fato é que ele tirou excelente partido da sua coxeadura, informando os
curiosos complacentes de que fora uma das primeiras baixas na guerra.)
A rejeição deu-lhe a vantagem de poder continuar os estudos,
coisa que os pais consideraram caída dos céus para pô-lo no caminho do
sacerdócio, onde, acreditavam, Goebbels, com seu gosto pelo estudo, encontraria
o seu verdadeiro destino. Fritz Prang diz que, independente de crença, Goebbels
estava perfeitamente disposto a "seguir o caminho religioso, porquanto
dificilmente deixaria de alcançar o bispado, no mínimo". Sua ambição -
mais por um lugar em alguma hierarquia do que pelo poder em si - era, como diz
Prang, "quase incandescente quando ele estava na Ober-Prima (Sexta Série)
da escola". Sem querer duvidar da capacidade de Goebbels, é muito pouco
provável que obtivesse ingresso em qualquer seminário. A incandescência da sua
ambição não teria sido mais útil do que uma das camisas de lampião de Lennartz.
O que os mentores da Igreja procuravam era incandescência de crença.
Influenciados pela fé que tinham e pela inteligência do
filho, Friedrich e Katherina Goebbels fizeram muito sacrifício para que ele
conseguisse um diploma. Também eles tinham sua ambição: que seu brilhante filho
se tornasse Herr Doktor Joseph Goebbels. Ele se matriculou na Universidade de
Bonn em 1917, tendo obtido as notas mais altas já registradas no Rheydt
Gymnasium, no Maturitätsexamen. Embora dispostos ao maior sacrifício, os pais
de Joseph não conseguiram reunir o suficiente para cobrir as despesas exigidas
pela freqüência à universidade, e por volta de agosto de 1917 já era evidente
que ele não poderia continuar seus estudos. A quem recorreria? Ele conseguia
alguns marcos como professor particular, que eram apenas suficientes para pagar
uma refeição modesta em certos dias. Precisava, a qualquer preço, buscar uma
ajuda caridosa. O Padre Johannes Mollen, o sacerdote de Rheydt, que se
encarregava da instrução religiosa dos filhos dos Goebbels, dirigiu um pedido à
Sociedade Albertus Magnus, uma rica fundação que dá ou empresta dinheiro a,
entre outras pessoas, estudantes pobres que se preparam para o sacerdócio.
Caracteristicamente cínico, Joseph Goebbels ocultou a enorme descrença
religiosa que mais tarde alardearia tão orgulhosamente como parte do conceito
nazista e, com ironia, escreveu para a sociedade em tons formais e humildes:
"Peço humildemente permissão para apelar para a Comissão
Diocesana da Sociedade com o objetivo de obter apoio financeiro para o semestre
de inverno de 1917-1918. Na Páscoa, matriculei-me no Rheydt Gymnasium (cujo
relatório de exame estou anexando), onde estudei Filologia e História, pagando
meus estudos com poupanças que consegui fazer dando aulas particulares e com a
ajuda de meu pai, que trabalha como amanuense e cuja renda de 4.000 marcos
anuais [cerca de 400 libras pelos valores de 1917] é aplicada no sustento de
meus dois irmãos, um dos quais está na Frente Ocidental, o outro é prisioneiro
de guerra, e minha mãe e minha irmã mais moça. Devido à minha perna defeituosa,
fui rejeitado para o serviço militar e gostaria imensamente de prosseguir meus
estudos universitários no próximo período letivo. Mas isto depende inteiramente
da caridade dos seus companheiros de crença católica. Peço humildemente que
examinem este pedido e me informem o mais breve possível da decisão que
tomarem. Estou certo de que meu ex-professor de religião, Padre Johannes
Mollen, confirmará a correção de todas as minhas declarações. Com respeito e
devoção, cordialmente, Joseph Goebbels."
Ele anexou o resultado do exame e um testemunho do Padre
Mollen, que dizia: "Herr Goebbels descende de uma fiel família católica da
minha paróquia e o recomendo pela sua atitude religiosa e pela sua alta posição
moral".
A sociedade dificilmente poderia contestar a palavra do padre
- embora não fosse notavelmente entusiástica - mas há uma insinuação no livro
de minutas de que a comissão tinha suas dúvidas quanto à sinceridade de crença
de Goebbels: "Depois de demorada discussão", concordou-se, embora não
por unanimidade, em conceder-lhe um empréstimo de 185 marcos e considerar
outros pedidos se houvesse necessidade. O empréstimo, ou empréstimos não teriam
juros. Quatro marcos eram então trocados por um dólar, de modo que se pode ver
que, mesmo em termos dos valores de 1917, o empréstimo não foi muito grande.
Mas com os 50 marcos que seu pai lhe mandava mensalmente, ele pôde completar
seu período letivo em Bonn.
A partir deste ponto, os safaris educacionais do jovem
Goebbels assumem uma complexidade estonteante. De Bonn ele foi para Freiburg e,
depois, para Heidelberg. O inverno de 1918 encontrou-o em Würzburg, e o
semestre seguinte em Colônia. Em 1919 ele esteve matriculado em Frankfurt e
Berlim, enquanto que, em 1920 e 1921, passou mais dois semestres em Heidelberg
e, entre eles, um em Munique. As razões para esse verdadeiro nomadismo não são
de todo claras. É certo que ele não foi suspenso ou excluído de qualquer das
oito universidades que cursou. Ao contrário, os professores que se manifestaram
a respeito de Joseph, por carta ou boletins escolares, são unânimes em
reconhecer nele qualidades de inteligência, de aplicação e de comportamento.
Talvez o que explique o inquieto procedimento de Goebbels, esse desejo de
aparecer entre os diplomados de tantas alma maters, seja a ânsia de ampliar seu
aprendizado em muitas direções - na verdade é comum os estudantes alemães
estudarem em duas ou três universidades, devido à especialização dos
currículos: literatura ein Heidelberg, teologia em Bonn, filosofia em Colônia
etc. Mas oito parece ser um número bastante exagerado. Talvez a escolha da
universidade tenha sido, até certo ponto, ditada pela disponibilidade de
acomodações que ele pudesse pagar.
As estalagens das cidades universitárias alemães eram
notoriamente gananciosas (a cupidez dessa gente foi retratada pela pena acre do
artista George Grosz) e as cartas do estudante Goebbels que ainda existem
partiram de endereços pobres. Igualmente provável é que a inquietação natural
da juventude e a agitação política para a qual se dirigia a Alemanha do
pós-guerra ditassem os freqüentes vôos do universitário.
Em todo caso, ele obteve em Heidelberg, em 1921; o grau de
Doutor em Filosofia. Seus professores foram Friedrich Gundolf e Anton von
Waldberg (ambos judeus) e sua tese de doutorado foi uma trabalhosa dissertação
sobre a obra de um dramaturgo menor alemão do século XIX, Wilhelm von Schütz.
Ela foi solenemente intitulada Uma Contribuição pura a História do Drama
Romântico; mas na década seguinte, depois de nomeado Ministro da Propaganda,
ele mudou apressadamente o título para As Correntes Espirituais e Poéticas dos
Primeiros Românticos, para que os registros mostrassem suas tendências
políticas precoces.
Na verdade, naquele período da vida, ele considerava a
política algo confuso - o que não é de surpreender, em vista da agitação que
abalava a Alemanha sob a República de Weimar. Um dos seus biógrafos, Curt
Riess, observa que "Estudantes reacionários e esquerdistas se insultavam e
se denunciavam como traidores e lunáticos. Sempre que os examinava atentamente,
Goebbels descobria neles um bando de jovens instáveis e desorientados. Para a
sua mente analítica e dissectora, o que diziam não passava de frases sem
sentido; suas promessas, de simulações ocas. Sentia a inexistência de um ponto
onde firmar-se: havia um vácuo. Desejava que algo o inspirasse, queria ser como
os outros; "queria crer".
Em tudo isso, naturalmente, Goebbels não mostrava nada de
extraordinário: a busca de si mesmo, de um arrimo, é tão universal quanto a
própria juventude. Uma carta de seu pai, escrita quando Goebbels estava em
Munique, aconselha-o a buscar na oração o remédio para as dúvidas que
alimentava sobre as coisas da religião, acrescentando: "Mas, se tuas
dúvidas são de natureza diferente, ainda assim só te posso aconselhar uma
coisa: orar e continuar orando, e eu também orarei para que Nosso Senhor te
ajude, para que tudo saia bem".
O grande problema de Goebbels era, entretanto, o complexo de
inferioridade. "Sou um apóstata", escreveu ele, em seu diário, em
1921. Em seguida, reescreveu a frase em letras maiúsculas, como se regozijasse
diante da descoberta, imaginando, quem sabe, que dessa maneira se desprendia da
multidão vulgar. Mas a apostasia não afrouxava o tormento que lhe impunha o
complexo de inferioridade. Acima de tudo, ele sentia a necessidade de uma linha
de ação positiva.
Quem lhe mostrou essa linha foi Richard Flisges, um estudante
cheio de amargura, ex-soldado, com muitas condecorações por bravura e pouca
inteligência. A amargura fizera-o voltar-se para o comunismo, que, como muitos
outros descontentes, considerava a solução para os problemas do mundo. Era um
homem robusto e desleixado, que podia erguer - e às vezes erguia - Goebbels
pelo colarinho e o sacudir, mas por quem Goebbels tinha uma afeição paradoxal
que, naturalmente, ocultava debaixo das críticas que freqüentemente fazia à
aparência desmazelada de Flisges.
A orientação foi através de Marx, Engels e Walther Rathenau.
Mas, longe de conduzi-lo para a crença ardente nas teorias do comunismo, as
discussões violentas que sustentava com Flisges e outros colegas sobre a
filosofia vermelha o conduziram para o lado oposto.
No começo dos anos 20, Munique, a capital da Baviera, era o
grande centro de agitação comunista e para lá se voltou Goebbels, à procura de
trabalho: ("Tenho de encontrar um modo de começar a vida", escreveu
ele em seu diário), no verão de 1922. O aspecto urbanístico da velha cidade o
havia agradado muito durante o período em que lá esteve estudando, no ano
anterior. Ele morara em Schwabing, cuja atmosfera lembrava muito a da Rive
Gauche, e a irradiação das ruas da Marien-Platz era para ele "uma
representação simbólica da diversidade de vida, pois cada rua oferece
diferentes possibilidades".
Em 1922 Munique já havia passado por três grandes agitações
políticas do pós-guerra. A República Socialista de 18 de novembro, o
contra-movimento Nacional-Socialista de janeiro de 1919 e a República Soviética
de abril de 1919 haviam começado ali. O partido nazista havia-se instalado na
Braunes Haus e, já com cerca de 50.000 adeptos inscritos, continuava atraindo
adesões, sobretudo dos mercenários livres, que viam na guerra contínua a
salvação da Alemanha. Ali, com iguais objetivos revolucionários, estavam o
Freikorps e a Reichswehr, organizações paramilitares clandestinas carregadas de
ameaça, e nas tavernas, Adolf Hitler, na época Oficial de Propaganda do partido
nazista. Ali também, algumas semanas antes da chegada de Goebbels, Walther
Rathenau, Ministro do Exterior e arquiteto do Tratado de Rapallo, projetado
para estreitar as relações russo-germânicas, fora assassinado por ex-oficiais
da marinha pertencentes à organização terrorista nacionalista. Munique podia ser
esteticamente bela e agradável, mas dificilmente se poderia considerá-la
tranqüila.
Típico da Alemanha do pós-guerra, a licenciosidade campeava
na cidade, embora menos que em Berlim e Hamburgo, onde a depravação raiava pelo
absurdo. Havia em Munique uma variedade de boates, bordéis, cabarés de
travestis, cassinos e de lugares onde se exibiam filmes pornográficos, e nessa
atmosfera de lascívia Goebbels derramava em abundância os gozos da juventude.
"Ele se mostrou sempre muito atrevido e
convencido", lembra Fritz Prang, "durante todo o transcurso da vida
universitária. As garotas deixavam-se cativar facilmente por ele. Acho que a
sua fragilidade e o seu pé aleijado faziam com que elas se sentissem maternais
e protetoras, e ai é que começava tudo. Goebbels não demorava a conquistá-las -
fazendo-se muito encantador e colocando na voz bastante mel.
"Ele teve alguns casos amorosos sérios e duradouros. Um
deles foi com uma jovem chamada Anka Stahlhern, que durou três ou quatro anos,
até que ela o trocou por um homem mais velho, que tinha mais dinheiro. Bem, ele
dificilmente poderia ter menos do que tinha, e fez uma grande cena de
humilhação torturada. O caso fora muito sério, com longas cartas de amor
trocadas entre eles; mas os pais de Anka não olhavam o romance com bons olhos,
pois não viam qualquer futuro para Goebbels - as perspectivas não se mostravam,
em seus dias de estudante, muito boas para ele. Mais tarde, à sua maneira
mordaz, costumava Goebbels dizer que se ela tivesse sido menos mercenária,
teria casado com o Ministro da Propaganda. Mas não a culpou totalmente por
havê-lo abandonado. Tendo fracassado o seu casamento, Anka, desempregada,
recorreu, em 1934, a Goebbels, para que a ajudasse, e ele a colocou na equipe
de uma revista feminina.
"Depois que Anka terminou com ele, Goebbels arranjou
outra garota. Chamava. se Else Taub, era professora e sua família tinha muita
influência nos círculos comerciais. Também dessa vez ele foi terrivelmente
ardente - poemas de amor, passeios idílicos pelos bosques, reclamações pelo
fato de a sociedade ser desorganizada demais para poder incluí-lo em seus
planos. Era tudo coisa de estudante! Flisges, eu, Goebbels e Else costumávamos
passar horas nos cafés, ou em nossas próprias casas quando não tínhamos
dinheiro para pagar um café (normalmente quem pagava era Else).
"Naturalmente, o que precisávamos mesmo era de trabalho
para ocupar o tempo, mas não era fácil consegui-lo naqueles tempos conturbados.
Goebbels decidira tornar-se literato e não parava de escrever artigos e
enviá-los para os jornais e revistas. Todos eram recusados. Escreveu uma novela
e uma peça de teatro que também não deram em nada. O dinheiro que ganhava vinha
de empregos casuais, como professor ou em escritório. Eu mesmo consegui um para
ele na Bolsa de Valores de Colônia, e os Taubs o colocaram no Banco Dresdener;
mas esses dois empregos não duraram muito. Como se diz hoje, ele estava sempre
fazendo das suas - livre, namorando, metido sempre na mesma roupa surrada,
vivendo em casa, em Rheydt, quando sem recursos, ou arrumando-se comigo ou com
Else, ou outros amigos, quando podia. Para um homem que seria designado
sucessor de Hitler, este tipo de formação era de fato muito problemático".
3. A TAREFA
As primeiras manifestações literárias e oratórias do homem
que viria a influenciar toda a nação alemã pela palavra não foram nada
espetaculares. Tendo recebido a oportunidade de ser o orador da turma, na sua
formatura, no Ginásio de Rheydt, o Padre Mollen lhe disse com um sarcasmo nada
caridoso que, como orador, ele sem dúvida seria um bom pasteleiro. Ele enviou
várias centenas de artigos para os jornais e revistas - principalmente o
Berliner Tageblatt - e todos foram recusados, com a justificativa de que as
idéias neles contidas, além de mal formadas, eram apresentadas incoerentemente.
Sua pretensa novela, chamada Michael e escrita em tiras de pretensiosos versos
livres, com pontos de exclamação e letras maiúsculas, foi, também com justiça,
recusada por todos os editores que a leram, até que, em 1929, um editor
pró-nazista achou ser de boa política aceitá-la. Duas peças teatrais em versos,
O Peregrino e O Hóspede Solitário, permaneceram inéditas. Depois que os
nazistas subiram ao poder, a primeira delas foi encenada por três noites, sendo
recebida impassivelmente pela platéia.
Caracteristicamente, Goebbels reagiu com arrogante
superioridade à manifestação de indiferença. "Sei que minha obra
encontrará seu lugar", escreveu ele em seu diário. "É só questão de tempo."
O tempo chegou em 1923. Em janeiro daquele ano, o
Primeiro-Ministro da França, Raymond Poincaré, ordenou a ocupação do Ruhr como
medida punitiva contra a Alemanha, por não cumprir as condições impostas pelo
Tratado de Versalhes. Como conseqüência, naquela vasta área industrial houve de
início certa resistência passiva, na forma de greves, seguindo-se as
sabotagens, a guerra clandestina e ferozes lutas de rua, provocadas pelas
facções, desorganizadas, mas violentas, dos Freikorps, dos anti-republicanos e
dos ainda embrionários nacional-socialistas.
Em seu diário, Goebbels diz que "de repente sentiu-se
inflamado pelas injustiças de Weimar e de Versalhes. Ouvi dizer que Krupp, o
grande industrial, estava apoiando elementos guerrilheiros e peguei o dinheiro
que meus pais puderam dar-me e parti para Essen. Procurei Albert Schlageter, o
líder dos sabotadores, e ofereci-lhe meus préstimos para qualquer serviço. Ele
me recusou, porque meu pé faria que me descobrissem facilmente, o que seria um
desastre para eles. Mas ele me disse que havia trabalho muito importante que eu
podia fazer: funcionar como agitador e propagandista".
Havia, deveras, causas suficientes para se agitar e fazer
propaganda. Na época, a Alemanha estava fervilhante delas e a de Albert Schlageter
parece ter sido uma das numerosas causas anônimas, apenas uma erupção provocada
pela injustiça da ocupação do Ruhr. Todas as erupções desse tipo pecavam pela
falta de orientação e, portanto, eram ineficientes. A destruição de algumas
pontes ferroviárias ou o seqüestro de um ou dois caminhões carregados de
munições eram pouco eficazes contra as tropas francesas e belgas firmemente
instaladas e contra a ameaça dos aliados de cortar o envio de alimentos para a
Alemanha, se não se restaurasse a ordem. Nessas circunstâncias, os distúrbios
não demoraram a ser suprimidos e as greves, canceladas. Mas, embora as ações
possam falar mais alto que as palavras, estas é que têm de vir primeiro.
Tendo-se "inflamado com a injustiça", Goebbels
passou a reexaminar as obras de Marx, Engels e Rathenau, apenas para reagir
ainda mais violentamente do que antes contra elas. Nessa reação ele foi ajudado
por Fritz Prang que, apesar da oposição dos seus pais, ouvira Hitler falar em
Munique e dera cópias de panfletos nazistas a Goebbels. Embora ainda estivesse
mal formada, na época, a política nazista de nacionalismo intenso
"provocou e realimentou minhas chamas de angústia", escreve Goebbels.
Prang comenta secamente que era evidente que a literatura nazista "o
excitou politicamente"; ele sempre estava assim sexualmente.
Seu fascínio pela doutrina nazista foi acentuado pelas
numerosas reuniões políticas a que Goebbels compareceu - normalmente
acompanhado de Prang e várias amigas - durante o ano de 1923. É possível, não
posso afiançar, que Hitler fosse o orador em algumas delas. Em um dos seus
trechos mais pomposos (este provavelmente foi acrescentado mais tarde à muito
autobiográfica novela Michael, tal como mudara o título da sua tese de
doutorado para convencer a posteridade das suas primeiras tendências
políticas), ele escreve sobre um grande (mas anônimo) orador:
"Naquela noite sentei-me numa grande sala, com mil
outras pessoas, para vê-lo novamente, para tornar a ouvir aquele que me
despertara.
"Ali está ele, em meio à sua leal congregação. Parece
ter aumentado de estatura. Há muita força nele e um mar de luz brilha naqueles
grandes olhos azuis.
"Sento-me com os outros e parece que ele se dirige
apenas a mim.
"Sobre a bênção do trabalho! Tudo o que eu simplesmente
sentia ou adivinhava, ele punha em palavras. Minha confissão e minha Fé: ali
elas tomaram forma.
"Sinto sua força encher-me a alma. Aqui está a jovem
Alemanha e aqui estão os que trabalham na forja no novo Reich. A bigorna ainda
está silenciosa, mas o martelo não tardará a bater.
"Aqui é meu lugar.
"Ao meu redor estão pessoas que nunca vi antes e
sinto-me criança, enquanto lágrimas me afloram sos olhos."
No mesmo espírito melodramático, ele declara mais tarde:
"Sei agora para onde meu caminho me leva. O caminho da
maturidade. Pareço estar embriagado.
"Lembro-me da mão do homem apertando a minha. Um voto
para toda a vida. "E meus olhos encontram duas grandes estrelas
azuis."
Tudo isto para nos dizer, pelo narrador autobiográfico de
Michael, que ele fora fascinado por Hitler já em 1923. Ele pôde apresentar
provas adicionais, na forma de uma Carteira de Membro do Partido com o baixo
número de 8762.
Mas quando chegou o momento de provar sua fidelidade precoce
ao Partido, Goebbels já se encontrava em condições de poder alterar datas e
números nos arquivos tão assiduamente compilados por Heinrich Himmler, em seu
papel de guarda zeloso do Führer, e não há dúvidas de que assim fez. Ele
compareceu a muitas reuniões políticas de muitos partidos, mas sua filiação ao
bloco nazista não é tão antiga como pretendeu fazer-nos crer; não participou do
fracassado putsch de Munique, de 9 de novembro de 1923, que resultou na prisão
de Hitler por sedição, e certamente não conheceu Hitler pessoalmente antes de
1925.
Uma carta que ele afirmou ter enviado ao Führer na prisão de Landsberg,
em 1924, na realidade foi escrita muito mais tarde e antedatada para ser usada
como prova da sua antiga filiação ao partido. Ele tinha de iludir-se antes que
pudesse começar a iludir outros.
Mesmo assim, é uma carta interessante,
oferecendo, como observa Curt Riess, prova do "entusiasmo do
propagandista-amador pelo mestre da propaganda":
"Como uma estrela que nasce, apareceste aos nossos olhos
espantados, realizaste milagres para abrir nossa mente, num mundo de ceticismo
e desespero, deste-nos fé. Ergueste a ti mesmo acima das massas, cheio de fé e
certeza no futuro, e possuído da vontade de libertar aquelas massas com teu
ilimitado amor por todos os que acreditam no novo Reich. Pela primeira vez
vimos com olhos brilhantes um homem que arrancou a máscara das faces
destorcidas pela ganância, das faces dos medíocres e intrometidos
parlamentares. Vimos um homem que nos mostrou o quanto o sistema é vergonhosamente
corrupto e baixo...
"No tribunal de Munique [onde Hitler fora julgado]
atingiste aos nossos olhos a grandeza de um Führer. O que disseste são as
maiores palavras pronunciadas na Alemanha desde Bismarck. Expressaste mais que
tua própria dor e tua própria luta. Deste nome à necessidade de toda uma
geração, buscando em confuso anelo homens e tarefas. O que disseste é o
Catecismo da nova crença política, nascida do desespero de um mundo ateu em
colapso... Nós te somos gratos. Um dia a Alemanha te agradecerá ... "
A 1o de abril de 1924 - no mesmo dia em que Hitler foi
condenado a cinco anos de prisão - Franz von Wiegershaus, o representante
eleito do Völkische Freiheitspartei no Reichstag, ofereceu trabalho político a
Goebbels. Este partido era integrado por um grupo dissidente da extrema direita
do movimento nacionalista, do qual os nazistas, naturalmente, haviam sido os
mais evidentes através do seu líder Adolf Hitler. Agora, o partido nazista
estava proscrito e Hitler não tinha intenções de vê-lo nem mesmo
subrepticiamente ativo enquanto estivesse preso. Ele, que encontrara
dificuldade em conquistar a sua liderança, o preferia totalmente abandonado, a
vê-lo dirigido por caminhos falsos por Führers rivais. No idealismo de Hitler
só havia lugar para um Führer. Naturalmente, uma coisa é proscrever um
movimento político pela lei; outra, muito diferente, é suprimir suas atividades
de verdade. Em meio ao caos constitucional e econômico que paralisou a nação
durante toda a década, os nacionalistas da fragmentada ala direita continuaram
operando, apesar da sua desunião; no norte da Alemanha, os remanescentes
nazistas foram mantidos mais ou menos coesos por Gregor e Otto Strasser,
abastados homens de negócio que não gostavam de Hitler (que, no devido tempo,
se vingaria de sua vacilante lealdade), mas que se sentiam muito satisfeitos
com a conotação política do movimento, de extrema direita.
O Völkische Freiheitspartei não fora incluído na proscrição.
Era pequeno, dirigido ineficientemente e não representava qualquer ameaça
visível à República de Weimar. Mas Wiegershaus pretendia continuar veiculando
opiniões extremistas através do seu jornal - que não passava de um boletim
noticioso - o Völkische Freiheit. Ele precisava de um secretário e
redator-assistente e ofereceu a Goebbels 100 marcos mensais, se este incluísse
em suas atividades na redação do boletim alguns discursos a serem proferidos
nas reuniões públicas convocadas pelo partido.
O salário era insignificante, mas Goebbels, que atravessava
uma das suas fases de desespero (ele tinha um quê de maníaco-depressivo),
depois que o redator do Berliner Tageblatt se recusara até mesmo a
entrevistá-lo, quando ele solicitou um emprego, e que um diretor de teatro
chegou a rir-lhe na cara, aceitou o convite de Wiegershaus. O diretor de teatro
registrou, sobre o incidente com Goebbels, o seguinte: "Sem nunca ter tido
qualquer experiência teatral, ele pretendia ingressar diretamente no quadro de
produtores". Por essa época, o caso de amor que mantinha com Else Taub
passava por crise muito séria. Assim é que já em meados de abril de 1924
Goebbels estava metido numa série de reuniões políticas realizadas em Eberfeld,
outra cidade têxtil da Renânia do Norte-Westfália.
Ele não demorou a desiludir-se com as platéias que, segundo disse
numa carta que enviou para casa, "eram inacreditavelmente estúpidas e
podiam ser levadas em qualquer direção com os mesmos limitados lemas" e o
faziam sentir-se como "um excelente ator perdido na companhia de um elenco
de décima categoria".
Acontece, porém, que ele não estava perdendo tempo. Certa
feita, Gregor Strasser encontrava-se por acaso na platéia e, no fim da reunião,
cumprimentou Goebbels pela eficiência da oratória. Nada mais aconteceu de
importante até que, no fim do ano, Hitler foi libertado da prisão, depois de
cumprir nove meses da pena de cinco anos que lhe havia sido imposta, e começou
a reorganizar o partido.
Strasser nomeara um homem chamado Karl Kaufmann para cuidar
dos assuntos nazistas no distrito Reno-Ruhr e Kaufmann disse a Strasser que
"um jovem ardente chamado Goebbels, dotado de ótima voz", o procurara
solicitando trabalho político. Strasser imediatamente lembrou-se da reunião em
que viu Goebbels lutar por incutir os princípios do Völkische Freiheit no
cérebro de uma platéia estúpida.
"Tragam-no aqui", disse Strasser. (A conversa está
registrada no livro de Otto Strasser, Die Deutsche Bartholmaensnacht.)
"Ele talvez seja mais eficiente do que o homem que temos no momento
trabalhando no secretariado, Heinrich Himmler. Himmler está pensando em se
dedicar à criação de galinhas, para o que talvez tenha muito mais aptidão. Se
houver problemas em tirar Goebbels de Wiegershaus, ofereça-lhe o dobro do
salário que está recebendo agora. Acho que talvez valha a pena."
Assim, na primavera de 1925, passou Goebbels a funcionário do
partido nazista - oficialmente na ilegalidade, mas de modo algum moribundo.
"Era um emprego que exigia grande vigor", escreveu
ele, mais tarde, em Batalha por Berlim. "O Führer saíra da prisão cheio da
determinação do gênio. Os discípulos reuniram-se em torno dele e lhe ouviram a
palavra."
(A imagem dos discípulos sentados aos pés do Mestre não é
corroborada pelos fatos; mas não está em desacordo com as tentativas feitas por
Goebbels de criar a imagem de um revolucionário semelhante a Cristo. Embora
apóstata, ele sabia por intuição que ainda não chegara o momento da palavra
agnóstica.)
"Os movimentos revolucionários", prosseguiu ele,
"não são feitos pelos grandes escritores, mas pelos grandes oradores. É um
erro acreditar que a palavra escrita é mais eficaz porque a imprensa diária é
lida por grande número de pessoas. Ainda que o orador possa apenas atingir, na
melhor das hipóteses, uns poucos milhares de pessoas, enquanto o escritor
político atinge facilmente de dez a cem mil leitores, a palavra falada tem
muito maior poder de influência e pode ser transmitida cem, milhares de vezes.
E um discurso bem feito é infinitamente mais sugestivo do que um bom
editorial".
O primeiro porta-voz oficial do partido nazista, o
Nationalsozialistische Briefe, apareceu em outubro de 1925. Era dirigido pelos
irmãos Strasser, diferindo bastante do Völkische Freiheit, que era
mimeografado. Fosse qual fosse a opinião de Goebbels sobre a importância da
palavra escrita, o fato é que ele escreveu a maior parte dos artigos saídos nos
primeiros números fazendo a apologia de uma filosofia política de extrema
direita, bem de acordo com a ideologia nazista que Hitler, na prisão de
Landsberg, ditou para Rudolf Hess, na confecção dos originais do Mein Kampf. Se
diferença havia no conteúdo da pregação de Goebbels com o que Hitler
preconizava em seu livro, não era nada que não pudesse ser de imediato a ele
ajustado, e isso se deu assim que se conheceram.
Esse encontro deu-se a 2 de novembro de 1925 e está
registrado no diário particular de Goebbels, cuja parte pertinente está na
biblioteca da Universidade de Stanford, Califórnia. A nota refere a imediata
simpatia de Hitler pelo homem que lhe foi apresentado por Kaufmann como "o
assistente de Gregor Strasser que está fazendo um esplêndido trabalho pelo
partido no Brieje e nas reuniões públicas". "Ele me cumprimentou como
a um velho amigo", escreve Goebbels, "e deu-me uma fotografia sua,
com a inscrição Heil Hitler, que está sobre a minha mesa. É um líder de origem
é formação popular; tem tudo para ser um rei... grandes olhos azuis, como
estrelas... fala incansavelmente durante horas... Adoraria tê-lo como
amigo".
Aqui, transposto para seu momento adequado no tempo, está
claramente o Narrador do Michael, olhos extasiados e tudo o mais. Aqui estão
também o anseio por amizade e a queda para a bajulação, os dois pilares de que
se serviu Goebbels para crescer no conceito de Hitler. O exercício de sua falta
de virtudes morais fazia dele um exibicionista, um ansioso por ser adorado
pelos que o cercavam, causa dos desencontros registrados nas suas relações
amorosas. "Ele estava procurando eternamente a mulher que o amasse e
'compreendesse' ", diz Curt Riess, e qualquer dos trechos do diário de
Goebbels corrobora esta opinião: "Else está aqui, toda em lágrimas e
tristeza. Vamo-nos separar. Ela me implora para que não a deixe. Horas de
profunda angústia... Parece que tem de ser assim: há uma maldição comigo no
tocante às mulheres... Else me escreve um bilhete para acabar tudo. Não podemos
nem mesmo ser amigos, mas eu amo essa pobre e doce criança. Se ela pudesse
retribuir-me o amor que preciso, a sua aclamação pelo que outros têm chamado de
minha brilhante capacidade".
Essa "brilhante capacidade" (como orador) era
certamente um dom de Goebbels. Mas ele não podia resistir à tentação de
exagerar o entusiasmo da sua platéia. As reuniões políticas, cuja assistência,
segundo nos garantem Prang e outras testemunhas dignas de confiança, não ultrapassava
umas poucas centenas de pessoas, transformam-se em "milhares" nos
diários; e "os aplausos entusiásticos e as horas de apertos de mãos e
congratulações" na verdade não passavam de sinais de aprovação e comedidas
manifestações de concordância. Como os diários pretendiam ser particulares, não
pode haver dúvida de que Goebbels tinha também enorme capacidade de enganar a
si próprio. Eram, os seus diários, um espelho cor-de-rosa a refletir as imagens
que mais tarde refletiriam os seus numerosos e bem talhados ternos. Mas, por
enquanto, eram apenas distorções auto-induzidas.
Contudo, na primavera de 1926, o próprio Hitler condescendeu
em levar Goebbels consigo numa tumultuosa viagem pela Baviera, durante a qual
ele seria o orador de apoio. Naturalmente, a condescendência destinava-se a
vitaminar a vaidade de Goebbels, providência que salienta a necessidade em que
Hitler se encontrava de ter em torno de si, na época, número cada vez maior de
seguidores dignos de confiança que poderiam ser indicados para as várias posições
de mando à medida que o partido evoluía para a conquista do poder.
A alegria de Goebbels leva-o a depositar uma coleção de
incoerências em seu diário: "Tudo nele é bondade... ele é um rei... mas,
Cristo ou João?... Tenho seu carro e seu motorista às tardes... ele me abraça
enquanto os gritos de entusiasmo abafam tudo... heil após heil... tenho os
olhos marejados de tanta emoção... sua mão tem a firmeza da de um rei na de um
príncipe secundário... seus olhos prendem-me como um abraço... " E assim por
diante, em termos destinados a sustentar seu próprio ego e, ao mesmo tempo, ser
preconcebidamente favorável ao Führer, para o caso de ele vir a pegar o diário
- o que Goebbels pretendia que viesse a acontecer. "É preciso
lembrar", escreve Prang, "que Goebbels tinha excelente faro para o
sucesso psicológico; tanto quanto Hitler. Assim, com efeito, os dois se estavam
superando mutuamente na conivência - Hitler para conquistar Goebbels pela
adulação, e este, preparando uma espécie de base para Hitler pisar como que
sobre um tapete vermelho. Encontramos muitas anotações no diário dizendo que
Hitler enviou flores a Goebbels, ou que este 'presenteou o Führer com um
singelo buquê de rosas que trouxe lágrimas àqueles grandes olhos' e muitas
extravagâncias desse tipo".
Quais seriam as intenções de Hitler? Por que se daria ele a
tanto trabalho para conquistar um homem que ainda não chegara aos trinta anos e
que - apesar do que afirmaria mais tarde - apenas se filiara ao partido havia
alguns meses, e cuja natureza maníaco-depressiva insinuava uma instabilidade
indesejável na política? A resposta talvez residisse na fantástica percepção
psicológica do Führer, que sentiu em Goebbels o organizador potencial da
propaganda do partido - um campo no qual ele próprio era um virtuose, como
relata em Mein Kampf. Mediante hábil publicidade e com apenas o capital
original do partido, de 7.50 marcos e sete membros desorientados cuja única
ideologia, usada somente em conversas frívolas, era esmagar judeus e
bolchevistas, ele conseguiu arregimentar uma força que no começo dos anos 20
atingia cerca de 2.000 membros. Portanto, justo é que se lhe reconheça o
direito de afirmar que reconhecia a distância um bom propagandista.
Mas no momento havia trabalho mais áspero a ser feito do que a
fabricação de propaganda e Goebbels teve de provar que era, além de
inteligente, um implacável membro do partido. O campo de provas seria Berlim,
onde o Gauleiter (líder de área) era um homem chamado Schlange, que fora
nomeado pelos irmãos Strasser e que permitira que a confusão, a negligência e a
irresponsabilidade começassem a comprometer a organização partidária. Hitler
via aí a oportunidade de testar a lealdade de Goebbels e, através da
reformulação da atividade partidária que este promoveria, minar o prestígio de
Strasser.
"Desde o momento em que comecei a organizar o
partido", registra sua Conversa de Mesa, "decidi nunca preencher um
cargo até que tivesse encontrado o homem certo para o ocupar. Mesmo quando os
membros mais antigos do partido se queixavam da liderança política em Berlim,
esperei até que lhes pudesse garantir que encontrara no Dr. Goebbels o homem
que estava procurando. Ele possui dois atributos sem os quais ninguém poderia
dominar as condições em Berlim: inteligência e o dom da oratória. Depois de
estudar, a convite meu, a organização do partido em Berlim, ele localizou o
problema na liderança juvenil e pediu-me carta-branca para introduzir as
mudanças necessárias e expurgar do partido os elementos insatisfatórios. Nunca
me arrependi de ter-lhe dado os poderes que pedira".
Goebbels não estava, de modo algum, ansioso por assumir a
liderança do partido em Berlim. Tendo conseguido atrair a atenção de Hitler,
era do seu mais alto interesse manter-se em sua órbita, o que significava ficar
no sul, na Baviera, onde Hitler estava concentrando todo o esforço possível.
"Não quero ficar atolado na confusão de Berlim", consignou ele em seu
diário, "embora, se o Führer me desse o cargo de Chefe da Propaganda do
Partido, esteja disposto a ir para qualquer lugar, para me desincumbir da
tarefa".
Outro golpe, mais amargo do que a perspectiva de vir a ter
que sair das proximidades do Führer, aconteceu então: Gregor Strasser foi por
ele nomeado, a 26 de outubro de 1926, chefe de Propaganda e Publicidade do
partido, sendo, logo depois, Goebbels destacado para Berlim. Assim,
ardilosamente, Hitler instilou em Goebbels ressentimentos contra Strasser e
neste uma sensação de falsa segurança; estimulou a lealdade de Goebbels para
com ele conferindo-lhe uma tarefa administrativa de importância e deu a si
mesmo a possibilidade de atingir novas platéias, tendo Goebbels como porta-voz.
(Os termos do documento normativo da atividade de Goebbels incluíam a proibição
de falar em público - proibição esta que podia ser parcialmente superada, desde
que os discursos políticos se limitassem a platéias "fechadas", isto
é, a indivíduos que, por definição, já eram membros do partido, de modo que
grande parte do seu esforço se diluía na pregação para os convertidos.)
Na noite de 9 de novembro de 1926, o 3o aniversário do putsch
nazista, Goebbels chegou a Berlim. "Um cinzento crepúsculo de novembro cai
sobre Berlim quando meu trem chega a Potsdammer Bahnof e, menos de duas horas
depois já me encontro pela primeira vez na plataforma do orador que será o
ponto de partida para futuro desenvolvimento."
Daquela noite em diante sua vida tomaria novo rumo.
4. O PALCO
O palco de Berlim, onde Goebbels agora pisava, estava
preparado para um drama de certa magnitude. Nos bastidores, espreitavam os mil
e tantos nazistas que eram os únicos representantes do partido, até agora
fracamente orientado por Schlange. Este, funcionário público por profissão,
esteve sempre muito mais empenhado em conservar o cargo do que em promover a
causa nazista. Apinhando-se no palco estavam os comunistas e social-democratas,
que eram a maioria eleitoral na capital. No fundo do palco, sinistro de tanta
corrupção, o "Antro do Ópio" (como Goebbels o chamava) - um porão na
Potsdammerstrasse que era a sede oficial da Gau de Berlim.
Ele achava o nome bastante apropriado: "Os raios do sol
nunca chegavam ali. A luz elétrica ficava acesa dia e noite. Mal se abria a
porta, uma nuvem de fumaça de mil cigarros avassalava as narinas. Montes de
jornais velhos e arquivos mais velhos ainda entulhavam o local. Na ante-sala,
os membros desempregados do partido costumavam ficar conversando, matando o
tempo. Havia um pretenso administrador que, orientado somente pela memória,
anotava num livro a entrada e saída de dinheiro. Era impossível qualquer
trabalho sistemático em ambiente tão confuso. As finanças eram uma barafunda e
a Gau de Berlim só tinha dívidas.
Goebbels escreveu imediatamente a Hitler pedindo carta-branca
para "expurgar o partido de todos os elementos insatisfatórios".
"Você só é responsável perante a mim", respondeu-lhe o Führer.
Goebbels mandou então emoldurar a carta e a pendurou na parede do novo
escritório que alugou na Lützowstrasse. "Achei que seria bom",
escreveu ele em Batalha por Berlim, "que houvesse prova visível da minha
autoridade, pois pretendia ser implacável na reorganização do partido. Se
alguém pretende ser Gauleiter [Gau significa líder], primeiramente tem de
preparar sua Gau para que seja capaz de ser liderada".
Apesar da urgente necessidade de aumentar a filiação
partidária no norte, Goebbels pôs-se implacavelmente a trabalhar no pretendido
expurgo, expulsando 400 dos membros de Berlim. "Os que não contribuíam com
dinheiro ou com trabalho foram eliminados. Preferia uma filiação menor, mas digna
de confiança, a um monte de desocupados que, além de nada pagarem, ainda
debochavam do esforço dos outros."
A 1° de janeiro de 1927 ele dirigiu-se aos 600 membros
restantes do partido, exigindo 3 marcos de cada um como contribuição mensal
para os fundos do partido e ordenou àqueles que não se submetessem à sua
liderança e às suas ordens que deixassem o recinto imediatamente. Ninguém saiu.
"Temos uma tremenda tarefa pela frente",
prosseguiu. "O partido aqui em Berlim é como um cordeiro desgarrado, à mercê
de bandos de vermelhos que, ocultos, estão prontos para devorá-lo. Há quase 5
milhões de habitantes em Berlim e somos 600, anônimos no meio deles. Temos de
derrubar a parede do anonimato. Os berlinenses têm de ouvir-nos e falar de nós.
Podem insultar-nos, caluniar-nos, investir contra nós, surrar-nos, mas temos de
fazê-los falar de nós, esta a grande tarefa. E juro-lhes que, embora sejamos
hoje apenas 600, em seis anos seremos 600 mil."
Embora, por nomeação de Hitler, Gregor Strasser fosse diretor
da propaganda nazista, não há quase evidência de que se tenha dedicado à
tarefa, exceto apoiar o partido em seu jornal Nationalsozialistische Briefe
(agora adequadamente impresso e consideravelmente aumentado). Ele não tinha o
dom de atrair a atenção das massas, e na verdade foi Goebbels quem se
encarregou da tarefa de derrubar "a parede do anonimato",
antecipando-se à cobiçada nomeação para o cargo de propagandista do partido.
A propaganda é um meio utilizado para fazer alguém aceitar um
principio, uma teoria, uma doutrina através das emoções. Embora falem
alegremente de "educar as massas", os propagandistas apelam não para
a razão, mas sempre para a emoção e o instinto. A própria palavra propaganda só
apareceu em 1622, quando o Papa Gregório XV convocou uma Comissão de Cardeais
para orientar a difusão da palavra cristã pelas missões estrangeiras. A
comissão foi chamada Congregatio de Propaganda Fide - Congregação para a
Propagação da Fé, e funcionava como uma comissão de qualquer outra sociedade
missionária - escolhendo missionários e despachando-os para o estrangeiro. Mas
não demorou para que a palavra ganhasse significados outros que não propagação
de crenças religiosas, como, por exemplo, agressão nacional, proselitismo
político, deturpação de fatos e censura por supressão, coisas muito
convenientes para Hitler. Essas sinistras atividades não tinham nada de novas.
O Oráculo de Delfos do mundo antigo, pela hipnose, comandara as empresas
colonizadoras dos atenienses. Tucidides, em sua história da Guerra do Peloponeso,
revelou que as facções em confronto aumentavam seu domínio sobre os não
convencidos pela contínua deturpação dos fatos. Platão, em sua República,
preconizava o banimento de todos os escritores cuja influência fosse
desagregadora, e que para o lugar deixado por eles fossem nomeados publicistas
de tendência republicana; as paredes de Pompéia estavam cheias de lemas de
propaganda eleitoral e a Inquisição Espanhola armou-se com todas as formas de
censura que ajudassem seus objetivos. Evidentemente; a relativa inocência de um
conceito como o do Papa Gregório pode ser conspurcada por qualquer regime
totalitário, pois é tão fácil propagar as mentiras quanto as verdades.
Portanto, a propaganda, como William Albig diz acertadamente
em seu livro Public Opinion, "aparecia sempre que qualquer liderança
tentava unir as opiniões de um povo, desde a propaganda política de um Júlio
César à propaganda da Igreja Católica Romana, à propagação da Lenda
Napoleônica, ao propagandismo de Potemkin em favor de Catarina a Grande, à
propaganda panfletária de Sam Adam para a Revolução Americana, à propaganda do
Norte e do Sul na Guerra Civil Americana, às propagandas que proliferaram, em
todos os lados, na Segunda Guerra Mundial".
Bismarck, com quem Goebbels entusiasticamente comparava
Hitler, também era um mestre da propaganda. Grande parte da leitura de
Goebbels, nos seus primeiros tempos em Berlim, foi dedicada ao estudo dos
métodos de Bismarck, que haviam incluído cartas forjadas, pretensamente vindas
de Roma ou Paris, que ele conseguia fazer publicar na imprensa, a criação de
"turmas especiais de boateiros" (Gerüchtemacher), para espalhar o
desânimo na oposição, e a organização do "bureau" de imprensa
estrangeira.
Goebbels usaria "material de impacto" contra seus
adversários e não perdeu tempo em reunir dossiês repletos de "fatos"
sobre comunistas, judeus, capitalistas liberais e todos os antinazistas para
usá-los de qualquer modo eficaz - incluindo a distorção - quando chegasse o
momento. Enquanto aguardava o momento adequado, Goebbels recomendava métodos
grosseiros, barulhentos e destinados apenas a atrair atenção - desfavorável de
preferência, já que havia muito mais publicidade em ser vilipendiado do que em
ser elogiado.
Os métodos que tinha à disposição, com o dinheiro que podia
usar, eram poucos. Cada Gau procurava manter-se com suas próprias verbas e,
como Goebbels observara, Berlim estava em péssimo estado. A publicidade através
da imprensa, de qualquer tamanho razoável, a publicidade postal em grande
escala, os tapumes utilizados pelos agentes publicitários estavam todos
proibidos pelos custos. A transmissão radiofônica, que mais tarde Goebbels
transformaria no grande veículo de difusão da filosofia nazista, não era dirigida
em bases comerciais, mas, ainda que fosse, seria dispendiosa demais, como
outras formas de publicidade em larga escala. Portanto, restavam-lhe apenas os
meios mais simples de campanha, que se revelaram, força é reconhecer, bastante
eficazes.
Goebbels começou com pequenos cartazes, que os membros do
partido colavam em colunas cilíndricas, que eram colocadas nas esquinas das
ruas especialmente para essa finalidade, sem ônus para o usuário, sendo
considerado crime o dano de qualquer tipo aos edifícios e locais públicos. Mas,
por serem livres, havia uma corrida contínua a essas colunas. Os colocadores de
cartazes, competindo pelo espaço nessas colunas, ficavam à espreita, aguardando
a oportunidade de poder substituir um cartaz por outro, valendo-se também dos
meios os mais engenhosos, inclusive os efeitos aplicados às comédias de
pastelão, como queda de escada etc., para chamar a atenção dos passantes. Os
cartazes eram desenhados pelo próprio Goebbels, usando o conhecimento de artes
gráficas que adquiriu na redação do jornal dos Strassers.
Ele usava tipos
grandes e tinta vermelha para destacar uma frase provocativa, como o KAISER DA
AMÉRICA FALA EM BERLIM, embaixo da qual, em tipos menores mas também
destacados, um ataque ao "Plano Dawes" e a seu negociador, o Ministro
das Relações Exteriores, Gustav Streseman. Raramente havia referência direta a
Hitler ou aos nazistas. Os cartazes pretendiam apenas provocar curiosidade -
objetivo que conseguiram a ponto de atrair a atenção da imprensa liberal - e
atingir, por exemplo, um alvo: considerar maléfico o "Plano Dawes",
porque exigia fidelidade ao Tratado de Versalhes, e Streseman um traidor.
Goebbels absorvera completamente a análise que Hitler fizera da propaganda em
Mein Kampf. Um dos princípios ali preconizados era: "A verdade tem de ser
sempre adaptada para ajustar-se à necessidade. O que diríamos de um cartaz que,
pretendendo anunciar nova marca de sabonete, insistisse nas qualidades das
marcas rivais? Naturalmente sacudiríamos a cabeça. O mesmo aconteceria com um
cartaz de propaganda política que incorresse no mesmo pecado. O objetivo da
propaganda não é tentar julgar direitos conflitantes, dando a cada um o que
merece, e sim salientar exclusivamente o direito que estamos defendendo. A
propaganda não deve investigar a verdade objetivamente. Na medida em que a
verdade pende para o outro lado, deve-se apresentá-la de acordo com as regras
teóricas da justiça, e só o aspecto da verdade que nos é favorável deve ser
manifestado".
Além disso, Goebbels recebera de Hitler, nessa época, a cópia
de uma diretiva que o Führer mandara incluir na Segunda Parte do Mein Kampf.
Ela vinha acompanhada de uma nota confidencial explicando que, embora a
diretiva interessasse principalmente a Gregor Strasser, como Chefe da Propaganda,
Goebbels deveria observar atentamente o seu conteúdo "porque é seu o
trabalho de aumentar nossa força em Berlim". (Dar a Goebbels um vislumbre
confidencial da diretiva era um exemplo típico da habilidade de Hitler em criar
correntes de suspeita entre seus executivos. Ele prosseguia lentamente em seus
desígnios contra Gregor Strasser, cujo apoio ainda lhe era necessário, sem
esquecer um instante sequer que Strasser tentara assumir o controle do partido
enquanto ele, Hitler, estava na prisão. A diretiva dizia o seguinte: "O
objetivo da propaganda é atrair seguidores. A tarefa da organização é
conquistar novos membros. O seguidor de um movimento é aquele que se declara
concorde com seus objetivos. O membro é o que luta por ele. Haverá dez
seguidores para cada um ou dois membros, no máximo. A filiação como membro
requer espírito ativo e, assim, se aplica somente a uma minoria. Portanto, a
propaganda cuidará incansavelmente para que uma idéia conquiste adeptos,
enquanto que a organização tem de observar atentamente que apenas os mais
valiosos dentre os adeptos sejam transformados em membros. Depois que a
propaganda conscientizou todo um povo a respeito de uma idéia, a organização
pode obter o máximo de benefícios com a ajuda de apenas um punhado de pessoas".
Goebbels não tinha qualquer conhecimento de estratégia
militar, jamais viu ação em qualquer frente e, à parte uma breve visita a
Genebra, permaneceu na Alemanha, principalmente em Berlim, durante toda a sua
vida de nazista. Contudo, ele poderia ter adotado como lema a enérgica
conclamação do Marechal Foch a seus comandados ("Meu centro está cedendo,
minha direita está recuando; a situação é excelente; atacarei!") no
próximo movimento. (Não é sem propósito que o jornal de propaganda nazista que
ele em breve fundaria seria chamado Der Angriff [O Ataque].)
Sendo o ataque o melhor método de defesa e sendo os
movimentos revolucionários feitos, conforme acreditava, por oradores, e não por
escritores, ele entrou no campo inimigo e, para uma reunião a 11 de fevereiro de
1927, alugou o Salão Pharus, situado no coração comunista da cidade. Os
cartazes anunciando a reunião foram impressos numa imitação direta dos anúncios
dos comunistas e a fraseologia tinha a mesma conotação:
"O Estado Burguês aproxima-se do fim! Temos de forjar um
novo Estado! Trabalhadores: o destino da nação alemã está em suas mãos!"
Não existe meio mais eficaz para atrair a atenção do que
provocando uma cena violenta, particularmente se for prefaciada por uma
verdadeira parada pseudomilitar, com agitação de bandeiras etc. Goebbels deu
ordem para que todo membro do partido desfilasse na frente da sede, na
Lützowstrasse, com bandeiras e marchasse para o Salão Pharus. Ele também teve
um encontro com Kurt Daluege, o chefe das Tropas de Assalto. Esta formação, que
inicialmente era a guarda-costas de Hitler, crescera muito, transformando-se
num considerável corpo paramilitar especializado em trabalhos violentos para o
partido.
Daluege (que por profissão era engenheiro civil, encarregado
dos depósitos de lixo da cidade, considerado pelos que o conheciam pouco mais
que um cabeça dura) fora encarregado de presidir a reunião e
"guardar" a sala com seus esbirros. Como Goebbels escreveu mais
tarde, em Batalha por Berlim: "Na verdade, eu criara deliberadamente uma
situação que só precisava que se acendesse a mecha para que se desse uma
explosão".
Os comunistas, irritados pela maneira como haviam sido
desafiados em seu próprio covil, ameaçaram com derramamento de sangue, se a
reunião fosse realizada. "Sua imprensa superou-se em ameaças horrendas.
Afirmava que nos seria feita uma recepção calorosa - tão calorosa que não
teríamos vontade de voltar."
As Tropas de Assalto de Daluege haviam recebido ordens de
comparecer à paisana e se misturar com a platéia e com a multidão fora da sala.
E quando os membros do partido - metidos em uniforme completo, com botas de
montaria e braçadeiras - cruzaram, empertigados, as ruas, com suas bandeiras e
suas suásticas, atraíram grande número de parasitas, curiosos por saberem que
diabo era aquilo. Naturalmente houve zombarias, apupos, aplausos e reações
várias, por parte dos que passavam. No Salão Pharus, uma atmosfera sombria e
ameaçadora pairava no frígido ar de fevereiro. Um diretor de cinema poderia ter
feito um verdadeiro clássico da tela com os cortes de uma câmara voraz. Esse
trabalho mostraria as faces todas da brutalidade, da ameaça e do ódio; as mãos,
armadas de maças e soqueiras com que se armaram os contendores, teriam sido
evidentes; e a trilha sonora - se possível na época - seria uma sugestão de
violência. Na verdade, houve violência. Daluege, na Presidência, mal declarara
aberta a reunião quando partiu um berro do fundo do auditório. Sem dúvida foi
um comentário insensato sobre o tamanho da agenda, mas muito antes que tal
comentário se concluísse, Daluege pegou uma garrafa de água de cima da mesa e
atirou-a na direção de onde partia o comentário. Num instante, canecas de
cerveja, garrafas e uma mistura surpreendente de ferragens voaram pelo
auditório, enquanto nazistas e comunistas se pegavam em violenta briga.
Goebbels, sentado à direita de Daluege, ordenou claramente: coitus interruptus
- uma frase-código que ele cunhara para a ocasião - e seis membros das Tropas
de Assalto que estavam no fundo do auditório agarraram o intruso e o surraram
brutalmente, ao mesmo tempo que as portas laterais se abriram e o corpo
principal das Tropas de Assalto invadiu o recinto e começou a cuidar de
qualquer um que oferecesse resistência. A polícia, que se mostrou singularmente
relutante em participar da festa - talvez a corrupção tivesse funcionado bem -
acabou aparecendo. Fizeram-se prisões - principalmente de bodes expiatórios - e
os feridos receberam alguns cuidados.
"Tudo isto demorara mais de trinta minutos", diz
Goebbels a respeito do acontecido. "Ordenei então que os membros do
partido e das Tropas de Assalto que haviam sido feridos fossem levados para o
palco, onde poderiam ser vistos claramente e ouvidos os seus gemidos. Falei à
platéia sobre um assunto que deveria parecer improvisado - 'O Desconhecido
Soldado da Tropa de Assalto' - ordenei que a intervalos de dez minutos, durante
meu discurso, os feridos fossem levados dali, um a um, com seus sangrentos
ferimentos claramente visíveis. Constatei que o método era extremamente eficaz
para atrair atenção." O principal ator do drama nazista de Berlim estreara
no palco de onde não mais sairia.
5. COMEÇA O
DRAMA...
Referindo-se a si mesmo, Goebbels disse que "nascera
para o drama". Havia, sem dúvida, certa justificativa para fantasias desse
tipo, de que estão cheios seus diários. O malogro das tentativas que fez no
sentido de ingressar no teatro, solicitando, imprudentemente, um emprego de
produtor, não se deveu propriamente a um defeito de orientação, embora não se
possa dizer que tenham sido bem dirigidas. Tudo nele revelava a vocação para o
drama. As Reuniões de Nuremberg, a apresentação dos seus discursos e os
recursos de que se utilizava para provocar tensão dramática eram astutamente
estudados. Ele jamais poderia criar a atmosfera emocional que Adolf Hitler
inspirava, mas o controle que tinha do gesto e da palavra era igualmente
eficaz, de um modo diferente. Ele escrevia seus discursos com imenso cuidado,
usando tintas coloridas para distinguir as diferentes tonalidades de ênfase e todos
eles eram ensaiados diante de um espelho triplo, em seu quarto, na residência
dos Steigers, no Tiergarten - acomodação que os Strassers lhe arranjaram tão
logo chegou a Berlim.
Os Steigers eram ricos e importantes. Todas as pessoas de
posição, em Berlim, cultivavam a amizade deles. Johann Steiger era membro da
junta editorial do Berliner Lokalanzeiger, que pertencia a Alfred Hugenberg, um
dos muito respeitados industriais que forneciam dinheiro ao partido nazista e
arrebanhavam seguidores nas camadas mais altas - seguidores que auxiliavam
monetariamente o partido com o dinheiro que receberam do confisco de
propriedades que possuíam, na esperança de que o grande projeto anunciado por
Hitler para o Terceiro Reich os reabilitasse. Em troca da esperança, Hitler,
Goebbels etc. iam sugando-lhes o dinheiro. "Esta gente é companhia boa e
importante", disse Goebbels em carta a seus pais. "Frau Steiger tem
dinheiro e freqüentemente recebe a melhor sociedade, descendentes da nobreza
germânica, figuras importantíssimas da realeza, e todos admiram meus discursos,
a minha eloqüência. Estão certos de que tenho um grande futuro." As
"figuras importantíssimas da realeza", uma exageração de Goebbels,
não eram mais que o Grão-Duque de Mecklenburg e Hesse, o Príncipe August Wilhelm
von Hohenzollern, o Duque Ernst August de Brunswick, o Príncipe Christian von
Schauberg-Lippe, por exemplo - e eles absorviam o encanto e servilismo de
Goebbels como esponjas. Na elegante sala de estar dos Steigers, eles ouviam de
bom grado os discursos que Goebbels ensaiava, discursos para cuja elaboração se
inspirava nas melodias nacionalistas que extraia do piano "Bechstein"
que Johann Steiger ganhara de presente de Natal de Helene Bechstein, mulher do
fabricante, ardorosa hitlerista e contribuinte efetiva do partido. "O
pequeno Doktor", disse um deles, "transmite depressão, mas inspira
confiança em si mesmo, se não no futuro da Alemanha".
No começo de 1927, o futuro econômico da Alemanha foi
superficialmente avivado por imensos empréstimos - cerca de sete bilhões de
dólares ao todo - que os Estados Unidos fizeram ao tesouro germânico nos termos
do "Plano Dawes".
"A República", diz William L. Shire em Ascensão e
Queda do Terceiro Reich, "fez empréstimos para pagar as reparações a que
estava obrigada e aumentar os serviços sociais que prestava e que eram o modelo
do mundo. Os estados, cidades e municípios fizeram empréstimos para financiar
os melhoramentos necessários, como a construção de aeródromos, teatros,
estádios esportivos e piscinas.
A indústria, que eliminara suas dívidas na inflação, tomou
bilhões emprestados para se reequipar e racionalizar os processos de produção,
produção que em 1923 caíra para 55% da registrada em 1913, e subiu para 122% aí
por volta de 1927. Pela primeira vez, desde a guerra, o desemprego caiu para
menos de um milhão - 650.000 - em 1928. Naquele ano, as vendas a varejo
aumentaram 20% sobre 1925, e, no ano seguinte, os salários reais eram 10% mais
altos que os dos quatro anos anteriores. As classes média e baixa, os milhões
de lojistas e pequenos assalariados aos quais Hitler tinha de recorrer em busca
do apoio de massa, compartilhavam da prosperidade geral".
Contudo, essa prosperidade geral perderia substância em
meados daquele ano. Por volta de junho, a Bolsa de Valores mostrava sinais de
fraqueza e não se registrou nenhuma recuperação em bases sólidas até que Hitler
subiu ao poder como Chanceler, pois o colapso da Wall Street, em outubro de
1929, teve reflexos na economia alemã, como de resto na economia mundial. Sem a
ajuda do dinheiro americano, que, segundo o Presidente Calvin Coolidge, fora
despejado aos montes pelo "Plano Dawes", a economia alemã começou a
demonstrar toda a sua fragilidade. Como diz Shirer, houve períodos de ilusória
prosperidade; mas a base da economia nacional era insegura, e Goebbels, cuja
ignorância em economia era total, fez profecias de depressão, porque sentia -
muito acertadamente - que o partido só poderia progredir em meio ao desastre do
desemprego em massa e da depressão. "O colapso, moral, físico e financeiro
está às nossas portas", clamava e escrevia incessantemente. E, de acordo
com a regra básica da propaganda, apresentava suas provas - provas estas que
naturalmente não diziam nada sobre nada que esclarecesse o ponto de vista
oposto. E como se tornava cada vez mais evidente que a onda de prosperidade
começava a desfazer-se, ele foi encarado como um oráculo. A filosofia nazista
começou a polarizar a atenção de todos, homens de sociedade, negociantes e
gente comum.
Como a principal tarefa de Goebbels, na qualidade de
Gauleiter, era recrutar novos membros e seguidores para o partido, mas também
ter em mente a distinção entre eles, conforme indicada pelo Führer, o trabalho
que vinha desenvolvendo nesse sentido começou a apresentar resultados. Três
dias depois do confronto de fevereiro, no Salão Pharus, recebeu 2.600 propostas
de filiação ao partido, alem de 500 de ingresso nas Tropas de Assalto de
Daluege. Goebbels logo organizou outra reunião, na qual um velho pastor,
chamado Fritz Stucke, foi surrado pelas Tropas de Assalto e as autoridades do
hospital comunicaram seus ferimentos à polícia. O Assistente do Comissário era
um homem chamado Bernhard Weiss, um judeu culto, que proibiu imediatamente as
atividades dos nazistas em toda a Grande Berlim. A proibição, por sua vez,
ganhou as manchetes dos jornais, resultando em boa publicidade para Goebbels,
além de enriquecer a linha da caricatura mordaz que Hitler histericamente
traçou no Mein Kampf do arquétipo do judeu e que Goebbels fez questão de
servilmente conservar na sua propaganda partidária. Mais tarde, porém,
revelou-se que o Pastor Stucke havia-se afastado de sua igreja por causa do
alcoolismo crônico e que na verdade não era um democrata, e sim pró-nazista.
(Mais tarde ele foi recompensado pelo partido com um cargo a ser exercido na
pequena cidade de Koeslin, onde poderia beber até morrer.) Toda essa publicidade
foi um achado valioso para Goebbels; ele estava certo, ao escolher métodos os
mais vulgares para atrair atenção.
O insulto era realmente uma arma muito mais poderosa nas mãos
dos nazistas do que o elogio. O insulto podia ser torcido com mais facilidade.
Ele podia ser transformado em injustiça, inveja, vingança ou em qualquer tipo
de humilhação. Desse modo, o insultado, o invejado e o ferozmente punido podia
conquistar não só simpatizantes como também seguidores.
A proibição policial apresentava como justificativa o fato de
que desde a chegada de Goebbels a Berlim vinham ocorrendo incidentes contínuos,
causados sempre pelas Tropas de Assalto, choques nas reuniões e não poucas
mortes misteriosas com inferências políticas. Não há dúvida de que a polícia
estava ficando desalentada, por causa do número cada vez maior de procissões,
bandeiras e desfiles com bandas tocando música que evocavam emoções perigosas.
Na tensa atmosfera emocional que se criou, Goebbels despejava seus discursos,
numa linguagem carregada de ironia e desprezo, depois de entrar dramaticamente
no momento preciso em que a platéia começava a inquietar-se. Ele era um
agitador e um perturbador da paz que à policia cabia manter. Mas, justificada
ou não, a proibição foi singularmente ineficaz. Goebbels continuou falando em
reuniões "particulares", realizadas no salão dos Steigers ou nas
cervejarias, com os convites sendo feitos oralmente, não mais por meio de
cartazes ou pela imprensa. Era muito simples fundar clubes "sociais",
ostensivamente para prática de esportes, jogos de salão e debates literários.
Tudo o que aconteceu, como resultado da proibição, foi que as atividades
políticas do partido tornaram-se clandestinas. A parte visível do movimento
disfarçou-se de reuniões sociais.
E a proibição, que Goebbels explorou cuidadosamente, foi
citada como manifestação do medo que a República sentia diante do crescente
poder do partido. Assim, segundo ele:
"Eles logo pararam de rir da nossa inflexível
determinação. Começaram a nos insultar e denegrir. Quando a perseguição e a
maledicência fracassaram, eles atiraram o Terror Vermelho contra nós, mas este
nos encontrou lutando valorosamente. O adversário começou a espumar e a
recorrer à anarquia e à ação arbitrária. Agindo contra suas próprias pretensas
convicções democráticas, ele proibiu nosso partido. Agora não existimos mais -
assim pensa ele. Com uma penada, um jagunço judeu pretendeu eliminar-nos da
lista das realidades. Voltamos a ser anônimos. A simples menção do nosso nome e
a simples vista da Suástica estão abalando as fundações da República. Quem
dentre nós pensaria que somos tão fortes assim?"
"Negado o direito de falar", prosseguiu Goebbels,
"tornou-se essencial que o partido conseguisse outra plataforma de onde se
pudesse lançar à propaganda nacional-socialista. Embora considerasse a palavra
escrita relativamente inútil, em comparação com o poder do orador, fui obrigado
a recorrer a ela, ainda que temporariamente".
Pensando na forma de apresentar a palavra escrita, decidiu
Goebbels que a melhor seria através de um jornal sobre o qual tivesse completo
controle e que fosse independente do Berliner Arbeiterzeitung.
"Nunca me esquecerei que, certa noite, estávamos
reunidos num pequeno grupo pensando em como se chamaria o novo jornal. De repente
eu tive uma inspiração: certamente só podia haver um nome para o nosso jornal:
Der Angriff ["O Ataque"]. O próprio nome tinha seu valor
propagandístico, porque tudo o que queríamos era atacar."
O primeiro número, publicado numa segunda-feira, 4 de julho
de 1927, foi feito numa gráfica que não dispensou à tarefa muito cuidado, já
que lhe havíamos pedido um crédito de três meses. O papel absorvia tinta como
um mata-borrão. Praticamente seus únicos compradores eram membros do partido
que haviam recebido ordens de assiná-lo antecipadamente. Quanto ao seu
conteúdo, dificilmente poderia ser mais vulgar. Os cartuns eram espalhafatosos
e mal desenhados; a tipografia nada concedia ao bom-gosto e o editorial era
virulento. Embora grosseiramente elaborado, o panfleto revelou-se eficaz para a
causa. (Não tinha qualquer valor noticioso e só se interessava pela política e
em catar e denunciar corrupção administrativa.)
Passado um mês já O Angriff provocara confusão suficiente
para repor Goebbels na berlinda. Bernhard Weiss, Assistente do Comissário, foi
violentamente atacado, tanto com palavras como pela caricatura. Fazendo
explodir o rancor à raça judia, Goebbels transfigurava Bernhard Weiss, que era
judeu, num elemento repulsivo, num vigarista, num réptil, numa aranha faminta,
tratando-o sempre por Isidore, nome que em alemão representa toda a sorte do
mal. "Esta é a face da nossa pretensa democracia", dizia uma das
legendas; "maculada e destorcida pela covardia e pela hipocrisia".
"Tornamos Weiss responsável por todos os males que a
policia nos causou, e nos termos mais condenáveis", escreveu Goebbels,
mais tarde, em Batalha por Berlim. Naturalmente a tática adotada pela direção
do jornal fez que contra ele surgissem interditos e ações por calúnia e
difamação, que deveriam ter resultado em sentenças de prisão contra o editor e
os redatores. O fato de não ter isso acontecido subentende o medo que havia das
represálias dos nazistas, com suas Tropas de Assalto e seu grupo de espiões e
conspiradores, que, embora colocados fora da lei, eram muito ativos. O medo
subjacente era, de certo modo, compreensível. Weiss foi atacado e surrado certa
noite, quando passeava sozinho, e alguns dos seus atacantes eram seus próprios
policiais, que posteriormente afirmaram tê-lo confundido com um delinqüente, no
beco estreito e mal-iluminado. Contudo, parece mais provável que o ataque tenha
resultado de uma prematura transfusão de sangue nazista para as veias
policiais. De qualquer modo, Goebbels se lembraria de que nos primeiros tempos de
existência de O Angriff "meu único desejo era ver o dia em que chegaremos
ao QG da Polícia, bateremos à porta e diremos: Herr Weiss, sua hora
chegou".
A hora de Weiss e de grande número de outras pessoas se
aproximou ainda mais com a notícia de que haveria eleições nacionais a 29 de
maio de 1928. Para que não pairassem dúvidas quanto à linha democrática da
República, o partido nazista teve permissão de agir abertamente de novo,
deixando livre o caminho para Hitler. A intenção de Hitler era, como sempre
fora, fazer crer que a opção pelo Nacional-Socialismo parecesse mais uma
escolha livre do povo que uma imposição; e foi isto o que aconteceu, embora não
sem a ajuda de muitas circunstâncias fortuitas que colocaram o poder real ao
alcance da mão do Führer.
Em 1928 ele sequer tinha o direito de concorrer às eleições
para Deputado do Reich. Hitler era um apátrida, tendo renunciado à cidadania
austríaca a 7 de abril de 1925, na esperança de que a República Alemã lhe
oferecesse a cidadania alemã por serviços prestados à pátria durante a guerra.
Como a contribuição que deu durante o conflito não tivera qualquer distinção,
exceto a condecoração, por méritos extremamente dúbios, com duas Cruzes de
Ferro, era pouco provável que isto provocasse, no Departamento de
Naturalização, a disposição para atender à expectativa de Hitler, e realmente
não provocou. Ele tentou arrancar uma recomendação de amigos influentes na Baviera
para que lhe conferissem a cidadania alemã; mas esses amigos ou eram menos
influentes do que ele supunha, ou menos amistosos. Contudo, a representação
potencial nazista no Reichstag era suficientemente simples para dar um jeito de
indicar alguns dos seus favoritos para as eleições. Goebbels foi uma das
primeiras escolhas do Führer. Isto colocou o Gauleiter de Berlim numa posição
que seria embaraçosa para qualquer outra pessoa. Há meses Goebbels vinha
atacando o Reichstag em artigos publicados em O Angriff.
"Há grandes saguões para facilitar a digestão, cheios de
longas fileiras de cadeiras de braços estofadas que oferecem excelentes
oportunidades para uma soneca. Usar o termo soneca é ser muito moderado; se
chegamos ali à tarde, ouvimos o ressonar coletivo e satisfeito dos deputados.
Os representantes do povo alemão estão sempre descansando do extenuante
trabalho realizado pela pátria."
Caracteristicamente, ele justificou a guinada que teve de dar
com agressiva confiança.
"Entraremos no Reichstag para nos abastecermos no
Arsenal da Democracia com suas próprias armas. Nós nos tornaremos deputados do
Reichstag para mudar o modo de pensar de Weimar com o apoio de Weimar. Se
conseguirmos plantar no Parlamento sessenta ou setenta dos nossos agitadores e
organizadores, então o próprio Estado equiparará e pagará a nossa máquina de
combate. Qualquer um que seja eleito para o Parlamento está acabado, se
pretende ser apenas um parlamentar. Mas se, com seu arrojo inato, preservar na
luta implacável contra o crescente aviltamento da nossa vida pública, então ele
não se transformará num parlamentar apenas, mas continuará sendo o que é - um
revolucionário... Nós, que temos pregado, centenas, milhares de vezes; a
mensagem de fé numa nova Alemanha... Nós não pedimos apenas votos, exigimos e
esperamos convicção, devoção e paixão. O voto não passa de um expediente, para
vocês e para nós. Pouco ligamos se construímos uma esterqueira fedorenta,
porque estamos na disposição de limpar o esterco."
Havia 500 cadeiras no Reichstag, e se Goebbels estava
esperando seriamente conquistar 60 ou 70 delas, não demoraria a desiludir-se.
De um eleitorado de 30 milhões os nacional-socialistas
conseguiram somente 800.000 votos, 50.000 dos quais foram conquistados em
Berlim - aparentemente graças aos esforços de Goebbels como Gauleiter. Embora
pequena a votação conseguida, os nazistas conquistaram 12 lugares no Reichstag
- um dos quais coube a Goebbels. "Agora o espetáculo pode começar"
escreveu ele.
6. E
CONTINUA !
Em Hamburgo, durante a noite daquele dia de eleições, 20 de
maio, várias pessoas, nas ruas e em suas próprias casas, foram vítimas de um
vapor esverdeado que se abateu sobre a cidade e só se dissipou às primeiras
horas do dia seguinte, graças a um vento fortuito que começou a soprar da baia
para o interior. Nos hospitais para onde foram levados os atingidos, o vapor
entrando pelas janelas também fez que médicos e enfermeiras desmaiassem de
náuseas. Houve, ao todo, 28 casos de morte. Os que participaram da guerra
identificavam facilmente o vapor: era gás de cloro, ou algo estreitamente
relacionado com ele. Investigações revelaram que ele havia escapado de
cilindros existentes numa fábrica de motores navais situada próximo das docas.
No inquérito realizado, afirmou-se que os cilindros de cloro haviam sido
estocados para ser usados como alvejante, mas vários jornais liberais sugeriram
claramente que ele vinha sendo armazenado com a finalidade de ser aplicado em
guerra química. "Contra quem?" indagavam. "O Tratado de Versalhes
pode ser um documento injusto, sob alguns aspectos, mas a proibição que
estabelecia para o uso dos gases, em qualquer forma, exceto para fins
industriais, é sensata."
Naturalmente, os comunistas tentaram aproveitar-se do
acontecimento, apresentando provas muito mal engendradas, para afirmar que os
nazistas praticavam o terrorismo. Por sua vez, Goebbels teceu uma tapeçaria
maravilhosa de mentiras destinadas a "Somente uma Alemanha forte pode
convencer - e em numerosos casos convenceu - os indecisos de que os comunistas
estavam importando, em sacos de milho, não só cloro e outros gases irritantes,
como também ratos inoculados com a peste bubônica que seriam soltos contra as
multidões, a menos que os nazistas, conquistando o poder, pudessem impedir
esses cometimentos desumanos.
A prova apresentada por Goebbels em apoio da sua acusação não
teria, por si só, convencido um ingênuo menino de cinco anos, mas, revestida da
linguagem insolente do Gauleiter, atraiu atenção. Seguiram-se, como seria de
prever, várias ações judiciais contra O Angriff, terminando todas em pesadas
multas impostas ao redator e editor. Porém, se anteriormente à sua eleição para
deputado Goebbels não pagara as multas a que fora condenado, eleito, com
imunidade parlamentar para alegar, é que não pagaria mesmo. Desse modo, nem
Goebbels, nem os que com ele injuriavam os comunistas e os partidários de
agremiações políticas que pudessem constituir obstáculo à caminhada dos
nazistas cumpriram sentenças de prisão. Aliás, nunca ninguém explicou
satisfatoriamente a presença do cloro. Certo que na forma de gás ele não
poderia ser destinado a uso como alvejante. Apesar disso, a questão estava
mesmo fadada a cair no esquecimento.
A cadeira de Goebbels no Reichstag assegurava-lhe que suas
palavras seriam ouvidas por toda a Alemanha. Ele permaneceu como Gauleiter de
Berlim, mas gradativamente foi-se transformando em figura nacional. Para sua
imensa alegria, a 9 de janeiro de 1929, Hitler reorganizou seu
"gabinete". Gregor Strasser, ainda muito útil para o Führer para receber
o tratamento que lhe estava reservado, foi nomeado Chefe da Organização - posto
que era virtualmente o de subcomandante do partido - e Goebbels recebeu o cargo
que ocuparia até a queda do Terceiro Reich: Diretor de Propaganda do Reich.
Em sua tarefa agora oficial, ele tinha autoridade absoluta e
tirou disso bom proveito. Ele compartilhava (ou imitava) do desprezo de Hitler
pelas massas como este a apresentara no Mein Kampf.
"O poder receptivo das massas é muito limitado e a
capacidade de compreensão que revelam é fraca. Por outro lado, esquecem muito
depressa. Sendo assim, a propaganda eficaz é aquela que se limita a uns poucos
elementos essenciais e estes devem ser expressados, tanto quanto possível, em
fórmulas estereotipadas. Esses lemas devem ser repetidos persistentemente, até
que o último indivíduo tenha compreendido a idéia apresentada. Se este
princípio não for seguido, e se se tentar fazer abstração ou generalizar, a
propaganda será ineficiente, pois o público não poderá digerir ou guardar o que
lhe é oferecido. Portanto, quanto maior o escopo da mensagem, tanto mais
necessário se torna descobrir o plano de ação psicologicamente mais
eficiente."
Goebbels sabia que o modo mais eficiente de fazer qualquer
grande platéia aceitar uma idéia era prepará-la emocionalmente. A aplicação da
música adequada, do cerimonial certo, da solenidade e do ritual convenientes
predisporiam qualquer platéia a aceitar qualquer mensagem. Nunca se duvidou do
efeito hipnótico dos gritos, nas reuniões, dos lemas, das canções patrióticas,
dos pés em marcha rítmica, dos holofotes caindo sobre as formações de homens
uniformizados, desde que aplicados com precisão, para não se tornarem risíveis.
E ele contou com a sorte de ter como ouvinte uma nação cujo senso de humor era
reconhecidamente pesado. (O passo de ganso nazista teria sido banido dos campos
de parada britânicos ou americanos por explosões de gargalhadas.) Sendo o
chauvinismo, a agressividade e o sentimentalismo elementos dominantes do
caráter alemão, fácil foi para os filósofos do Nacional-Socialismo levar o povo
germânico a aceitar a sua pregação, com freqüentes apelos à "pureza
racial" e a outros papos-furados de igual teor, bastando-lhes apenas
colocar na tribuna oradores com língua bem afiada.
O próprio Hitler passou a poder falar em público, e falou,
conseguindo, através do trabalho de relações públicas cuidadosamente organizado
por Goebbels, enormes platéias em lugares como o "Sportpalast" de
Berlim. "Aceitei como único objetivo", escreveu o novo Chefe da
Propaganda, mais tarde, com espalhafatoso cinismo, "martelar na cabeça das
massas estúpidas a aceitação de Hitler como o deus da Alemanha que
despertava".
Mas reuniões como as do "Sportpalast" não passavam
de ensaios para os fantásticos congressos de Nuremberg, aos quais Goebbels
passou a dedicar-se com especial atenção a partir de 1929.
As reuniões do partido já se realizavam desde 1923, quando
nazistas e ociosos se reuniram em Munique para ouvir críticas contra a odiada
República de Weimar e para iniciar uma cerimônia que se tornou característica
de todo o Parteitag - a Consagração das Bandeiras. Esse ritual começava com
enfadonha explicação feita por Hitler do simbolismo do vermelho, do preto, do
branco e do desenho da suástica, com uma exortação para que todos os que
serviam sob o estandarte do partido jamais o abandonassem, exceto na morte, e
nunca permitissem que qualquer judeu ou marxista o insultasse.
Depois disso, havia um desfile de Tropas de Assalto
carregando a floresta de bandeiras da suástica para a "consagração"
solene por Hitler, que permanecia imóvel, com seu braço estendido na saudação
nazista.
A idéia das reuniões partiu de Julius Streicher, um
pervertido, imbecil e sádico, que foi um dos primeiros seguidores de Hitler e
que colaborou com o governo local, Willy Liebel, na organização da primeira
delas, realizada em Nuremberg. (Munique e Weimar foram os outros locais.)
Streicher, como Goebbels, tinha uma aptidão natural para a organização, apesar
do consideravelmente baixo nível de inteligência que possuía; além disso, sua
vocação para o melodrama era altamente desenvolvida. Contudo, a partir de 1929,
Goebbels tomaria a si a organização das reuniões e centralizaria a atenção do
mundo em Nuremberg, como o ponto focal das atividades dos nazistas.
Tendo conseguido o cobiçado cargo de Diretor de Propaganda do
Reich, ele voltou-se de pronto para uma análise da propaganda das outras nações
na guerra moderna, da qual a claramente mais bem sucedida era a aperfeiçoada
pelos britânicos na guerra de 1914-1918 com a Alemanha. Goebbels referia-se
desdenhosamente à "maneira maluca como os ingleses reuniam em livro que
qualquer um podia ler os seus segredos e teorias sobre como influenciar o
inimigo".
O livro a que ele se referia versava sobre a teoria e a
prática da propaganda britânica sob a direção de Lorde Northcliffe, de agosto
de 1918 até o Armistício. O trabalho foi escrito por Sir Campbell Stuart,
membro de uma das comissões de Departamento de Northcliffe, e publicado em 1920
com o curioso título de Segredos da Casa Crewe - A Casa Crewe era a sede do
Departamento, na Rua Curzon, Mayfair (residência londrina do Marquês de Crewe).
Naturalmente não havia nada de maluco na publicação do livro,
que não revelava mais do que poderia descobrir sozinho qualquer estudante de
propaganda, demonstrando Goebbels muita ingenuidade, levando-o tão a sério. Era
um livro popular, que procurava satisfazer a curiosidade do público em torno do
serviço de "Inteligência". O Segredos da Casa Crewe não era um documento
particularmente emocionante, mas continha uma exposição ponderada do propósito
da propaganda e uma análise sagaz do fracasso dos alemães em compreendê-la
durante a guerra do Kaiser.
A propaganda consiste, segundo Stuart, na apresentação de um
caso de maneira tal que possa influenciar pessoas. No tocante ao seu uso contra
qualquer inimigo, o assunto tratado não deve ser claramente propagandístico.
Excetuando-se circunstâncias especiais, a origem deve ser completamente oculta.
Em geral também é conveniente ocultar os canais de comunicação".
A criação de uma "atmosfera" favorável é o primeiro
objetivo da propaganda. Até que se produza esse efeito psicológico (resultante
de acontecimentos militares, de atividade propagandista ou de descontentamento
político interno), a mentalidade das tropas e da população civil inimigas - e
ambas são igualmente importantes na guerra moderna - será naturalmente
indiferente e insensível à influência.
Para se produzir essa "atmosfera" de receptividade
e suscetibilidade, é indispensável a continuidade da política de propaganda.
Isto pressupõe a definição de um plano de ação firme, baseado no conhecimento
amplo da situação política, militar e econômica, e também da psicologia do
inimigo.
"As operações reais de propaganda só podem começar
depois que se estabeleceu um plano de ação, não antes. O mais importante axioma
da propaganda é que só se pode fazer declarações verídicas."
Goebbels comentou depreciativamente sobre esse axioma, o que
não é de surpreender, já que ele se dedicara à importância da mentira.
"Dizer a verdade em questões de propaganda", escreveu ele, "é
tão estúpido que só se pode concluir que o livro todo não passa de monstruosa
"frente" erguida por Northcliffe para ocultar seus próprios erros ou
então que os britânicos nos consideram muito ingênuos. Há certa verdade no que
Stuart diz sobre o conhecimento da psicologia do inimigo. Mas estou mais
interessado na psicologia da nossa própria raça".
E estava. E como não havia ainda inimigos militarmente ativos
fora da Alemanha, ele se concentrou exclusivamente na maneira de incutir nos
receptivos crânios dos seus concidadãos os princípios da filosofia nazista
através de lemas, canções e discursos.
Lemas em abundância se despejariam da sua pena: Lebensraum!
Sangue e Solo! Os Judeus são a Desgraça da Alemanha! Povo sem Espaço! Todos
eles vieram a produzir impacto, mas o primeiro foi o mais famoso: Deutschland,
erwahe! - Alemanha, desperta! Esta, como a maioria das frases que lançou, foi
tirada de obras de outras pessoas - obras que, é de se reconhecer, não causaram
muito impacto. O grande talento de Goebbels, como propagandista, era para
adaptar as frases que encontrava no decorrer de sua extensa leitura aos
interesses do credo nazista. O Deutschland, erwahe! tornou-se tão freqüente,
nas bandeiras e tapumes, nos jornais e transmissões radiofônicas, que se
transformou numa saudação tão casual como "bom dia", mas, ao
contrário da saudação tradicional, ela expressava idéia de ação - "ela soa
como um tambor na consciência das massas", como disse Goebbels.
Houve também o caso de Horst Wessel, que Goebbels transformou
engenhosamente num festival nacional do martírio. Horst Wessel foi um dos que
ingressaram entusiasticamente no partido depois do caso do Salão Pharus. Era
filho de um pastor luterano, louro, espadaúdo, com a pinta agradável de um
vida-limpa. Na verdade, porém, era brutal, amoral e estúpido. Wessel ingressara
no partido vindo do Freikorps e Goebbels encarregou-o de um pelotão de Tropas
de Assalto e mais tarde o treinou como orador para encorajar a filiação à
organização da Juventude Hitlerista, vendo nele, acertadamente, o tipo de herói
superficial que os jovens admiram. Contudo, Wessel meteu-se com uma prostituta
chamada Erna Jaenicke e se desinteressou do partido, que para ele representava
pouco mais que a oportunidade de satisfazer-lhe a queda para a brutalidade,
surrando pessoas nas reuniões de Goebbels. Ele descobriu que poderia viver com
mais conforto e ociosidade tornando-se gigolô de Erna e às suas custas viveu
durante três anos. Todavia, ele tinha um rival no gigolô anterior de Erna, um
tal de Ali Hoehler que, a 14 de janeiro de 1930, durante uma briga na casa de
Erna disparou um tiro na boca de Wessel.
Goebbels imediatamente emprestou ao fato, apenas sórdido, a
significação de um martírio político, apregoando que "o herói do Reich que
despertava" fora fuzilado por acreditar no futuro da Alemanha sob Hitler,
e que Hoehler era "um comunista imundo". (Na verdade, Hoehler também
era nazista, mas o reconhecimento deste fato ou de quaisquer outros detalhes da
associação entre Erna e os dois gigolôs dificilmente teria ajudado a história.)
Wessel permaneceu no hospital durante três semanas. Goebbels o visitava
diariamente e criava nas colunas de O Angriff uma imagem fortemente colorida do
herói moribundo. Ele morreu a 23 de fevereiro de 1930 e teve um funeral público
no qual Goebbels pôs em execução a brilhante idéia de fazer a chamada das
Tropas de Assalto reunidas e ordenar-lhes que respondessem
"Presente!" quando o nome de Wessel fosse chamado. Essa patuscada, de
grande efeito emocional, foi apoiada pelo canto da canção de Horst Wessel -
versos que Wessel havia mandado para O Angriff e que foram adaptados a uma
canção popular. Foi a primeira apresentação da canção que se transformou no
hino nazista.
Assim, com a percepção da psicologia da sua platéia, ele por
assim dizer pôs a máquina da propaganda em regime de dedicação exclusiva da
criação da mentira. Daí por diante, a única preocupação de Goebbels foi com a
invenção do perjúrio emocional, espiritual e intelectual.
7. TERMINA
O PRIMEIRO ATO
A Goebbels, mais que a qualquer outro - inclusive o próprio
Hitler - deveu-se a retumbante vitória que os nazistas conquistaram nas
eleições de setembro de 1930 para o Reichstag. "Eu aumentarei a
representação do partido de 12 para 40 cadeiras". declarou ele, e começou
uma campanha que, na verdade, era uma extensão das reuniões de Nuremberg por
todo o país. Ele escolheu e treinou para falar em público mais de 200 membros,
reunindo-os num grupo de instrução em Munique e falando-lhes, na sessão
inaugural, sobre o papel do propagandista:
"O propagandista tem de construir sua própria verdade. O
que for útil ao progresso do partido é verdade. Se coincidir com a verdade
real, tanto melhor; se não coincidir, será preciso fazer adaptações. A grande e
absoluta verdade é que o partido e o Führer estão certos. Eles sempre estão
certos."
Com esta declaração, ele os fez freqüentar um curso intensivo
de oratória que os mantinha ocupados durante doze horas por dia. Em seguida,
foram despachados em todas as direções para o proselitismo em reuniões
públicas, nas fábricas, nos estaleiros e escritórios e onde quer que pudessem,
pelo método insidioso da chantagem - pois já então Heinrich Himmler voltara à
casa nazista e seus dossiês de informações pessoais já se estavam
multiplicando. O resultado da campanha de Goebbels foi um aumento na
representação nazista não de 12 para 40 cadeiras, mas de 12 para 107. Os
nazistas alçavam-se assim à condição de segundo poder, sendo superados somente
pelo Partido Católico de Centro, de Heinrich Brüning.
"O Führer'', escreve Goebbels em seu estilo emocional
corriqueiro, "enviou-me rosas vermelhas e abraçou-me. Ele é meu começo e
meu fim. Uma das estrelas cintilantes da História. Ele me deixa sem energia com
sua gratidão e lanço-me novamente no abismo da ação".
Nesse tempo Goebbels lançou-se não só "no abismo da
ação" como também no casamento. Seus casos amorosos, desde as paixões
juvenis inspiradas por Anka Stahlhern e Else Taub, haviam sido numerosos, mas
superficiais (um deles fora a sedução da bonita empregada dos Steigers) e não
eram mais satisfatórios do que as visitas que fazia freqüentemente aos
cabarés-bordéis de Berlim. Mas, pouco depois da vitória nazista ele conheceu
Magda Quandt.
Magda era a atraente filha de um professor de línguas
orientais chamado Rietschel; fora educada num convento belga e falava
fluentemente três línguas, além da sua. A mãe se divorciara do pai por
considerar pequenas as recompensas financeiras que um professor universitário
lhe podia oferecer. Posteriormente casou-se com um rico negociante judeu, Jakob
Friedländer, que descobriu que sua paixão por dinheiro era mais do que ele
podia suportar. Dando-lhe algumas propriedades e uma pensão vitalícia, escapou
"antes que todo o dinheiro que ganho desapareça pelos bolsos sem fundo
dessa mulher encantadora mas gananciosa". Frau Friedländer, a seguir,
casou-se com outro homem de negócios, Christian Behrendt, de quem também acabou
por se divorciar em troca de uma pensão principesca. Assim é que Magda tinha
uma formação de instabilidade moral e segurança financeira.
Em 1919, ela conheceu - segundo alguns, num trem, quando de volta
da escola de aperfeiçoamento - um rico industrial, chamado Gunther Quandt. Ele
tinha 40, anos, era divorciado e possuía dois filhos, Herbert e Helmut. Magda
estava com 19 anos, mas gostava demais das exterioridades do luxo para resistir
a tudo o que Quandt lhe podia oferecer. Casaram em janeiro de 1921 e foram
morar no elegante bairro de Babelsberg, em Berlim. Em novembro ela deu um filho
a Gunther, a quem chamou de Harald, e poucos meses depois Gunther deu-lhe um
flagrante de adultério com seu filho Herbert. Contudo, ela conseguiu
convencê-lo de que Herbert lhe implorara para que o amasse "porque sabia
que não demoraria muito neste mundo" - e realmente não demorou. porque
morreu de peritonite pouco depois. Mas não foi tão fácil convencê-lo de que uma
outra ligação amorosa que manteve com o estudante de música Ernst Wieser se
verificara por compaixão. Em lugar de suicidar-se, como seria conveniente.
Ernst a perseguiu implacavelmente e, depois de algumas cenas melodramáticas, o
enganado Gunther declarou que se divorciaria dela, sem lhe dar um tostão de
pensão.
Magda enfrentou esta situação ameaçadora muito bem. Ela sabia
que Gunther era culpado de sonegações do imposto de renda e descobriu os papéis
pertinentes em sua mesa. Com esses documentos funcionando como uma ameaça
igualmente poderosa contra ele, Gunther sucumbiu à chantagem de Magda e
concordou em livrar-se dela pelo pagamento de 50.000 marcos e de uma pensão
mensal de 4.000 marcos, mais um apartamento, livre de despesas, na
Reichskanzlerplatz. Esse arranjo satisfatório foi celebrado em 1929, e daí por
diante Magda passou a viver a vida de rica divorciada. sem quaisquer outras
responsabilidades além das que tinha para com seu filho Harald, que estava sob
sua custódia. Seus amantes eram escolhidos com discrição e manobrados com
habilidade. Ela continuou seu caso amoroso com Ernst Wieser e,
concomitantemente, formou várias ligações socialmente vantajosas - incluindo
uma com o sobrinho do Presidente Herbert Hoover, na época em missão diplomática
em Berlim. Essas ligações sofisticadas lhe ocupavam as noites; os dias eram
passados em atividades menos excitantes, inclusive o trabalho voluntário na
sede do partido, em Berlim. Ali, um jovem amanuense tentou conquistá-la e ela
decidiu afastar-se. Mas o afastamento não era coisa simples. Os regulamentos
exigiam uma entrevista com o Gauleiter - provavelmente algum tipo de lavagem
cerebral - antes que pudesse partir, levando consigo os segredos de que tomara
conhecimento. Na verdade, seu trabalho era apenas o controle do material de
escritório e foi fácil convencer Goebbels de que não estava interessada em
política, e muito menos em espionar para a oposição ou intrometer-se. Foi
igualmente fácil para ele convencê-la de que admirava sua beleza, inteligência
e posição social. Ofereceu-lhe um cargo muito mais importante no partido, o de
"encarregada dos arquivos particulares, onde você não será incomodada por
atenções desagradáveis".
As suas atenções para com ela estavam longe de ser
desagradáveis, mas por algum tempo ele se manteve meio reservado, para não lhe
dar a impressão de ser tão vulgarmente impetuoso quanto o amanuense que lhe
passara a mão nas pernas. Sua abordagem era intelectual: "Eu sabia muito
bem que, vivendo a vida vazia de uma divorciada na sociedade, ela não tinha
muito com que ocupar o espírito e que aceitaria de bom grado um estímulo
mental". O estímulo que ele lhe deu foi, naturalmente, o nazismo.
Ele a apresentou a membros escolhidos do partido e
encorajou-a a participar das discussões. Tanto quanto se sabe, não fez dela sua
amante; ele teria sido incapaz de não mencioná-lo em seu diário. O método que
preferiu adotar foi permanecer fugidio e continuar seu estímulo intelectual -
"e ela se mostra uma aluna capaz", confiava ele ao seu diário.
"Tanto que decidi apresentá-la a Hitler, pois na sua presença ela
cintilará com o brilho do seu amor pela doutrina."
E estava certo. Em janeiro de 1931 ele arranjou um encontro
em seu apartamento de Steglitz e Magda pôde citar copiosamente trechos do Mein
Kampf - para satisfação do Führer, que respondeu com encanto untuoso e muita
adulação e beija-mão. Como Goebbels, Hitler era altamente suscetível à adoração
feminina e qualquer coisa além de uma saudação polida ele considerava como
atenções desvairadas. Ele disse a Goebbels que a conquista de Magda provava que
os membros da classe alta (dieoberen Klassen) estavam mudando gradativamente
para a aceitação da filosofia nazista. (Naturalmente, Magda só era considerada
de sociedade por causa da condição econômica; sua formação era essencialmente
de classe média.) Quando Goebbels lhe disse que estava pensando em casar com
Magda, Hitler ofereceu-se imediatamente para ser o padrinho.
A família e os amigos de Magda fizeram muita oposição ao
casamento. Seu pai tachou Goebbels de individuo sem linha; Quandt advertiu-a de
que ele era um escroque político e sua mãe disse que ele não passava de uma
caricatura de homem. Ignorando todos os comentários e as violentas ameaças do
seu amante estudante, Ernst Wieser, Magda casou com Goebbels a 12 de dezembro
de 1931. Ela desejava consorciar-se na Igreja e, para tanto, Goebbels escreveu
ao Cardeal-Arcebispo solicitando uma dispensa especial, em vista da condição de
divorciada de Magda. Mas, não concedida a licença, o casamento realizou-se
apenas no civil, numa propriedade de Gunther Quandt, em Mecklenburg, e Hitler
manteve a promessa de ser o padrinho. Mais tarde, Goebbels escreveu uma carta
insultuosa ao Cardeal, dizendo que vivera toda a vida sem as bênçãos da Igreja
e continuaria assim, deleitando-se em sua blasfêmia. O Cardeal nada lhe
respondeu, mas a Sociedade Albertus Magnus passou a insistir para que Goebbels
lhe reembolsasse o dinheiro que ele tomara emprestado para completar sua
educação. O reembolso dessas quantias havia sido ignorado com o passar dos
anos, com Goebbels opondo-se com unhas e dentes à devolução, demonstrando
ressentimento contra as justas reivindicações da Sociedade. Além disso, a
desesperada atividade necessária para levar o partido ao poder, através da
infâmia, da ameaça e da intriga, não lhe deixava muito tempo para preocupar-se
com intimações como as que vinha recebendo.
O ano de 1932 foi o mais crítico que os nazistas
experimentaram. Apesar da representação enormemente aumentada no Reichstag, que
haviam conseguido como resultado da campanha desenvolvida por Goebbels em 1930,
o caminho para a conquista do seu objetivo não era nada fácil. A Constituição
alemã previa a realização de cinco pleitos durante o ano, dois para a
presidência da República e três para a representação estadual e para o
Reichstag. Hindenburg, o Presidente, já com quase 85 anos de idade, embora fosse
uma personalidade respeitada, por causa de Tannenburg e de suas realizações com
Ludendorff em 1916, - estava mental e fisicamente fraco.
Na primeira eleição, em março, ele não conseguiu obter
maioria decisiva contra Hitler, a quem Goebbels convencera a "testar o
prestigio junto ao povo alemão candidatando-se à presidência". Mas quando
a batalha se repetiu, a 10 de abril, verificou-se que a posição de Hitler
diminuíra, pois dessa vez Hindenburg conseguiu fazer maioria absoluta,
recebendo mais de 50% dos votos apurados. Dois meses depois ele demitiu o
Chanceler Brüning e o substituiu por Franz von Papen, que dirigiu o que veio a
ser conhecido como "o governo dos magnatas".
A administração von Papen recebeu todo o peso da ira de
Goebbels em seus discursos políticos. Ele disse às 100.000 pessoas que se
acotovelavam no Lustgarten: "Quero que o povo alemão julgue os últimos
quatorze anos de vergonha, de decadência e humilhação política... Verificou-se
alguma mudança nas últimas semanas? Nenhuma, além da troca de caras dos que
governam. A situação econômica continua péssima. O novo governo não iniciou
nenhum programa de obras públicas. A miséria está aumentando e os famintos não
sabem mais de onde virá a próxima refeição...
Essas palavras praticamente não tinham qualquer originalidade
ou tino. A surrada fraseologia bem poderia ter partido de qualquer político em
busca de poder para o seu partido. Mas Goebbels sabia o que estava dizendo.
Hitler não escrevera que "O poder receptivo das massas é muito limitado"?
As sutilezas eram inúteis; quanto mais vulgar a mensagem, tanto mais provável
que as massas a compreendessem. E realmente parecia que elas haviam
compreendido, porque depois de uma campanha ciclônica - durante a qual os
diários de Goebbels ficaram cheios de frases como "Trabalhamos de pé,
andando, dirigindo e voando... Estou vencido pelo cansaço... cheguei às duas
horas da manhã, discuti assuntos prementes do partido até às quatro, tomei o
trem para Berlim às seis... - houve outra vitória esmagadora para os nazistas,
nas eleições de 31 de julho. Passaram a contar com 230 cadeiras no Reichstag,
colocando quase 100 à frente dos seus rivais mais próximos, os
social-democratas. Como partido majoritário, o Nacional-Socialista tinha o
privilégio de eleger um líder do Reichstag. Por indicação de Hitler, Goering
elegeu-se líder do órgão a 30 de agosto, enquanto que ele se reservava o
direito de sonhar mais alto, de ser Chanceler da República ou talvez
Presidente. "Sem o poder supremo", escreveu Goebbels, "o Führer
não pode controlar a situação. Aquele hipócrita e incompetente von Papen
ofereceu-lhe a Vice-Chancelaria e, naturalmente, o Führer a recusou
desdenhosamente. Como poderia um salvador da Alemanha ser segundo-violino de um
primeiro desafinado?"
Von Papen era de fato um homem obtuso, mas muito astuto. Ele
influenciara a queda de Brüning pela intriga e, pensando na vantagem pessoal,
maquinou a admissão de nazistas no seu gabinete. Por breve instante Hitler teve
esperanças de assumir o domínio, mas também foi desapontado. Ele foi chamado à
presença de Hindenburg a 13 de agosto e, recebido com gélida calma, ouviu deste
a recusa peremptória em entregar a Chancelaria ao dirigente de um partido de
que só se ouviam intrigas e violência. O Presidente não tinha muito respeito
por Papen, mas deixou bem claro que respeitava Hitler menos ainda e que, na sua
opinião, dar a Hitler o poder que exigia seria dar "um dia agourento ao
povo alemão".
Hitler retirou-se furioso. Não lhe haviam oferecido sequer
uma cadeira para sentar-se durante a entrevista e, pior ainda, sua arenga
empolada desfez-se na fria dignidade do Presidente. Ele viajou imediatamente
para o seu retiro, em Obersalzburg, para meditar e tramar, enquanto Goebbels
partia para uma semana de repouso na costa do Báltico.
Nas conspirações subseqüentes, entre os líderes do Partido
Centrista, os banqueiros e industriais, o Ministro da Defesa, General von
Schleicher, Papen e o próprio Hitler, Goebbels não desempenhou nenhum papel
importante. Por natureza, ele não era um conspirador, no sentido maquiavélico
do termo. Sua continuou sendo a tremenda tarefa de convencer a nação alemã.
Numa época em que havia milhões de desempregados e em que a fome mais e mais
alargava a sua terrível sombra, os nazistas acenavam com o poder mágico de
mudar tudo. Os distúrbios provocados pelas Tropas de Assalto e os assassinatos
tramados e consumados pelas SS haviam angariado muita publicidade para o
partido, mas havia sinais de que os discursos intermináveis e a propaganda
viciosa contra toda oposição estavam começando a ser prejudiciais. Houve outra
eleição, em novembro, de que resultou retumbante derrota para o gabinete Papen,
por causa da sua impopularidade pessoal. Dessa vez, como Goebbels temia, os
nazistas recolheram menos 2 milhões de votos, o que representou a perda de 34
cadeiras no Reichstag. Pior ainda, pôs em evidência que os comunistas estavam
ganhando terreno, pois haviam recebido cerca de 6 milhões de votos.
Goebbels concentrou imediatamente as suas energias no combate
à ameaça comunista. Os industriais que apoiavam o partido - que incluíam I. G.
Farben e Thyssen, enquanto Krupp se mostrava já meio inebriado pela suástica e
não demoraria a alinhar-se - eram os mais vulneráveis à infiltração bolchevista
e Goebbels cuidou para que não se passasse um dia sem que fossem instados a
decidir depressa entre o fim da empresa capitalista sob os comunistas e a
promessa de recuperação industrial sob Hitler. A escolha não era nada
animadora.
Gustav Krupp, o chefe da grande firma de armamentos, detestava
Hitler e era um dos magnatas que apoiavam Papen e Schleicher, começou a dar
sinais de hesitação ante a insistente propaganda de Goebbels e as manobras de
Hitler, vindo a convencer Hindenburg de que Papen teria de renunciar; mas nem
ele nem seus colegas, os demais capitães da indústria, conseguiram convencer
Hindenburg de que Hitler deveria ser nomeado Chanceler. Em vez disso, o
Presidente chamou Schleicher e a 2 de dezembro nomeou-o Chanceler, para que
"aquele cabo austríaco arrivista" ficasse de fora.
"À medida que o ano de 1932, pleno de lutas, se
aproximava do fim", diz William Shirer, "Berlim andava cheia de
conspirações. Além das de Papen e Schleicher, no palácio presidencial também
conspiravam o filho de Hindenburg, Oskar, e seu Secretário de Estado, Meissner.
No Hotel Kaiserhof, Hitler e sua gente maquinavam a tomada do poder, mas também
uns contra os outros. As teias da intriga em breve ficaram tão emaranhadas, que
por volta do Ano Novo de 1933 os conspiradores já não sabiam ao certo quem traía
quem".
No torvelinho dessas conspirações, o Presidente decidiu, a 28
de janeiro de 1933, demitir Schleicher, que mais tarde disse amargamente:
"Estive no poder 57 dias e fui traído 57 vezes em cada um daqueles
dias".
Dois dias depois, enroladamente enredado na trama da intriga,
o Presidente nomeou Chanceler do Reich Alemão o homem que desprezara até então.
Finalmente Hitler alcançou o poder.
Apenas três semanas depois, Goering, como líder da câmara,
convidou os principais industriais, que há anos vinham despejando dinheiro no
Partido, mas que foram retirando gradativamente o apoio quando compreenderam
que Hitler representava a ameaça de ditadura de extrema direita, para uma
conferência na qual Hitler exporia a linha de sua política. William Manchester
registra a cena em The Arms of Krupp:
"Os convidados sentaram-se em cadeiras de braço
cuidadosamente arrumadas. Krupp, devido à riqueza que possuía e por ser
presidente da Reichsverband [Confederação Nacional], estava mais próximo da
tribuna; atrás dele, quatro diretores da I. G. Farben e Albert Vögler, diretor
da poderosa Vereinigte Deutsche Stahlwerke [Associação de Siderúrgicas
Alemães]. Goering, abrindo a reunião, apresentou seu líder aos que, como Krupp,
o estavam vendo pessoalmente pela primeira vez. Então o Chanceler levantou-se:
"Estamos prestes a realizar a última eleição", começou, e fez uma
pausa para que todos compreendessem plenamente as inferências disso.
Naturalmente, a transição para o Nacional-Socialismo seria facilitada se o
partido conquistasse maioria esmagadora. Portanto, ele pedia o apoio daqueles
homens. Apoiando a ditadura, eles estariam apoiando a si mesmos. "A empresa
privada não pode sobreviver numa democracia." Para esclarecer as dúvidas
que tal afirmação pudesse suscitar, ele acrescentou que entre as
"moléstias que esse regime político faz que surjam inclui-se o
sindicalismo". À mercê de tal instituição, o Reich "inevitavelmente
cairá". A grande preocupação da liderança consistia em encontrar ideais
que unissem o povo alemão e ele encontrara esses ideais no nacionalismo e na
força da "autoridade e da personalidade". Garantindo-lhes que
varreria do país a ameaça comunista, afirmou que devolveria à Wehrmacht a sua
antiga glória."
Evidentemente, o prestígio recém-adquirido por Hitler como
Chanceler e a sua extraordinária personalidade fizeram pender a balança. Krupp
foi o primeiro a oferecer um milhão de marcos para os fundos do partido; outros
dois milhões foram prometidos pelos industriais ali presentes. Goebbels
exultava. Havia apenas três meses que ele observara que o partido estava
falido: "Não há dinheiro sequer para pagar os salários dos funcionários e
a conta dos impressores. A situação financeira da Gau de Berlim é desesperada -
nada mais que dívidas e obrigações". Mas, com Hitler instalado na cúpula
da República, "em grande parte como resultado da determinação com que me
lancei à tarefa de gravar profundamente nos corações certos a mensagem do
partido", os problemas financeiros começavam a desaparecer.
E havia razões para ele se regozijar: sua máquina de
propaganda funcionava a pleno vapor. Mas ele teve dificuldades domésticas. Em
setembro, Magda dera à luz sua primeira filha, a quem chamaram Helga.
Deu-se a febre puerperal e durante mais de três meses - Magda
esteve perigosamente mal. Por duas vezes viu-se à beira da morte, enquanto
Goebbels se encontrava a centenas de quilômetros de distância, fazendo
campanha. (O próprio Hitler esteve à sua cabeceira nas duas ocasiões, mas
recusou-se a permitir que qualquer notícia de seu estado de saúde fosse
comunicada ao marido, para não desviá-lo das preocupações com o partido.)
Somente na segunda semana de janeiro de 1933 é que ela ficou fora de perigo,
coincidindo sua volta a casa com a nomeação de Hitler como Chanceler. "O
alegre retorno de Magda a casa", escreve Goebbels, "foi celebrada
pela marcha triunfal das massas - centenas de milhares de pessoas - desfilando
pela Chancelaria e saudando o Führer com a canção de Horst Wessel. Hora após
hora não ouvimos outra coisa que não as palavras inspiradoras:
Ergam os estandartes! Cerrem fileiras.
As SA marcham com passo firme...
Meu coração está alegre novamente, depois dos meses de
ansiedade e dúvida. Desce o pano sobre uma cena de glória. Ele se erguerá sobre
o novo Reich! Heil Hitler!"
8. TERMINA
O SEGUNDO ATO
Apesar do otimismo de Goebbels, era evidente que a posição de
Hitler permanecia ainda insegura. O ano de 1932 deixara claro que as cabeças
dos Chanceleres podiam rolar tão facilmente quanto quaisquer outras. O partido
precisava de pelo menos uma maioria de dois terços no Reichstag, para legalizar
a ditadura do Führer e impedir que ele caísse tão impotente quanto Brüning, Papen
e Schleicher; e os comunistas ainda estavam muito bem representados para que os
nazistas pudessem conquistar a ambicionada maioria de dois terços. Era
necessário que ocorresse algum acontecimento dramático. Como Hitler diria tão
agourentamente aos industriais a 20 de fevereiro, a próxima eleição seria a
última; não haveria outra oportunidade para ele conquistar o poder absoluto,
"para o beneficio da indústria alemã". A eleição seria realizada a 5
de março. "Antes disso", observou Goebbels, "os comunistas têm
de ser derrubados".
Produzindo talvez o golpe de propaganda mais brilhante de sua
carreira, Goebbels levou ao extremo da exageração a ocorrência de um incidente
fortuito com a finalidade de desacreditar os comunistas perante o eleitorado
germânico.
Na noite de 27 de fevereiro, o vazio e mal guardado edifício
do Reichstag - o Parlamento Alemão - foi invadido por um jovem holandês. Seu
nome era Marinus van der Lubbe e sua ambição era livrar a Alemanha da ameaça da
ditadura de direita. Embora não fosse comunista, pois era anarquista demais
para aceitar a subordinação a um credo tão disciplinado e monolítico, entre
esquerda e direita, preferia a esquerda. Ele já fizera uma tentativa de
incendiar o palácio real em Berlim, e só fracassou porque o método primitivo
que usou permitiu que o prédio resistisse ao assédio das chamas. O Reichstag se
incendiaria com muito mais facilidade. Ele se abastecera de gasolina e
acendedores domésticos de parafina sólida, fazendo um rastro com as duas
substâncias por uma grande área do interior do prédio. Quando ateou fogo ao que
preparara, os móveis, o madeiramento e as cortinas se inflamaram
instantaneamente, obrigando-o a fugir às pressas. O incêndio que provocara se
alastrou com tanta rapidez, que ele, confundindo-se no caminho da fuga, acabou
encontrando dois guardas do prédio. Não resistiu à prisão, sendo imediatamente
entregue à polícia alemã. A notícia do atentado e da prisão do incendiário
chegou logo aos ouvidos da liderança nazista. Goebbels talvez tenha sido o primeiro
a perceber que ali estava a ocasião ansiosamente procurada para assestar a
maquinaria repressiva do estado contra a esquerda antinazista. E viu também
que, de sua parte, poderia colher o material com o que sensibilizaria a opinião
moderada, fazendo-a passar decisivamente para o lado de Hitler e do partido. A
história dos acontecimentos subseqüentes está narrada em seu diário.
Na noite de 27 de fevereiro, uma segunda-feira, Goebbels
convidou Hitler para jantar, com ele e Magda, às 21:00 h. Depois do jantar, a
eles se juntou Heinrich Hoffman, o fotógrafo oficial do Führer. A anotação no
diário de Goebbels - palavras cuidadosamente escolhidas para a posteridade por
alguém que insiste em que "a câmara não pode mentir" - diz:
"Ouvimos um pouco de música e conversamos. De repente o telefone tocou.
Era Putzi Hanfstaengl [Hanfstaengl era amigo íntimo de Hitler; sua família
financiara as atividades do partido nos seus primórdios]: "O Reichstag
está em chamas!"
Pensei que se tratasse de uma brincadeira maluca de Putzi e
recusei-me a comunicar o fato ao Führer. Mas outros chamados confirmaram que
era verdade. Incêndio premeditado! Imediatamente falei ao Führer e saímos
apressadamente de carro pela Charlottenaurger Strasse. Todo o prédio ardia.
Passando por cima das mangueiras, chegamos ao saguão pela porta número dois.
Goering encontrou-nos no caminho e Papen também não demorou a chegar.
Naturalmente isto é obra de incendiários - um louco seminu foi preso no prédio.
Não há dúvida de que os comunistas fizeram uma última tentativa de, pelo
incêndio e pelo terror, conquistar o poder durante o pânico geral.
"Agora temos de agir.
"Goering suprime imediatamente toda a imprensa comunista
e social-democrata. Oficiais do partido comunista são presos. As SA são
avisadas para ficar de prontidão, para qualquer emergência.
"Os comunistas estão muitíssimo enganados. Eles tentaram
fazer-nos cair, mas, em vez disso, desfechamos-lhes golpe mortal."
No dia seguinte, Hitler não teve dificuldades em convencer
Hindenburg a assinar um decreto de emergência, "como medida defensiva
contra os atos de violência dos comunistas que ameaçavam o Estado". Na
verdade, esse decreto marcou o começo do estado policial nazista legalizado.
Ele autorizava restrições à liberdade individual, ao direito de livre expressão
e de opinião, incluindo a liberdade de imprensa e o direito de reunião e
associação. Também autorizou a violação do sigilo das comunicações postais,
telegráficas e telefônicas e concluía agourentamente: "Os mandados de
busca nas casas e ordens para o confisco de propriedades também são
permissíveis além dos limites legais prescritos em outras circunstâncias".
Visivelmente como produto de uma reflexão tardia, um adendo autorizava a
aplicação da pena de morte, através de julgamento sumário, "a qualquer
pessoa armada que esteja perturbando a paz".
Este decreto permitiu que Hitler prendesse, aprisionasse ou
executasse virtualmente todos os que se lhe opunham - e, como Goebbels registra
afavelmente em seu diário, ele fez "Prisões e mais prisões. Agora a peste
vermelha está sendo completamente eliminada. Não há sinal de resistência em
parte alguma. Os adversários parecem tão avassalados pela ação enérgica que
desenvolvemos que não se atrevem mais a resistir". Como a "ação
enérgica" representava incursões contra milhares de residências,
escritórios e fábricas, feitas pelos homens das Tropas de Assalto, que prendiam
e torturavam brutalmente qualquer um contra quem fosse possível imputar a
acusação de "se opor ao Führer e à Glória do Reich Alemão", não é de
espantar que Goebbels pudesse usar a frase "não há sinal de resistência em
parte alguma".
Da mesma forma, como todos os jornais e reuniões públicas dos
comunistas e de outros adversários foram proibidos, também não era de esperar
que houvesse muita resistência nos meios de comunicação. Como só os nazistas e
pró-nazistas tinham permissão de fazer campanha, é um tanto irônico falar-se em
falta de resistência.
Foi neste ponto, cinco dias antes das eleições de 5 de março,
que Goebbels registrou:
"Estou prestes a assumir o controle do vasto setor
radiofônico. Terei de livrar-me de muitos membros ineficientes da equipe. É
preciso realizar uma reformulação especialmente no pessoal da
administração". O mais interessante a respeito disso é a nota do dia
preciso - 1o de março de 1933 - em que Goebbels assumiu o comando do veículo de
comunicação que seria a sua mais efetiva arma de propaganda, pois a partir
desse dia o rádio passou a levar a personalidade hipnótica do Führer aos 40
milhões de súditos impressionáveis do Reich Alemão. E o gênio de Goebbels, na
manipulação das suas possibilidades, logo se evidenciou. foram definitivamente
vencidos."
"O Führer fala com o máximo de fervor e devoção",
Goebbels garantiu ao povo. "Quando, no fim, mencionou que o Presidente do
Reich e Hitler haviam apertado as mãos - o primeiro tendo libertado a Prússia
do inimigo como Feldmarechal e o segundo tendo cumprido seu dever no Ocidente
como simples soldado - o hino de ação de graças e, ao fundo, o soar vigoroso
dos sinos da Catedral de Königsberg formaram um corpo esplêndido para o
coroamento de seu discurso. Toda a Alemanha, nas praças, nas ruas, nas
cervejarias ou nos lares, ouvia o hino que palpitava pelas ondas etéreas do
rádio. Ela se conscientiza de que uma nova era raiou. Neste momento, milhares e
milhares de pessoas estarão decidindo-se por Hitler, optando assim pelo
ressurgimento da nação."
Com entusiasmo incomum, Goebbels apreendeu a grande
importância do rádio, assim como boa parte da técnica que lhe asseguraria
dramaticidade na sua utilização. Numa visita de duas horas a um estúdio de
transmissão, procurou familiarizar-se com os potenciômetros e outros
dispositivos técnicos que lhe permitiriam os truques de sons; valendo-se do uso
hábil de gravações interpoladas, ele poderia obter efeitos que transformariam
mentiras em verdades, mistificando também na apresentação de Hitler ao
microfone alterando-lhe o timbre de voz o seu modo de falar, fazendo dele uma
personalidade radiofônica elaborada.
Na verdade, o resultado das eleições de 5 de março não foi
muito encorajador. Os nazistas e seus parasitas só conseguiram 51% dos votos
depositados. Mas Goebbels não perdeu tempo em apresentar a sua versão da
verdade:
Ouvir a Walkürie, à noite, na Ópera Estadual. A sublime
música de Wagner mistura-se com o som da marcha dos Stahlhelm que festejaram
seu grande dia em Berlim e agora passam pela Ópera.
"Os primeiros resultados já chegaram. Sucesso sobre
sucesso, fantástico e incrivel.
"Quando voltarmos à Chancelaria, depois do espetáculo, a
vitória será nossa. Ela é muito maior do que nos atrevíamos a esperar. Mas o
que é que os números significarão, doravante? Somos os senhores do Reich e da
Prússia; todos os outros partidos foram definitivamente vencidos."
A vitória fora muito maior do que os nazistas se atreviam a
esperar porque o decreto de emergência posto em vigor determinou a prisão de todos
os deputados comunistas eleitos alegando-se para tanto que os instigadores do
incêndio do Reichstag eram claramente inimigos do Estado, incapazes, portanto,
de dirigir os que por desorientação foram levados a votar neles - quanto mais
"a vasta maioria da nação alemã que tinha fé no único credo verdadeiro, o
nacional-socialismo". Para preservar a aparência de democracia, os
pequenos partidos, como o Partido Nacional do Povo (dirigido por von Papen e
pelo editor Alfred Hugenberg), e os líderes dos social-democratas que haviam
escapado de serem presos como simpatizantes comunistas, permaneceram
temporariamente sem serem perturbados; mas somente por alguns dias. A 23 de
março, Hitler não encontrou dificuldade em fazer passar pelo Reichstag uma
"lei para eliminar o sofrimento do povo e do Reich". Somente os
social-democratas votaram contra ela, mas eram apenas 84 deputados. Os
nazistas, apoiados por seus ex-adversários menores, cujas mãos haviam sido
"molhadas" pelo dinheiro de Krupp e transformadas num apoio dócil ao
"melhor caminho para a indústria alemã e, portanto, para a economia
alemã" aprovaram a lei com uma maioria de 357 votos.
Seguiu-se imediatamente um tumultuoso aplauso. No Teatro da
Ópera Kroll, onde o Reichstag se reunira, ecoaram os vivas ao triunfo nazista.
Com esta simples lei, de cinco parágrafos, "para eliminar o sofrimento do
povo e do Reich" (ela foi sucintamente chamada "Lei da Capacitação
Plena"), os nazistas arrancaram o poder do parlamento alemão e instituíram
um regime totalitário. Com eles ficou o domínio completo da vida nacional
germânica, inclusive o controle do orçamento do Reich, a aprovação dos tratados
com potências estrangeiras e a faculdade de promover emendas à Constituição sem
recorrer à Câmara. Toda a estrutura do estado - jurídica, econômica e interna -
estava nas mãos do gabinete de Hitler, na verdade, nas mãos do próprio Hitler.
Como diz Shirer:
"Assim, a democracia parlamentar foi finalmente
sepultada na Alemanha. Excetuando-se as prisões dos representantes comunistas e
de alguns deputados social-democratas, tudo foi feito muito legalmente, embora
acompanhado de terror. O Parlamento, subordinando sua autoridade constitucional
a Hitler, suicidou-se, embora seu corpo permanecesse embalsamado até o fim do
Terceiro Reich, servindo freqüentemente de caixa de ressonância de alguns dos
tonitruantes pronunciamentos de Hitler, com seus membros sendo escolhidos a
dedo pelo partido nazista, pois daí por diante não haveria mais eleições
verdadeiras. Foi somente esta 'Lei da Capacitação Plena' que formou a base
legal da ditadura de Hitler. A partir de 23 de março de 1933, Hitler passou a
ditador do Reich, livre de quaisquer restrições parlamentares e, para todos os
fins, também livre do controle do velho e cansado presidente. É certo que havia
muito o que fazer para submeter a nação e suas instituições ao controle
nazista, embora... também isto fosse feito com inaudita rapidez e muita
vulgaridade, com trapaças e brutalidade."
O plano de Goebbels para derrubar os comunistas - e, por
extensão, submeter a própria nação alemã aos Aliados a 7 de maio de 1945 -
funcionara brilhantemente. A "verdade" elaborada pelo propagandista
levara a palma.
Exatamente dez dias antes ele recebera a sua recompensa.
Hitler criara o Ministério do Esclarecimento e Propaganda e, a 13 de março,
Hindenburg assinou o edito nomeando o Dr. Joseph Goebbels seu titular. Naquela
noite, ao chegar a casa, ele foi recebido por Magda como Herr Reichsminister.
"Bebemos champanha para brindar ao futuro. Sinto-me um pouco nervoso
quando penso que, com pouco mais de 35 anos, tenho sobre os ombros tão grande
responsabilidade... Mas, que a grande obra prossiga! E que eu sempre permaneça
grato ao Führer pela enorme confiança que tem em mim."
Nos seis anos decorridos entre a tomada do poder pelos
nazistas e o começo da guerra, Goebbels desenvolveu as técnicas com as quais
manteve seu Führer nos píncaros a que os truques de propaganda o haviam
erguido.
"A propaganda foi o gênio do nacional-socialismo",
diz Joachim Fest em The Face of the Third Reich. "Ela não foi apenas a
determinante das mais importantes vitórias de Hitler. Mais que isso, ela foi a
alavanca que promoveu a ascensão do partido, sendo mesmo parte de sua essência,
e não simples instrumento de poder. É muito mais difícil compreender o
nacional-socialismo através de sua nebulosa e contraditória filosofia do que
pela índole da sua propaganda. Indo ao extremo, pode-se dizer que o
nacional-socialismo era propaganda disfarçada em ideologia."
Do lado positivo, a canonização do Führer dependia
inteiramente da máquina de estimulação e do mesmerismo. As partes mais
importantes dessa máquina eram as divisas, os rótulos, os letreiros
(Deutschland erwahe! Sieg Heil! etc., interminavelmente repetidos), fanfarras
triunfais, bandeiras, holofotes, formações em massa de gente e evidência
material de força, uniformidade de propósito expressada pelas colunas em marcha
e pelo cintilar dos instrumentos de agressão ou de trabalho de campo e a
criação de todas as formas de êxtase que levavam ao estado irracional, no qual
as palavras do Führer eram absorvidas como verdades fundamentais.
Por outro lado, considere-se também a ação contrária,
potencial ou real, dos que se apegavam secreta ou abertamente ao liberalismo de
pensamento ou de expressão. Era muito simples montar um Thingspiel (mistura de
toque de recolher, de circo e de dança orgiástica) num anfiteatro nacional e
formar uma platéia de 45.000 Jovens Hitleristas que receberam ingressos nos
seus envelopes de pagamento (de onde se deduziu o dinheiro); era mais difícil
impedir a circulação de propaganda antinazista tenuemente disfarçada de
diversão, literatura ou arte. Por exemplo, um artista de cabaré chamado Werner
Finck apresentava uma cena, passada numa alfaiataria, em que ele aparecia
tirando as medidas para fazer um terno.
Parte do diálogo envolvia a pseudomedição - dezenove, trinta
e três. À pergunta "como prefere os bolsos", Fink respondeu:
"Bem abertos - como é moda agora". Por isto ele foi mandado para um
campo de concentração. As provas contra esses infratores eram recolhidas
principalmente por bisbilhoteiros - que Himmler tinha em grande número - e por
batidas policiais.
A literatura, no sentido mais amplo, era muito mais fácil de
controlar, porque suas infrações eram evidentes por si mesmas. Quem não ouviu
falar das cerimônias de queima de livros de maio de 1933, quando milhões de
obras "imorais" foram destruídas nos pátios das universidades,
acompanhadas de pios discursos dos acadêmicos que não haviam sido demitidos ou
enviados para os campos de concentração por causa das suas deficiências raciais
ou idéias liberais? O mesmo acontecia com os jornais: a demissão de um pretenso
redator liberal era tratada como a triunfal descoberta e exposição ao sarcasmo
público de um traidor do Reich.
"Proibições atrás de proibições", escreveu Goebbels
"decidem o rumo da revolução... os jornais judeus, que nos têm causado
tantas dificuldades, desaparecem repentinamente das ruas de Berlim, o que é um
alivio e uma bênção. Goering está limpando as cavalariças de Áugias".
Enquanto Goering realizava essa tarefa, Goebbels introduzia a
idéia do nazismo nos lares e nas mentes de milhões que, em outras
circunstâncias, teriam permanecido indiferentes ou críticos - e em 1933 estes
ainda eram muito numerosos. ("Se Hitler fosse inteiramente popular,
Goebbels estaria desempregado; e se Goebbels fosse inteiramente bem sucedido, Himmler
estaria desempregado", diria acremente o correspondente do New York Times
em Berlim.) Os vacilantes foram arrebanhados e convertidos pela mais recente e
poderosa máquina de propaganda de Goebbels: o rádio.
Sua primeira providência, após mandar o Departamento dos Correios aumentar o número e a potência dos transmissores que controlava através da Companhia de Rádio Nacional Alemã, foi assegurar a disponibilidade de receptores para as transmissões. Para tanto, expediu uma ordem direta do Ministério aos fabricantes de rádio para que projetassem e produzissem um Volkspfänger (receptor popular) a ser colocado à venda por preço tão baixo que ninguém deixasse de comprar um - sobretudo com a facilidade das vendas a crédito. Desse modo, ele aumentou o número de ouvintes de casa para 24 milhões, à média de 4 pessoas por casa, em fins de 1933. Mas havia cerca de 23 milhões de lares e nem mesmo Goebbels podia colocar um receptor em cada um deles com rapidez suficiente para captar as palavras imortais que o Führer e os nazistas que o apoiavam despejaram pelos microfones durante o seu primeiro ano no poder. Foi, então, ordenado que se fizessem audições comunais.
"A audição comunal de transmissões consideradas
importantes tornou-se uma característica da vida na Alemanha nazista. Muitas
delas eram feitas em horas de trabalho, o que levava as fábricas e escritórios
a suspender a atividade, para que fosse atingida toda a força de trabalho do
país. Os restaurantes e cafés tinham de possuir aparelhos de rádio, para essas ocasiões
públicas; além disso, instalavam-se postes com alto-falantes nas ruas...
[Assim] o Terceiro Reich alcançou uma cobertura radiofônica mais densa do que
qualquer outro país do mundo. Os elos humanos, nessa rígida rede, eram os
"guardiões radiofônicos" do partido nazista, que tinham o dever de
levar os que viviam em seu quarteirão a ouvir os programas prescritos pelo
partido, de dedurar os que ouviam transmissões estrangeiras e de enviar
relatórios sobre, por exemplo, reações produzidas na audiência, preferências e
pedidos dos ouvintes para uma agência coordenadora central".
O trecho acima, extraído do livro Social History of the Third
Reich, de Richard Grunberger, leva à conclusão de que se deve ter perdido uma
quantidade enorme de horas de trabalho, pois os discursos de Adolf Hitler e
seus seguidores quase sempre duravam duas horas, às vezes três horas.
Evidentemente, Goebbels achava que a inseminação da doutrina nazista era mais
importante que a produção dos trabalhadores. Nesse estágio de instável domínio
do partido sobre a nação, era essencial que os vacilantes e os críticos fossem
levados para o curral certo. A máquina de convencimento dos apartidários foi
então acionada.
A eficiência do seu funcionamento foi testada em fins de
junho de 1934, quando se deu o massacre dos adversários e dos amigos duvidosos
do nazismo, perpetrado na "noite das longas facas" - o fim de semana
de 29 e 30. Chegara a hora de Gregor Strasser, assim como a do chefe das Tropas
de Assalto, Ernst Röhm, cuja ambição era tornar-se Ministro da Defesa e,
subseqüentemente, substituir o poder do exército regular pelo das suas tropas
SA. Mas o exército regular é que tinha, pela Constituição, o poder, e com
Hindenburg caminhando rapidamente para a morte, Hitler planejava acumular os
cargos de Presidente e de Chanceler, de modo que todos os membros das forças armadas
fossem obrigados a prestar juramento de fidelidade a ele pessoalmente. As
insubordinadas Tropas de Assalto de Röhm haviam cumprido sua tarefa e, de
qualquer modo, Hitler concordara em reduzir seus efetivos em dois terços,
quando a Grã-Bretanha, na pessoa de Anthony Eden, o desafiou - uma medida
diplomática que fez baixar a temperatura da antipatia da Europa para com
Hitler.
Assim, Röhm teve de ser eliminado. Arrancado da cama, onde
estava com "seu" amante, foi fuzilado por seus próprios seguidores. O
mesmo aconteceu com Gregor Strasser, a quem Hitler jamais perdoara por lhe
haver tentado arrancar o poder quando se encontrava na prisão. O mesmo
aconteceu com centenas de membros do partido - nunca se precisou o número deles
- cujos atos subversivos eram evidentes ou sobre quem pairavam acusações de
Himmler de haverem praticado alguma contravenção, real ou inventada, como, por
exemplo, von Schleicher - que teve o azar de ser o homem que bloqueara o
caminho de Hitler para a Chancelaria - e muitos dos que haviam ajudado a tramar
o incêndio do Reichstag e que por isso se tornaram perigosos.
Todos esses, e incontáveis outros, foram procurados e
assassinados pelas Tropas de Assalto do próprio Röhm durante aquele fim de
semana sangrento. Goebbels teve pouco que ver com o planejamento da "noite
das longas facas": ele estava preocupado era com a sua própria pessoa no
resultado do expurgo e, metaforicamente, agarrou-se à mão de Hitler para se
garantir de que sairia ileso da fúria do furacão que o Führer fez soprar no
momento em que decidiu varrer do caminho quem quer que representasse obstáculo,
real ou potencial, às suas pretensões. Notou-se que Goebbels estava
constantemente à sombra de Hitler - uma caricatura diabólica e sorridente,
aviltando-se e tentando desesperadamente ocultar seu pé aleijado, como se isso
fosse capaz de provocar o desagrado do seu senhor e resultar no seu afastamento
do caminho do poder".
O trabalho que lhe coube, ordenado por Hitler e executado com
meticuloso cuidado; foi inventar e tornar públicas histórias convincentes dos
"suicídios" dos que desapareceram misteriosamente durante o fim de
semana de 29-30 de junho e cujos corpos não foram recuperados aos rios,
pântanos e bosques distantes durante muitos meses. Lágrimas de crocodilo verteram-se
por Ernst Röhm: "Um grande homem da história do Partido
Nacional-Socialista. O seu suicídio foi o resultado inevitável de chantagem e
homossexualismo". E todos os documentos que poderiam de alguma forma
vincular o Führer ao expurgo foram pessoalmente destruídos por Goebbels,
enquanto que os repórteres dos jornais foram ameaçados de desaparecimento
igualmente misterioso, nos campos de concentração, se fizessem qualquer
referência desautorizada ao fim de semana vermelho.
O privilégio de noticiá-lo era de Hitler que, a 2 de agosto,
após a morte de Hindenburg, acumulou os cargos de Presidente e Chanceler,
alçando-se desse modo ao poder absoluto. Não tendo, então, nada que lhe pudesse
solapar a autoridade, ele apresentou a sua versão do expurgo, acrescentando a
ameaça: "Todos devem saber que se, doravante, alguém erguer a mão contra o
Estado, o destino será a morte certa".
Como de costume, Goebbels não se deu por achado diante da
discrepância entre o que tinha propagandeado, que todas as vítimas conhecidas
do expurgo haviam sido suicidas, e a frenética revelação de Hitler de que ele
"expurgara o Reich dos seus inimigos", discrepância que fora anotada
e estava sendo satirizada nos cabarés clandestinos.
"Eu é que faço a verdade", escreveu ele
cinicamente. "Estive com Himmler hoje e disse-lhe que temos de arrancar
esses pretensos satíricos dos seus cantos escuros e mostrar-lhes os erros do
seu procedimento."
Aqueles que se negavam a engajar na linha de raciocínio
estabelecida pelo Ministério do Esclarecimento e Propaganda, denominados por
Goebbels "intelectuais", receberam o mesmo tratamento. Um deles,
Oswald Spengler, publicara um livro, chamado A Hora da Decisão, no qual
escrevera:
"Não censurarei nem elogiarei. Evitarei formar qualquer
estimativa das coisas que estão surgindo agora. A justa avaliação de um fato só
é possível depois que ele se fez passado, e os seus bons ou maus resultados são
coisa concreta. Logo, só a História poderá julgar os grandes acontecimentos,
talvez quando os seus contemporâneos já não forem vivos. Isto [a tomada pelos
nazistas do poder] não foi nenhum triunfo, pois faltavam oponentes. A Alemanha
está em perigo. Meu temor pela Alemanha não tem diminuído. Vejo mais longe que
outros... "
As dúvidas que Spengler lançou sobre as virtudes do novo
regime foram raivosamente respondidas por Goebbels em dois panfletos oficiais
que esmagaram seus argumentos com golpes que, muito obviamente, eram o
desespero de um intelectual - Goebbels era sem dúvida um intelectual -
reconhecendo o poder do pensamento não reprimido. Spengler morreu dois anos
depois, tendo recusado a transformar-se num seguidor de Hitler. Goebbels
vingou-se de modo mais vigoroso de Elm Welk, redator do semanário Gruene Post,
que o ofendera publicando um editorial em que se registravam as dificuldades
que vinha encontrando para publicar um jornal que não passava de cópia de mil
outros, todos feitos à base das notas fornecidas pelo Ministério da Propaganda.
"Somos informados de que essas declarações oficiais têm de ser reescritas",
consignou ele, "que não devemos ter medo de criticar; e também que, se
tivermos dúvida, o próprio Ministro nos ajudará a solucionar nossos problemas.
Mas quando fui procurá-lo pessoalmente, constatei ser muito difícil entrar em
contato com tão grande homem, vivendo numa casa tão grande, com tantos
aposentos e cercado de gente tão importante. Esperei em mil antecâmaras para
ver se podia obter qualquer informação sobre como dirigir o Gruene Post de
maneira a agradar o Ministro e, ao mesmo tempo, criticar sem receios. Mas vim
embora sem ter obtido qualquer informação".
Goebbels imediatamente suspendeu o jornal e mandou prender
Welk e enviá-lo a um campo de concentração.
Mas, fora da Alemanha, ele nada podia fazer contra a sátira
ou a critica. Quando Hitler o enviou a Genebra, para participar da Conferência
do Desarmamento de setembro de 1933, ele se fazia acompanhar, permanentemente,
por um grupo de seis guarda-costas, seis robustos homens das SS especialmente
escolhidos como exemplos do "físico ariano ideal". Eram altos,
espadaúdos, louros - feitos pelo mesmo molde de Horst Wessel. Uma caricatura
publicada num jornal suíço mostrou-os como bonecos parados, de braços cruzados,
contra um fundo de bandeiras da suástica; em primeiro plano, agachava-se um ananicado
e deformado Goebbels, com seus cabelos pretos brilhando sobre um sorriso cruel.
"E quem é este aí?" indagava a legenda. "Ora, este é um belo,
alto, louro, desempenado e fisicamente soberbo representante da grande raça
nórdico-ariana de alemães puros."
Contudo, dentro do seu território, Goebbels jamais teve
diminuído o domínio sobre as emoções do povo alemão. No ministério que dirigia,
ele criou departamentos que não deixavam qualquer aspecto da vida doméstica do
país insondado pelos dedos da propaganda. Havia oito desses departamentos, que
se ocupavam com Lei, Finanças, Pessoal, Cultura e Publicidade; com Política,
Cerimonial, Juventude, Saúde Pública, Problemas Raciais e Viagens; com Rádio;
com Disseminação de Notícias no País e no Exterior; com o Cinema; com o Teatro,
Música e Arte; e com a Proteção contra a Contrapropaganda no País e no
Exterior.
O provimento dos cargos desses departamentos era feito com
muito cuidado. Goebbels escolhia a dedo seus auxiliares e exigia deles
eficiência igual a sua, e ele era fantasticamente eficiente, podendo, a um só
tempo, dedicar-se com igual intensidade a uma variedade de assuntos. Era normal
vê-lo rodeado em seu gabinete por três ou quatro secretárias, ditando
simultaneamente artigos, discursos, cartas e memorandos.
Tendo interrompido seu ditado a uma delas no meio de uma
frase, para ditar algo completamente diferente a uma outra secretária, ele
voltava, às vezes até dez minutos depois, ao ponto que havia sido interrompido
sem qualquer vacilação. No fim de duas ou três horas de atividade assim
intensa, ele talvez fumasse um cigarro e bebesse um copo de vinho branco, para
depois partir com outro séquito de secretárias, embarcando num carro ou num
trem, onde continuaria trabalhando com a mesma diligência, chegando ao seu
destino plenamente preparado para fazer um discurso de uma hora no qual,
segundo o embaixador britânico na Alemanha, Sir Nevile Henderson (e incontáveis
outras testemunhas), "bílis alguma e mentira alguma eram clamorosas demais
para ele".
Sua incapacidade de fazer calar as chacotas a ele dirigidas
pela imprensa estrangeira era um tormento constante; mas toda a sua relação com
os jornalistas que representavam os jornais das democracias era exacerbada pela
mesquinhez do seu ponto de vista. Apesar da sua indiscutível inteligência, ele
não conseguia compreender a psicologia de outras nações.
"Por que eles insistem em ignorar a verdade como eu lhes
conto?" escreveu queixosamente em seu diário. Naturalmente porque os
correspondentes de Nova York, Londres, Paris e outros locais haviam visto com
os próprios olhos os mil e um atos do estado nazista que Goebbels negava com
calor - como, por exemplo, a perseguição aos judeus, que aumentava
gradativamente e que os boletins oficiais para a imprensa chamavam eufemisticamente
de "reorientação da população trabalhadora de acordo com as necessidades
da indústria alemã". Sua sofisticação revelava essa incapacidade de
compreensão: uma estranha crença de que a Europa e a América democráticas eram
apenas uma extensão do Reich alemão e que as pessoas lá fora eram facilmente
iludidas por falsas convicções, como os súditos de Adolf Hitler, já submetidos
à lavagem cerebral. Quando se tornou evidente, pelas reportagens saídas na
imprensa estrangeira, que essas pessoas assim procediam por viverem fora de uma
nação contida pela policia secreta e por uma Lei da Capacitação Plena, que dava
poder absoluto a um homem, ele se vingou expulsando muitos correspondentes
estrangeiros por fazerem "reportagens incorretas" - aparentemente não
vendo que, assim procedendo, estava mostrando fraqueza, e não força.
Como que para rebocar as fendas abertas no edifício do
Terceiro Reich, ele mudou de tática e gastou uma fortuna - 260 milhões de
marcos em um ano apenas, 1934 - em propaganda no estrangeiro, colocando adidos
de imprensa em suas embaixadas e instruindo-os, em mensagens cifradas, sobre as
diretrizes que deveriam adotar:
"Para o mundo exterior, nossa propaganda deve sublinhar
de maneira impressionante que a Alemanha não deseja outra coisa senão uma
solução pacífica de todos os problemas pendentes. De maneira hábil, todos os
que se têm recusado a ceder às legítimas exigências da Alemanha têm de ser
culpados pelo fracasso de uma composição pacífica. Isto tem de ser feito com
discrição e de maneira que varie sempre."
Ineptamente, ele fez soar no exterior o tambor da propaganda.
Não é de surpreender que viesse a fracassar completamente em seu relacionamento
com a imprensa estrangeira o homem que admitia - de acordo com o que afirmou
numa coletiva à imprensa, concedida a 7 de abril de 1933 - que "na
Grã-Bretanha e na França, qualquer que seja o ponto de vista dos partidos
políticos, a opinião pública é sempre dirigida de modo uniforme em todas as
questões consideradas importantes para a nação".
Mas dentro dos seus próprios domínios, o som surdo da sua
propaganda era tão implacável quanto o som de pés em marcha - sorri este
transmitido pelo rádio em todas as ocasiões possíveis, freqüentemente várias
vezes por dia. Num crescendo, os lemas, as ordens, a música marcial, os
discursos, os hinos e o rufar de tambores aceleraram de maneira aterradora para
o choque fortíssimo da guerra.
11. O
ÚLTIMO ATO
Antes que pudesse dedicar-se á tarefa de subjugar outras
nações e ampliar as fronteiras da Alemanha, para prover lebensraum para "a
maior nação da terra" (foi uma frase que Goebbels criou para ele), Hitler
teve de subjugar primeiramente a própria Alemanha. No Reichstag, isto não foi
problema. Os social-democratas agarraram-se pusilanimemente aos nazistas,
depois de fraca resistência nas eleições; os comunistas haviam sido suprimidos;
os democratas e o Partido do Povo expiraram por vontade própria e o Partido do
Centro e o Partido Nacional Alemão foram "voluntariamente"
dissolvidos, quando Tropas de Assalto invadiram seus escritórios como meirinhos
apreendendo por dívidas. A 14 de julho de 1933, toda oposição foi proibida por
lei: "O Partido Nazista constitui o único partido político da Alemanha.
Quem quer que se aventure a manter a estrutura de qualquer outro partido
político ou a formar um novo partido político, será punido com trabalhos
forçados até três anos, ou por prisão de seis meses a três anos, se o fato não
for sujeito a maior penalidade, de acordo com outros regulamentos".
Já anteriormente, os governos estaduais alemães, que sempre
mantiveram seus próprios poderes dentro da federação, haviam sido dissolvidos,
e governadores nazistas haviam sido nomeados "para levar a cabo a política
geral estipulada pelo Chanceler do Reich".
Também os sindicatos foram esmagados, pelo confisco dos seus
fundos, pela ocupação de suas sedes e pelo encarceramento dos seus lideres,
"por não cooperarem com o regime". Simultaneamente, a propaganda de
Goebbels informou os trabalhadores que o Führer compreendia a pobreza em que
viviam e não permitiria a exploração pelo "capitalismo anônimo" e que
daí por diante os contratos de trabalho seriam regulamentados pelos
"líderes naturais" da indústria. Como com isto ele queria dizer que
no futuro os empregadores seriam os senhores absolutos da indústria e que as
greves seriam proibidas por lei, é compreensível que os trabalhadores não se
convencessem. Eles foram persuadidos a uma semicrença por uma enorme
celebração, a 1o de maio, das glórias do trabalho. A comemoração foi preparada
(por Goebbels) no Campo Tempelhof, em Berlim, num estilo semelhante ao que era
usado nas Reuniões de Nuremberg. Hitler berrou para 100.000 delegados dos
trabalhadores ali reunidos que ele e a nação sempre honrariam o trabalho e
respeitariam o trabalhador, acrescentando que era completamente fora de
propósito a afirmação de que o nazismo era contra os trabalhadores alemães.
Aduziu ainda que a Festa da Primavera seria realizada em homenagem ao trabalho
alemão pelos séculos a fora.
Toda essa fantasia, pronunciada à maneira mesmérica de Hitler
e apoiada pelas bandas de música, desfiles comuns e outros processos de
aquecimento, teve o efeito desejado - especialmente com o reforço, como
aconteceu durante as semanas seguintes, das prisões em massa e dos
confinamentos "em custódia protetora" de todo aquele que cometesse a
temeridade de levantar um dedo ou dizer uma palavra de protesto. Acuando o
Judiciário com a ameaça de meter em campo de concentração os juízes que viessem
a condenar os bandidos que em nome da nova ordem atentavam contra as liberdades
públicas, a "justiça" nazista prosperaria daí em diante, assinalando
o fim do regime de direito.
Quanto à estrutura econômica, Hitler substituiu o Diretor do
Reichsbank, Dr. Hans Luther, pelo Dr. Hjalmar Schacht, bajulador de Hitler
desde os primeiros tempos do partido. Durante os cinco primeiros anos de
gestão, Schacht esforçou-se por demonstrar que fora sensata a escolha do
Führer, baseando a economia alemã num vasto programa de rearmamento. Não
poderia ter sido mais eficiente na criação de trabalho para os desempregados
alemães que, com a crise econômica mundial provocada pelo colapso de Wall
Street, iniciada em 1929, somavam cerca de 6 milhões. Assim, os desígnios
expansionistas de Hitler foram convenientemente transformados num programa
racional de recuperação - programa que durante breves momentos se apoiou, nas
palavras delicadas de Schacht, "nos processos inflacionários da
impressora", mas que em breve passou a desenvolver-se por seu próprio
impulso e pelos "fundos confiscados dos bolchevistas, judeus e outros
inimigos do Grande Reich Alemão".
Naturalmente, o programa de rearmamento tinha de ser mantido
em segredo. Aos jornalistas estrangeiros, Goebbels negava a existência de
qualquer esforço armamentista que ultrapassasse os limites impostos pelo
Tratado de Versalhes. O incrível é que esperava que acreditassem nele, assim
como esperava que acreditassem quando explicou que os campos de concentração
eram "parte do plano do Führer para a reabilitação da raça judia".
Ele acreditava ingenuamente que, se podia criar em seu país a ilusão de que
preto era branco, as nações responderiam com igual credulidade. A propósito, um
correspondente da Associated Press em Berlim, Louis P. Lochner, diz:
"Notável exemplo da capacidade de Goebbels de cavilação
descarada foi dado aos correspondentes estrangeiros acreditados em Berlim a 10
de novembro de 1938, um dia depois que Hitler deu às suas hordas o sinal para
iniciar o saque às lojas de judeus, a demolição de suas propriedades, o
incêndio das sinagogas e a prisão de judeus inocentes. No fim daquela manhã
fomos chamados ao Ministério da Propaganda, pois o Dr. Goebbels queria fazer
uma declaração.
"De repente, com passos rápidos e nervosos, ele entrou e
convidou-nos a fazer um semicírculo ao seu redor, e declarou que as histórias
que chegaram aos seus ouvidos sobre o suposto saque e destruição de
propriedades de judeus são uma mentira suja (sind erstunken und erlogen). Não
se tocou num só fio de cabelo judeu (den Juden ist kein Haar geprummt worden).
"Entreolhamo-nos espantados. Em toda a nossa atividade
jornalística, jamais víramos coisa semelhante.
"A apenas três minutos da Wilhelmplatz, onde ficava o
Ministério da Propaganda, estava a famosa rua comercial de Berlim, a Leipziger
Strasse, em cuja extremidade se erguia a 'Wertheim', a conhecida loja de
departamentos, com suas grandes vitrinas destruídas e suas famosas exposições
transformadas num monte de escombros. Entretanto, Goebbels atrevia-se a dizer-nos
que o que tínhamos visto com nossos próprios olhos era 'uma mentira suja'.
"Depois que nos recuperamos da estupefação que a todos
deixou paralisados, voltamo-nos para onde se encontrava o Dr. Goebbels com a
intenção de lhe fazer algumas perguntas. Valendo-se, porém, daquele momento de
embaraço para nós, ele desapareceu, fugindo a explicações muito difíceis.
"O que Goebbels não levou em conta quando deu seu golpe
é que, embora reproduzíssemos fielmente suas palavras, para que pudéssemos
permanecer em nossos postos na Alemanha, no dia anterior havíamos enviado ao
nossos jornais depoimentos de testemunhas oculares do incêndio das sinagogas,
do espancamento de judeus, da destruição das vitrinas das lojas de judeus, da
corrida dos bandidos pelas ruas aos gritos de Juda Verrecke (Eliminem os
Judeus).
"Na noite anterior, minha mulher e eu passamos horas
assistindo à obra de destruição dos frenéticos nazistas. Além disso, alguns de
nós haviam enviado histórias, pouco antes que Goebbels iniciasse sua entrevista
coletiva com a imprensa, dando conta das dificuldades que encontramos para
chegar à Wilhelmplatz; escolhendo o caminho e fazendo desvios para não cortar
nossos pneus nos cacos de vidro das caríssimas vitrinas que entupiam as
principais ruas.
"O efeito da fiel repetição da declaração de Goebbels
foi, por isso, muito diferente do que o Ministro da Propaganda de Hitler
esperava."
Lochner referia-se à notória "noite das vitrinas
quebradas" - ao terrível clímax do pogrom que por mais de cinco anos havia
chocado o mundo livre. Era já tão impossível manter em segredo o pogrom quanto
os cinco anos de rearmamento da Alemanha. A amena garantia de que a nação
estava em franca recuperação econômica, através de um bem elaborado programa de
obras públicas", não convencia a ninguém fora do alcance da incansável voz
de Goebbels - embora, como veremos adiante, alguns dos que, por covardia,
confraternizavam com Hitler evidentemente quisessem ser convencidos.
Não havia dúvidas quanto às obras públicas - as Autobahn, os
planos de erradicação de favelas etc. - mas também não havia dúvidas, como diz
Shirer, de que "a base real da recuperação da Alemanha era o rearmamento,
para o qual o regime nazista dirigiu as energias do mundo dos negócios e da
mão-de-obra - a partir de 1934. Toda a economia alemã passou a ser conhecida,
no linguajar nazista, como Wehrwirtschaft, ou economia de guerra,
deliberadamente projetada para funcionar não só em tempo de guerra, mas também
durante o período de preparação da guerra".
De qualquer modo, soava tão ridículo a propaganda oficial de
Goebbels apregoar que os objetivos de Hitler eram "inteiramente pacíficas,
interessados somente na recuperação econômica do Reich Alemão", como
pretender que "não se tocou num só fio de cabelo dos judeus". Em julho
de 1934, o Führer tentou um golpe na Áustria, dando ordens para que fosse
assassinado o Chanceler Dollfuss - crime que as SS de Himmler cometeram, para
mascarar a procedência da ordem, em uniformes austríacos, mas que não conseguiu
ser um golpe porque o governo austríaco logo recuperou o controle da ameaçadora
situação política.
Fracassado o primeiro ataque, Hitler tornou públicas
expressões de profundo pesar pelo cruel assassinato, o qual, naturalmente,
atribuiu a traidores austríacos. Mas ninguém que conhecesse o panorama político
europeu poderia iludir-se, muito embora a reação internacional fosse tão
indecisa e fraca quanto o foi oito meses depois, ao ser anunciada ruidosamente
a reconstrução da Força Aérea e da Marinha alemãs e o restabelecimento da convocação
para o serviço militar.
A ocupação da Renânia, em março de 1936, foi a primeira
demonstração bem sucedida de força de Hitler - força que ele reunira enquanto a
Grã-Bretanha e a França assistiam irresolutas, faziam débeis discursos de
reprovação e advertência, e imaginando se talvez não fosse melhor permitir que
a Alemanha se rearmasse oficialmente. Os freqüentes discursos tranqüilizadores
do Führer, sobre paz, razão e conciliação, eram sancionados pelo que
expressavam seus termos por alguns dos estadistas mais obtusos que vieram a ser
manipulados por Hitler como marionetes. E também por alguns dos mais
respeitados jornalistas. Geoffrey Dawson, redator do Times de Londres, deixou
de publicar deliberadamente as reportagens perturbadoras que Norman Ebbutt, seu
correspondente em Berlim, lhe enviava. Tremendo em suas bem engraxadas botas,
ele escreveu ao seu representante em Genebra:
"Noite após noite, tenho feito o que posso para não
publicar no jornal qualquer coisa que venha a ferir as suscetibilidades
alemães. Não creio que tenha publicado, há meses, o que quer que seja que eles
possam considerar injusto."
Não era de surpreender que, com homens como Dawson, Simon (o
Secretário das Relações Exteriores britânico), Baldwin e Chamberlain
(Primeiros-Ministros na década que precedeu o último conflito), as negativas de
Goebbels sobre o rearmamento ganhassem credibilidade. Mesmo quando se
transformaram sutilmente em negativas de rearmamento para guerra, os britânicos
se deixaram enrolar a tal ponto que permitiram a reconstrução da marinha alemã
até "um efetivo de 35% do da Marinha Britânica - acordo sobre o qual nem a
França, nem a Itália e nem a Liga das Nações foram consultadas.
Menos de um ano depois de invadir a zona desmilitarizada da
Renânia com suas tropas pretensamente inexistentes, Hitler anunciou
generosamente ao mundo que a Alemanha retirava sua assinatura do Tratado de
Versalhes. Irritadas e ofegantes com a exaustão da descoberta do truque
grosseiro que vinha sendo preparado debaixo de seus olhos desde 1933, a
Grã-Bretanha e a França continuaram a concertar fúteis acordos diplomáticos que
culminaram com a suprema estupidez do "Pacto de Munique", de setembro
de 1938.
Apenas seis meses antes de Chamberlain descer cambaleante do
avião, agitando no ar o certificado da "paz em nosso tempo", Hitler
anexara a Áustria, com sua famosa Diretiva n° 1 rezando o seguinte:
1. Se outras medidas fracassarem, pretendo invadir a Áustria
com forças armadas para estabelecer condições constitucionais e impedir outros
ultrajes contra a população alemã.
2. Toda a operação será dirigida por mim mesmo.
3. As forças do Exército e da Força Aérea destacadas para
esta operação tem de estar prontas para a invasão a 12 de março de 1938, ás
12:00 h o mais tardar.
4. O comportamento das tropas tem de dar a impressão de que
não queremos travar guerra contra nossos irmãos austríacos. Portanto, qualquer
provocação deve ser evitada. Contudo, se houver resistência, esta tem de ser
dominada implacavelmente pela força das armas".
Acontece que a anexação da Áustria foi incruenta, realizada
pela infiltração dos quinta-colunas de Hitler no Parlamento austríaco. Quando
se realizou um plebiscito, a 10 de abril, a ocupação do país pelas tropas
alemães assegurou que os votos fossem praticamente cem por cento favoráveis a
Hitler. Nem a Grã-Bretanha nem a França podiam mais alimentar dúvidas quanto
aos objetivos fundamentais de Hitler. Porém, continuaram no país da fantasia
durante todo o restante de 1938 e os primeiros oito meses de 1939, agitando
pedaços de papel, sacudindo guarda-chuvas e protestando através dos seus
embaixadores "nos termos mais veementes possíveis" contra as
"intoleráveis reivindicações territoriais de Hitler". Quando os
Sudetos foram arrancados ao território tcheco-eslovaco e o famoso Corredor
transformou-se no pomo da discórdia, com a Polônia resistindo à devolução
"legítima ao Reich" de Danzig, os estadistas da França e Grã-Bretanha
quedaram-se em inacreditável horror. O palco estava sendo preparado para o
último ato e eles nem sequer sabiam seus papéis.
12. DESCE O
PANO
Os estadistas aliados talvez não soubessem seus papéis, mas
Goebbels certamente sabia o seu. "Aristóteles", comentava ele, por
essa época, "diz que é melhor criar uma personalidade adaptável ao seu
inimigo e resumir essa personalidade numa única imagem representativa", e
Goebbels passou a fazer isso.
Não havia muito o que fazer com Chamberlain, que era tão
ineficiente, que não existia como personalidade. Mas Churchill, que se tornou
Primeiro-Ministro a 10 de maio de 1940, era vinho de outra pipa. "Em
palavras e imagens", instruiu Goebbels aos seus lacaios, "Churchill
tem de ser representado como o arquétipo do povo britânico - criatura viciosa e
sorridente, com testa de macaco, um dipsomaníaco inventando mentiras, sempre na
companhia de plutocratas, judeus, bolchevistas, com os trabalhadores sob seus
calcanhares. Deveria também ser ressaltada a sua idade [Churchill tinha 65 anos],
o estímulo que dava à guerra para tirar benefício pessoal, sua disposição para
aceitar qualquer cargo, em qualquer governo (o que corresponde com a desunião
do povo britânico) e seus antecedentes familiares, pai sifilítico, mãe
prostituta etc."
Assim, o inimigo foi coletivamente tipificado para o povo
alemão. Como Hitler e Goebbels haviam notado, uma curiosidade da propaganda é
que, quanto mais vulgarmente apresentada, maior a sua aceitação. A mesma
estranheza se constata na subdivisão da propaganda, a publicidade. É fácil
convencer a maior parte da população das virtudes de um produto que dá, por
exemplo, uma flor de plástico aos que o adquirem, de preferência a um outro
qualquer. Sendo assim, nada há de extraordinário no fato de as piadas de
Goebbels se terem mostrado tão convincentes e no de, até o fim da guerra, em
intensidade sempre crescente, o inimigo da pura, esplêndida, altaneira e
poderosa raça alemã ter sido apresentado disfarçado num Churchill ridiculamente
deformado.
Também os primeiros acontecimentos da guerra foram
ridiculamente destorcidos. O afundamento do Athenia, por exemplo. O Athenia era
um navio de passageiros que transportava mil mulheres e crianças que retornavam
aos Estados Unidos e foi posto a pique pelo submarino U-30 a 4 de setembro de
1939, na suposição - assim disse o comandante do submarino em seu relatório -
que se tratasse de um cruzador armado. Goebbels imediatamente providenciou para
que desaparecesse o relatório, afirmando que em verdade "Churchill mandara
colocar bombas no navio, satisfazendo simultaneamente, desse modo, sua própria
crueldade e dirigindo a ira do mundo para uma Alemanha desumana". Ele
apresentou provas de que o Führer puniria com a morte qualquer comandante
alemão que atacasse navio de passageiros desarmado. Como o comandante do
submarino ainda estava vivo e transmitindo uma versão da história (script de
Goebbels, naturalmente) para a nação alemã, a hediondez do crime contido
ganhava coloração diferente.
O caso do Ark Royal foi mais difícil de controlar. O
porta-aviões foi ligeiramente danificado por um torpedo alemão a 14 de setembro
e novamente, pela Luftwaffe, a 26. A imprensa e o rádio alemães comunicaram
rápida e triunfalmente que ele fora "totalmente destruído".
Portanto, foi para o alemão desconcertante a descoberta de
que ele estava novamente em ação, no Atlântico Sul, duas semanas mais tarde e,
em novembro, agentes alemães viram-no, intacto, ancorado na Cidade do Cabo.
Numa conferência, Goebbels perguntou ao, oficial-de-ligação naval se podia explicar
o que estava acontecendo, que era verdadeiramente embaraçoso.
"Receio que não, Herr Reichminister. O Ark Royal foi
afundado pelo Ministério da Propaganda, não por nós."
A conferência em que se deu esse contundente comentário teve
lugar a 23 de dezembro, durante uma das reuniões que diariamente se realizavam
na Wilhelmplatz, durante toda a guerra. Nessas conferências dava-se corda na
máquina de propaganda de Goebbels. A elas compareciam os chefes de
departamentos do seu Ministério - imprensa, rádio, cinema, cultura etc. - além
de oficiais-de-ligação das forças armadas, Gauleiters das sedes regionais do
partido e representantes dos outros Ministérios. O ambiente era ideal para
Goebbels; satisfazia-lhe a vocação para o drama, permitia-lhe usar amplamente o
cérebro ágil e manipular as palavras com rapidez, além de lhe engordar a
vaidade. Willi Boelcke, redator das minutas da conferência que sobreviveram,
diz que ali "Goebbels instalou seu posto de comando secreto. Era ali que,
dia após dia, ele transmitia ordens verbais para os vários setores da
propaganda... Somente ele baixava os decretos, fazia perguntas, elogiava ou
censurava, apresentava idéias, entregava-se a monólogos críticos, delineava
argumentos e ignorava virtualmente todos os contra-argumentos. Somente ele
determinava o que era correto e "de interesse para o povo". Nunca
havia uma discussão franca, e muito menos consultas, nem entre colegas... A
maioria dos participantes achava mais prudente não fazer perguntas nem
expressar dúvidas".
Na conferência de 16 de junho de 1940, Goebbels concebeu um
dos mais brilhantes e eficazes golpes de propaganda. "Muito embora a
França já esteja realmente derrotada", registra-se que ele tenha dito,
"isto ainda não está claro para o leigo... Ela ainda não se sentiu
atingida no cerne da sua honra nacional e militar. Contudo, nosso objetivo tem
de ser a eliminação da França, de uma vez por todas, como potência de
importância na Europa. Em última análise, a Grã-Bretanha só pode ser expulsa do
continente e reduzida a uma "Holanda maior" se a França, sua espada
continental, for esmagada de uma vez por todas. Por esta razão, a honra e o
orgulho nacional da França têm de sofrer um golpe de morte".
O golpe mortal não só foi dramático, mas sobretudo
humilhante. Vinte e dois anos antes, a 11 de novembro de 1918, o armistício
entre a Alemanha e os Aliados fora assinado no Wagonlit do Marechal Foch, numa
clareira da Floresta de Compiègne. Para vingativo deleite de Hitler, Goebbels
providenciou a colocação do vagão no mesmo lugar para a apresentação dos termos
de armistício alemães. O Führer sentou-se triunfante na mesma cadeira em que
Foch se sentou, e os emissários franceses, chefiados pelo General Charles
Huntziger, nas cadeiras que os delegados alemães haviam ocupado em 1918,
humildes e amargurados.
Isto aconteceu a 21 de junho de 1940. No dia 22, os
negociadores franceses, autorizados pelo seu governo, em Bordeaux, assinaram o
armistício às 18:50 h.
Quinze minutos depois, o Wagonlit estava sendo retirado por
engenheiros alemães, para ser transportado para Berlim, onde milhares de
pessoas pagaram alguns pfênigs para fazer reverência ante o altar do triunfo
erigido por Hitler. Foi uma das idéias mais produtivas - em termos de dinheiro
e moral - concebidas por Goebbels, que não perdeu tempo em explorar o êxito
obtido. Hitler passou a senhor de vasta extensão da Europa, do norte da
Escandinávia a Bordeaux, no Oeste, e o Rio Bug, no Leste. Goebbels deu ordens a
seus propagandistas para que apresentassem a obra de rapinagem como uma união
da Europa e cujo único obstáculo à sua complementação eram os britânicos.
"Esta semana", anunciou ele na conferência de 23 de junho,
"dar-se-á o maior golpe contra Churchill na Grã-Bretanha. Naturalmente ele
não poderá resistir. Formar-se-á um governo de conciliação. Estamos bem
próximos do fim da guerra". Mas quando os liderados por Churchill, que
Goebbels retratou como imorais, bêbados, viciosos, desintegrados, de ancestrais
duvidosos e inteligência tacanha, longe de se encolherem sob os tacões
hitleristas, ou de se revoltarem contra seu governante, começaram a erguer
rudemente dois dedos concordantes, num gesto de desdenhoso desafio, Goebbels
deu a sua interpretação ardilosa para o gesto tachando-a de
"suscetibilidade imbecil" dos britânicos "à palhaçada e à
retórica" de Churchill. "Impossível", dizia ele, "que
qualquer nação, por mais desprezível que seja, não se levante contra velhos
[Schelm] desgastados, que bebem brandy de manhã à noite, que dormem todas as
tardes e se levantam nos fantásticos trajes da segunda infância". Quando
Churchill demonstrou, a despeito da opinião de seu médico, Charles Wilson, para
quem "ele não se distinguia muito em julgamento, em habilidade
administrativa, em conhecimento da natureza humana", ser na liderança dos
britânicos bem mais que um velho tolo e bêbado, Goebbels calou a apresentação
estranhamente errada do "único inimigo que resta entre a Grande Alemanha e
a união triunfal".
A inesperada resistência da Grã-Bretanha no verão do Spitfire
de 1940 foi obscurecida pelas fanfarronadas alemães, enquanto Londres era
"arrasada" e a Real Força Aérea "reduzida à
insignificância". Essa fanfarronada redundou tão embaraçosa quanto a
história do Ark Royal e se esvaziou à medida que as perdas da Luftwaffe
aumentavam. Lorde Hah-Hah (William Joyce) foi presenteado com uma caixa de
charutos "como prova do reconhecimento do Ministro por difundir alarma e
desespero durante o verão mais agonizante da Grã-Bretanha". À parte a
instrução de que Hah-Hah devia prosseguir com o bom trabalho que estava fazendo
através de palestras radiofônicas na ARP, destinado "a incutir o horror na
população civil desde o início" a Batalha da Grã-Bretanha foi posta de
lado como assunto de discussão na conferência diária. "Não há nada que as
massas detestem mais", disse Goebbels desdenhosamente aos seus
propagandistas, "do que a ambigüidade, do que serem chamadas a considerar
isso e aquilo. Elas pensam de modo primitivo. Adoram generalizar situações
complicadas e, das suas generalizações, tirar conclusões claras e firmes".
Substituindo desse modo o argumento pela declaração, a Alemanha venceu a
Batalha da Grã-Bretanha e ninguém precisa mais incomodar-se com isso.
De qualquer modo, havia coisas mais urgentes do que os
britânicos. Aquela raça moribunda poderia ficar tranqüilamente à mercê da
poderosa operação invasora de Hitler, a "Leão-Marinho", planejada
para o outono (planejada, replanejada e finalmente abandonada).
Mais importante foi a declaração, feita a 3 de setembro de
1940 de que os Estados Unidos haviam concordado em emprestar à Grã-Bretanha 50
destróieres em troca de bases navais nas Índias Ocidentais. Goebbels viu no
acordo um passo decisivo para a participação dos Estados Unidos na guerra e
começou imediatamente a planejar a aristotélica personalização do novo inimigo.
Por conseguinte, Roosevelt tornou-se o arquético das
maquinações capitalistas americanas. "Descobriu-se" que ele tinha
ascendentes judeus (sua mãe recebera "secretamente o direito de
primogenitura pelo nome de Sara Rosenfeld") e que tinha
"desígnios" para a Grã-Bretanha, cuja ilha pretendia usar como
trampolim para tomar o resto da Europa e criar "um império mundial do
capitalismo americano". Os antepassados judeus de Roosevelt eram tão
numerosos quanto as pernas de uma cobra. Trezentos anos antes, seu antepassado
mais antigo que se conhece chegou a Nova Amsterdã vindo da Holanda e era
luterano. A mãe de Franklin, Sara Delano, nunca esteve mais perto do judaísmo
do que seus ancestrais huguenotes, os de la Noyes.
Mas, entretanto, fez-se o molde para o novo Roosevelt.
"O Ministro determina que o tema a ser adotado gradativamente seja:
"A América judia lutará - se realmente lutar - até o último inglês".
É perfeitamente claro o que Roosevelt quer: ele quer tomar a posição de mando
dos britânicos no mundo. Ele não tem qualquer intenção séria de fornecer
material à Grã-Bretanha, e, mesmo que quisesse, a indústria americana de
armamentos não está em condições de fazer isso. Ele só tem um interesse:
prolongar a guerra para que o império britânico enfraqueça e permita que os
americanos colham seu legado."
Havia uma verdade na imagem que Goebbels começou a projetar
durante o inverno de 1940: a indústria americana de armamentos tinha sofrido
drástica redução em seu potencial por influência dos numerosos isolacionistas
que se haviam decidido pela manutenção do país fora da guerra. Mesmo depois de
Pearl Harbor (7 de dezembro de 1941), Sir Alan Brooke, Chefe do Estado-Maior-Geral
Imperial, foi informado pelo Feldmarechal Sir John Dill, seu predecessor:
"Nunca vi um país tão despreparado para a guerra e tão indolente".
Mesmo assim, a Lei do Empréstimo por Arrendamento foi apresentada por Roosevelt
e aprovada pelo Congresso em março de 1941.
Naturalmente, isto deu a Goebbels a oportunidade de golpear o
Presidente com chamas de fúria. Roosevelt tornou-se um "louco"; ele e
Churchill eram "os grandes embusteiros do povo"; a nação americana
era governada "por um plutocrata vítima de uma doença que [havia]
desarranjado sua mente, produzindo-lhe ilusões de grandeza que chegavam às
raias da megalomania". E à medida que se tornava cada vez mais evidente
que os Estados Unidos se uniriam á Grã-Bretanha, a campanha de difamação foi
acelerada. Lendo os jornais e ouvindo o rádio alemães, tinha-se a impressão de
que o Cavaleiro da Armadura Brilhante, a Alemanha, estava protegendo-se
heroicamente do fedor venenoso, das chamas e da crueldade do dragão
Roosevelt-Churchill e aguardava apenas o momento certo para atacar e destruir a
besta nauseante e libertar o mundo dos horrores do capitalismo, do judaísmo, do
sindicalismo, da megalomania, da dipsomania e de outras características
desagradáveis da democracia.
A campanha não passava de uma continuação mais barulhenta e
menos cômica dos vociferantes ataques de Hitler dirigidos ao mundo na década
anterior, fortalecidos pelo choque das armas e abrangidos pelos tentáculos da
guerra oral de Goebbels. "Às vezes parecia", escreveu um correspondente
americano que esteve em Berlim até o momento de Pearl Harbor, "que
Goebbels ultrapassava o palco onde estava para nos conduzir pelas orelhas: ele
martelava declarações incríveis na nossa mente e já estávamos muito próximos de
considerá-las críveis. Todos procuramos manter a razão, mas não há dúvida
quanto à validade da afirmação de Hitler, quando assegurava que a mentira
gritada muitas vezes, bem alto, ganha na opinião do povo características de
verdade.
É certo que houve oportunidades para Goebbels propagandear
vantagens mais ou menos verdadeiras. Com referência à Batalha do Atlântico, por
exemplo. De 1941 a 1943, as perdas aliadas em navios mercantes atingiram
proporções desastrosas, e a cada minuto, todos os dias, os alemães ouviam
afirmações triunfantes. À medida que a produção americana de armamentos
acelerava, declarou-se alegremente: "A colossal produção do grande parque
industrial americano não aterroriza o povo germânico, pois tudo aquilo graças à
atividade dos submarinos alemães, jamais chegará ao local da operação".
Certamente era um exagero, mas inconfortavelmente perto da verdade. Grande
quantidade de material realmente se perdeu, graças à habilidade dos comandantes
de submarinos, reunidos em "alcatéias" contra os comboios. E quando
Goebbels fez uma transmissão radiofônica pessoal, em que se referiu aos navios
mercantes Aliados: "Sua tonelagem, o trunfo mais importante que possuía
para sustentar a guerra, estava diminuindo, diariamente, com rapidez
aterradora", ele foi perfeitamente correto.
Já então - a transmissão foi feita a 3 de maio de 1942 - a
campanha na Frente Oriental estava sendo travada há quase um ano e colocou
Goebbels diante de um problema para o qual ele não encontrava a solução. Era
impossível ocultar o fato de que o inverno causara sofrimentos enormes aos
exércitos germânicos, detendo-os em toda a frente. Repetia-se Moscou em 1812.
Os pedidos de agasalhos e material de inverno para as tropas não podiam de modo
algum ser transformados em histórias de êxitos. Trombetearam e exaustivamente
uma reviravolta completa nos campos de batalha da Rússia quando Hitler assumiu
o comando da campanha, em fins de 1941. Ele era "o maior gênio militar da
História" e a vitória-relâmpago viria com o verão. Não aconteceu
vitória-relâmpago nem de qualquer outro tipo e o mal-estar de Goebbels foi
revelado numa carta que escreveu para sua mulher, Magda, em setembro de 1942:
"Os problemas que a guerra com a Rússia levanta são de
arrasar os nervos, que o diabo a leve! Preciso de uma figura heróica para apresentar
ao povo que não seja o Führer, que tem de permanecer acima disto tudo pelo
próprio fato de ser o Führer."
Ele encontraria essa figura e a descoberta o ajudaria a
evitar as situações mais difíceis da campanha russa. Mas havia situações
igualmente difíceis na sua vida particular e com as quais estava tendo de lidar
continuamente, muito embora fossem criadas unicamente por ele.
O seu casamento deu-se a 12 de dezembro de 1931. O primeiro
dos filhos nasceu-lhe nove meses depois e os outros vieram a intervalos breves.
(Nunca transcorreram mais que apenas alguns meses entre um e outro período de
gravidez de Magda; o último dos filhos nasceu em outubro de 1940). Apenas um
deles foi um menino que, durante sua breve existência, revelou ser uma criança
bastante obtusa. Mas a vaidade de Goebbels foi lisonjeada quando Hitler lhe
disse que "um gênio só deveria ter filhas; um filho seria eclipsado pelo
pai".
Goebbels pôs a culpa da obtusidade do filho e da elevada
proporção de filhas "na natureza fria e rancorosa" de Magda. E Magda
tinha muitas razões para ser assim.
Como Prang observou, certa vez, com uma ligeira confusão de
tendências biológicas, Goebbels estava sempre excitado sexualmente.
Registraram-se breves casos com suas secretárias e astros menores do mundo da
publicidade com o qual estava estreitamente ligado. Suas eventuais companheiras
de leito afirmavam que ele era um amante eficiente. Ele também negou
acaloradamente, quando Magda o descobriu na cama com uma das suas convidadas,
que jamais tivesse concordado em santificar o casamento com a abstinência.
Goebbels era incapaz de atravessar em inatividade sexual o período de
abstinência imposto pela gravidez. Magda, que na vigência do casamento com
Quandt prevaricou muito, encarava romanticamente o seu casamento com o Ministro
da Propaganda e sentia-se humilhada com o fato de ele passar de uma cama para
outra com tanta facilidade. Além disso, com a aproximação da guerra e durante o
seu desenrolar, havia sempre uma lista de espera de pequenas atrizes e mulheres
jornalistas dispostas a suborná-lo com seu corpo em troca de algum favor.
"Isto", disse a Magda cruamente, "faz parte do
trabalho que devo desenvolver pela Alemanha e pelo Führer".
Magda resolveu então que, se seu marido podia enganá-la, ela
podia fazer o mesmo, e começou um caso amoroso com um oficial-de-ligação
norueguês e ameaçou divorciar-se. Goebbels ficou alarmado; o casamento do
Ministro devia ser um exemplo para todos; e se o número de vezes que apareciam
juntos em público pudesse servir de elemento de aferição, o seu casamento era
realmente um sucesso. Houve a reconciliação, que não durou muito, pois Goebbels
então tomou como amante a atriz do cinema tcheco Lida Barova, com quem passou a
viver sem mesmo se incomodar em retornar a casa, para Magda e os filhos. Era
impossível manter secreta a ligação e o escândalo público resultante enfureceu
Hitler. Ele ameaçou Goebbels com a exoneração do ministério e com a
transferência para Tóquio, como um diplomata secundário. Goebbels estava tão
caído por Lida, que nem a ameaça de remoção, nem a mágoa causada à sua colossal
vaidade tiveram efeito. Ele disse a Hitler que iria para Tóquio de bom grado se
pudesse divorciar-se e levar Lida consigo.
Hitler recusou-se a consentir nisso. Seria politicamente insensato
fazer tal substituição na época, como insensato seria também admitir que a
publicidade em torno do processo de divórcio impopularizasse mais o ministro.
(Ele já era amplamente, ainda que sub-repticiamente,
conhecido como "o girino - só tem boca e cauda" - uma piada que
dependia da palavra Schwanz, que significa cauda e também, vulgarmente, pênis.)
Com o envio de Lida a Praga, por ordem de Hitler, escoltada
por dois agentes da Gestapo, e com a censura de seu telefone e de sua
correspondência, reabilitou-se o casamento de Goebbels e Magda. Hitler recebeu
publicidade como o grande salvador das famílias. As fotografias publicadas no
Berliner Illustrierte Zeitung eram revoltantemente piegas, mostrando um Hitler
sorrindo viscosamente, reconciliando o casal depois de "pequenas
tempestades". Goebbels e Magda passaram a ser vistos novamente em público,
e com tal freqüência, que abafaram os boatos de que estavam virtualmente
separados e de que Magda arranjara discretamente outro amante, um tal de Karl
Hanke, enquanto que Goebbels continuava sua procura insaciável de mulheres,
porém de modo mais calmo. A babá das crianças escreveu, mais tarde, que
"Para o observador casual, era um lar muito bem organizado, com crianças
saudáveis, bem comportadas e pais amorosos. Na realidade, porém, a família
estava-se desintegrando, a atmosfera doméstica era opressiva e, em última
análise, intolerável. Temíamos diariamente que uma catástrofe se abatesse sobre
nós".
Catástrofe de natureza menos doméstica se abateu prodigamente
sobre os exércitos alemães, na frente russa, durante 1942. Foi então que
Goebbels encontrou o substituto heróico para o Führer, substituto que
inflamaria a imaginação do público alemão.
O General Erwin Rommel tivera algumas boas oportunidades nos
primeiros meses da batalha da França, quando apareceu como um gênio da guerra
blindada. Ele tinha outras qualidades que o indicavam para o papel de herói
público: seus antecedentes não eram aristocráticos, como sucedia com tantos
generais da Reichswehr, e não só planejava os ataques como também os dirigia
pessoalmente.
E os dirigia de maneira extremamente eficaz - para
considerável embaraço do Ministério da Guerra britânico, que estava recebendo
relatórios sombrios do teatro de guerra da África do Norte. Churchill encontrara
um bode expiatório em Auchinleck, mas encontrar bodes expiatórios nada obstava
aos avanços dos exércitos panzer, que ameaçavam empurrar as forças aliadas para
o mar. Além disso, os próprios britânicos começavam a ter grande respeito por
Rommel, cujas táticas só podiam ser admiradas, que superava seus adversários
com arrojo e tinha sob seu comando a nata das forças blindadas.
Rommel foi imensamente valioso para Goebbels. Do ponto de
vista da propaganda, ele era uma jóia esplendorosa em ruas cheias de escombros
- literalmente, ruas cheias de escombros porque as forças aéreas aliadas haviam
iniciado ataques devastadores contra importantes cidades alemães. Os relatos a
respeito eram relegados aos cantos melo escondidos dos jornais, enquanto que as
páginas principais se enchiam com notícias do heroísmo e do gênio das forças do
deserto. Mudando-se, porém, os tempos, quando as batalhas de Alamein fizeram
Rommel recuar, tornou-se virtualmente impossível apresentar os fatos senão como
fatos.
Nada podia ocultar que piorava a situação dos alemães na
Frente Oriental, que Montgomery começava a bater forte e a mudança de rumo no
Extremo Oriente, após a Batalha de Midway. Com a vitória no deserto, com os
desembarques na costa norte-africana e com a grande batalha diante de
Leningrado, aproximava-se o momento decisivo da guerra. Goebbels viu-se
obrigado a censurar seu pessoal dos jornais e do rádio por desorientar o povo -
especificamente no caso da vitória aliada em Tobruk, a qual eles transmitiram
da seguinte maneira, a 14 de novembro: "As tropas alemãs e italianas
evacuaram Tobruk segundo os planos, após a destruição de todas as instalações militares".
Na conferência do dia, "o Ministro... observa... que o
moral do povo alemão já está bem baixo e que a liderança não deve reduzi-lo
ainda mais, abusando da confiança do povo".
E continuou-se a abusar da confiança do povo. (Naturalmente,
é impossível travar uma guerra com o povo confiando completamente nos generais:
mas há graus de engano justificáveis.) Goebbels emitiu uma diretiva que dizia:
"Devemos neutralizar novamente e negar de maneira resoluta os números
astronômicos publicados pelos bolchevistas sobre nossas baixas na luta em
Stalingrado". Todo o 6° Exército alemão, comandado por Paulus, e parte do
4o Exército Panzer estavam cercados. As baixas sofridas pelo Eixo atingiriam a
cerca de meio milhão de homens. Mas somente dois meses depois, em janeiro de
1943, é que Goebbels faria um comunicado escrito, e de maneira atenuada:
"Na área de Stalingrado, nossas tropas, que há algumas semanas estão
empenhadas em heróica luta defensiva contra um inimigo que ataca por todos os
lados, continuaram a repelir ontem os poderosos ataques da infantaria e das
formações blindadas inimigas, com pesadas baixas para os bolchevistas. Desse
modo, comandantes e soldados deram, mais uma vez, brilhante exemplo do heróico
espírito de bravura alemão". Duas semanas depois Paulus rendeu-se e teve
início uma retirada geral na frente oriental. No resto daquele ano só haveria
as grandes batalhas da Curva do Dnieper. Em fins de fevereiro de 1944 já a
costa do Báltico estava desimpedida; e pouco mais de três meses depois teve início
a invasão da Europa ocupada. Foi uma época espinhosa para Goebbels.
A 8 de setembro de 1943, a Itália capitulou, registrando-se
esse verdadeiro desastre político no pior momento possível para a Alemanha.
"O bloco anglo-americano não pode parar de exultar com a inversão da
situação de 1940, quando a França caiu." A capitulação da Itália só podia
ser atribuída ao "traidor Rei da Itália, que apunhalou pelas costas o
aliado alemão". Goebbels não tinha outro argumento para usar até que Mussolini
foi salvo, por pára-quedistas alemães, da prisão para onde fora mandado pelo
governo Badoglio e colocado à frente de um governo títere instalado no norte da
Itália, ainda ocupado por tropas germânicas. Ele valeu-se do salvamento para
transfundir ânimo no moral do povo. "Do ponto de vista do moral popular, o
salvamento de Mussolini foi tratado de modo a dar a impressão de uma batalha
vitoriosa", observou em suas memórias o comentarista oficial militar
alemão, General Kurt Dittman. Mas não foi uma vitória: foi simplesmente uma
providência destinada a neutralizar o efeito dos desastres que vinham ocorrendo
e dos que estavam iminentes.
Naturalmente, o Serviço de Inteligência alemão sabia que
estava em planejamento a invasão, mas não sabia ao certo o local em que se verificaria.
O Serviço de Inteligência britânico desorientara deliberadamente o Alto Comando
Alemão quanto ao local do principal peso do ataque e quanto à Ordem de Batalha
Aliada. O logro foi muito bem sucedido. Embora impossível a ocultação do fato
de que o ataque seria desfechado na área geral de Cherbourg-Dunquerque, a
incerteza sobre se ele ocorreria na parte leste ou oeste daquela ampla faixa de
costa e se haveria ataques simulados, confundiu consideravelmente os planos
defensivos alemães.
Em sua propaganda, Goebbels adotou o blefe da indiferença e
da ameaça de novas armas, de grande poder de devastação, "para reduzir
Londres a cinzas" à medida que se tornava cada vez mais certo que o verão
de 1944 traria consigo o ponto culminante da guerra. Ele mandou fazer
transmissões para a Grã-Bretanha, destinadas a solapar a confiança no sucesso
da invasão: "Só estamos esperando que vocês cheguem aqui! Então lhes
faremos uma recepção que jamais esquecerão! Não pode haver defesa ou aviso
contra nossa nova arma, que jogará Londres no chão enquanto suas forças
invasoras estiverem sendo obliteradas nos locais de desembarque que vocês
acreditam ser tão secretos".
Às 04:00 h de 6 de junho, ele foi despertado com os primeiros
informes dos desembarques Aliados. "Graças a Deus eles finalmente
chegaram!" exclamou ele para seu criado de quarto. "Agora começa o
último assalto!"
Embora não pudesse fazer muita coisa para difundir a crença
de que a invasão Aliada era um fracasso, já que os ataques, culminando com a
penetração em Avranches, deixaram indiscutivelmente claro que foram um sucesso,
ele recorreu à insinuação velada: "Não quero discutir o fato de que o
inimigo conseguiu alguns êxitos iniciais. Contudo, posso muito bem imaginar -
embora não queira afirmá-lo claramente - que nossa estratégia admite uma
penetração maciça do inimigo no continente para, desse modo, infligir-lhe uma
derrota decisiva". Embora Goebbels não percebesse nada de estratégia e
todos soubessem disso, a insinuação sutil de que ele tinha informações bem fundadas
foi eficaz. E ele acentuou o feito com energia. Os informes oficiais deixavam
transparecer que os exércitos aliados estavam recebendo a corda com que se
enforcariam, que, tão logo estivessem refestelados na França, o nó seria
apertado. As tropas foram informadas disso por meio de panfletos singularmente
tolos. Eram escritos de maneira tosca e a grafia era pior ainda, certamente por
pensarem que o soldado britânico ainda se considerava um Tommy e o marinheiro
um Jolly Jack Tar - apelidos que haviam desaparecido com a guerra do Kaiser;
supunham que ele se retrairia pela ameaça subentendida:
"Tommy! Você acha que Gerry lhe permitiria penetrar
tanto, se não tivesse planos para rechaçá-lo quando chegar a hora? Você sentiu
a urgência na atmosfera e no fundo sabe que a vingança está próxima. Renda-se
agora, antes que sua mulher e sua namorada não possam mais aguardar a sua
volta."
Havia outros papéis que falavam dos perigos que ameaçavam os
entes queridos que haviam ficado em casa:
"Seus oficiais não lhe disseram nada sobre a arma
secreta do Gerry que está bombardeando dia e noite as casas e os castelos de
sua pátria e que neste exato momento pode ter arrasado seu lar, com seus entes
queridos dentro? O Alto Comando Alemão não é tão ingênuo quanto você pensa. A
invasão já fracassou. Você jamais chegará ao solo alemão! Espere e verá!"
Outros panfletos se concentravam na pornografia grosseira.
Sefton Delmer, o jornalista britânico que foi transferido para o Departamento
de Inteligência Política do Ministério das Relações Exteriores durante a
guerra, diz-nos que na França, em 1939, "um risonho tenente francês"
lhe mostrou uma das tentativas de Goebbels de desmoralizar as tropas francesas.
"Ela consistia de um pequeno retrato, impresso em papel muito fino, mostrando
um soldado francês cumprindo seu dever na frente de batalha. Mas quando se
colocava esse retrato contra a luz, a cena mudava completamente. No lugar do
bravo poilu, via-se, com todos os detalhes, um soldado britânico fornicando com
o que a legenda chamava de a noiva do francês." A tentativa foi bem
sucedida, pois intensificou uma situação de desmoralização que já existia; mas
a repetição do golpe fracassou, quando dirigido ao soldado britânico de
invasão. Neste caso, o cérebro que bolou a trama colocou um pracinha americano
fornicando, segundo a legenda, com a namorada de um inglês.
A arma secreta citada era, naturalmente, o avião sem piloto
que o próprio Goebbels batizara de "a arma da vingança [Vergeltung]".
A primeira dessas bombas-voadoras foi lançada nove dias após o Dia
"D", a 15 de junho, e os primeiros foguetes fizeram as suas
devastadoras parábolas a 8 de setembro. Visavam os nazistas, com tais armas,
tanto à desmoralização quanto à destruição; mas os sucessos Aliados nos
arredores de Caen e na França Ocidental, no Extremo Oriente (onde as tentativas
que os japoneses fizeram de invadir a Índia foram repelidas na batalha de
Imphal), e na Frente Oriental, onde o avanço russo até a Polônia e o levante da
resistência em Varsóvia haviam dizimado o que restava dos exércitos alemães,
foram como goles de vinho tonificante para um povo que havia sofrido calamidade
atrás de calamidade até o ano decisivo de 1942. Era impossível a mais leve
sombra de desmoralização. A "arma secreta" chegou tarde demais para vingar-se.
O avanço de cinco dias do 2o Exército de Montgomery, desde o Sena até
Antuérpia, havia levado de vencida todos os locais de lançamento no Passo de
Calais, e os ataques realizados por bombardeiros pesados aos centros de
produção reduziram seriamente as quantidades fabricadas. Muita destruição foi
causada (mais de um milhão de casas foram destruídas ou danificadas) e as
baixas entre civis foram numerosas, mas nada podia ocultar o fato de que a
Alemanha estava sendo submetida a um verdadeiro processo - de esmagamento pelos
Aliados. E, embora houvesse reveses - os desembarques aeroterrestres em Arnhem
e o ataque final de Hitler nas Ardenas foram exemplos disso - a situação na
Grã-Bretanha foi aliviada, em todos os sentidos, inclusive pela notícia do atentado
contra a vida de Hitler, a 20 de julho, e pela suspensão do black-out. Para
Goebbels, não tendo mais cabida a propaganda, tudo terminado. Com os exércitos
aliados nas fronteiras alemães, nada justificava qualquer tentativa de
convencimento de que havia esperanças e muito menos possibilidades de triunfo.
Mas, houve uma medida que lhe aumentou ainda mais o poder pessoal. No dia
seguinte ao atentado em Rastenburg (20 de julho), Hitler conferiu-lhe o titulo
de Diretor do Reich para Guerra Total.
Ele disse numa transmissão radiofônica: "Ontem o Führer
baixou uma ordem, publicada hoje pela imprensa, determinando uma reformulação
dos órgãos do Estado, ferrovias, correios, instituições públicas em geral, as
organizações e empresas particulares, com vistas a liberar o maior número de
homens para a indústria de armamentos e para as Forças Armadas, através de um
emprego ainda mais racional dos que agora servem nas mencionadas empresas,
eliminando ou diminuindo as tarefas menos importantes para o esforço de guerra,
e através de uma simplificação da organização e dos procedimentos. Também de
acordo com essa ordem, toda a vida pública tem de ser adaptada, em todos os
aspectos, às necessidades da guerra total. A atividades públicas têm de se
conformar com os objetivos da guerra total e, em particular, não podem tirar
ninguém das forças armadas nem da indústria de armamentos; numa palavra, a
guerra total está em prática. A orientação dessa gigantesca reforma cabe ao
Curador do Reich para a Guerra Total, que para se desincumbir da missão
receberá do Führer amplos poderes. A pedido do Marechal do Reich, o Führer
confiou-me essa tarefa e nomeou-me Curador do Reich para a Guerra Total"
A primeira "medida prática" foi chamar às contas os
conspiradores do complô de Rastenburg. Eles atingiram a casa dos milhares, pois
os arquivos de Himmler foram cuidadosamente examinados em busca dos que
tivessem, em qualquer momento, deixado margem à mais leve suspeita de
envolvimento. Todos foram assassinados ou mandados para campos de concentração
sem julgamento. Mas os participantes mais importantes da conspiração tinham de
ser transformados em exemplo. Somente Rommel, um dos envolvidos, teve permissão
de cometer suicídio para escapar ao julgamento. Os oito líderes da conspiração
foram surrados, torturados, submetidos a um arremedo de julgamento e enforcados
em cordas de piano amarradas em ganchos de carne, sendo o garroteamento bem
prolongado, para infligir o máximo de dor.
Terminados seus dias de propagandista, Goebbels transformou
em válvulas de escape a maldade e a profecia sombria. Sua maldade,
exemplificada na carnificina que promoveu entre os pretensos atacantes do
Führer, foi uma demonstração da capacidade que tinha de se mutifacetar. O
talento natural que possuía para deturpar a mente do povo transmudou-se em
talento para torcer corpos. Quanto às suas profecias sombrias, elas tomaram a
forma de negativas de que ainda houvesse flechas na aljava alemã. "Não nos
enganemos", disse ele na conferência da manhã de 29 de novembro de 1944,
"não nos resta nada. Não existem armas miraculosas!"
Era o reconhecimento da falência da sua própria propaganda.
Desde a invasão, ele vinha berrando por todos os meios ao seu alcance, que a
situação seria salva pelas armas miraculosas, pela brilhante estratégia do
Führer, pelo heroísmo das forças alemães e pela implacável resistência do povo
germânico contra as "hordas bolchevistas" que avançavam. Depois das V-1
e V-2 não houve surpresas em armas; o valor das forças alemães foi superado
pelo simples peso dos números; a estratégia do Führer era tão louca quanto ele
próprio; e a ameaça das hordas bolchevistas que se aproximavam fazia com que a
população das cidades por onde deveriam passar arrumassem seus pertences e
fugissem, bloqueando as estradas para tropas e suprimentos.
Apesar do desespero com que encarava o futuro, Goebbels
conseguiu animar um pouco o perdido entusiasmo quando a batalha das Ardenas foi
travada, no Natal de 1944. Ele arengou que o inimigo teve de abandonar todos os
planos de ataque diante da arremetida dos exércitos alemães. Anunciou alegre
que o Comandante do 47° Corpo Blindado alemão exigira a rendição da Bastogne e
que o final vitorioso da campanha das Ardenas estava próximo. (Ele não
acrescentara que o comandante americano dos defensores da Bastogne havia
respondido, com vigor, com uma única palavra: "Nuts!") Realmente, o
fim estava próximo - da campanha das Ardenas e de tudo o mais; mas não com a vitória
das forças nazistas. Os berros de alegria de Goebbels transformaram-se em
resmungos de possível concordância entre a Grã-Bretanha, Estados Unidos e
Alemanha numa luta unida contra o Terror Vermelho do Bolchevismo. Se podia
acreditar em tal fantasia, ele podia acreditar em qualquer coisa - inclusive na
possibilidade de um movimento de resistência da ralé da cidade, chamado
"Os Lobisomens", para defender Berlim até a última trincheira.
Não havia nada mais que uma defesa simbólica de Berlim. A 22
de abril de 1945, as tropas russas entraram nos subúrbios norte da cidade.
Hitler estava em seu abrigo subterrâneo, na Chancelaria, tendo acessos de fúria
e ditando comunicados radiofônicos dirigidos ao povo, afirmando que o Führer
ficaria em Berlim e morreria com o povo, se necessário. Ele então mandou chamar
Goebbels, Magda e seus filhos, certo de que eram os únicos seguidores que
ficariam na sua companhia até o fim - "Tudo o mais é traição, corrupção,
mentira e covardia". Ele tinha boas razões para a explosão. Goering estava
em Obersalzburg, aguardando a ordem para assumir a liderança do Reich e Himmler
estava em Lübeck, cooperando secretamente com o Conde Bernadotte para
apresentar uma nota de rendição ao General Eisenhower, contanto que ele,
Himmler, recebesse poderes ditatoriais. Goebbels veio imediatamente, trazendo
Magda e as crianças. Durante seis dias eles permaneceram com Hitler e sua
amante, Eva Braun, enquanto os russos cercavam a cidade e as bombas caíam sobre
a Chancelaria. Na manhã de domingo, 29 de abril, ele foi convocado para a
tarefa macabra de ser padrinho do casamento do Führer. Imediatamente após a
cerimônia, ele o nomeou Chanceler designado do Terceiro Reich por decreto
(Goering, Himmler e Ribbentrop sendo eliminados como traidores) e ordenou-lhe
que deixasse Berlim, com sua família, enquanto - segundo se pensava - havia
tempo.
Mas Goebbels negou a si mesmo, e à sua família, a pequena
possibilidade de fuga.
Assim fazendo, provou o seu amor fanático pelo Führer.
E TERMINOU TUDO COMO TODO MUNDO JÁ SABE!
FONTE
http://www.segundaguerramundial.com.br/wrapper.php?idLink=309
OS ONZE
PRINCIPIOS DE GOEBELLS
(Luiz Nassif)
Conhece
Joseph Goebbels, o violento ministro de propaganda de Hitler?
Estes são
os 11 princípios que levaram o povo alemão a tentar exterminar à humanidade:
1.-
Principio da simplificação e do inimigo único.
Simplifique não diversifique, escolha um inimigo por vez.
Ignore o que os outros fazem concentre-se em um até acabar com ele.
2.-Princípio
do contágio
Divulgue a capacidade de contágio que este inimigo tem.
Colocar um antes perfeito e mostrar como o presente e o futuro estão sendo
contaminados por este inimigo.
3.-Princípio
da Transposição
Transladar todos os males sociais a este inimigo.
4.-Princípio da Exageração e desfiguração
Exagerar as más noticias até desfigurá-las transformando um
delito em mil delitos criando assim um clima de profunda insegurança e temor. “O que nos acontecerá?”
5.-Princípio da Vulgarização
Transforma tudo numa coisa torpe e de má índole. As ações do
inimigo são vulgares, ordinárias, fáceis de descobrir.
6.-Princípio
da Orquestração
Fazer ressonar os boatos até se transformarem em noticias
sendo estas replicadas pela “imprensa oficial’.
7.-Principio
da Renovação
Sempre há que bombardear com novas notícias (sobre o inimigo
escolhido) para que o receptor não tenha
tempo de pensar, pois está sufocado por elas.
8.-Princípio
do Verossímil
Discutir a informação com diversas interpretações de
especialistas, mas todas em contra do inimigo escolhido. O objetivo deste
debate é que o receptor, não perceba que o assunto interpretado não é verdadeiro.
9.-Principio
do Silêncio.
Ocultar toda a informação que não seja conveniente.
10.-Principio
da Transferência
Potencializar um fato presente com um fato passado. Sempre
que se noticia um fato se acresce com um fato que tenha acontecido antes
11.-Princípio
de Unanimidade
Busca convergência em assuntos de interesse geral
apoderando-se do sentimento produzido por estes e colocá-los em
contra do inimigo escolhido.
Qualquer semelhança com as práticas do PIG é pura
coincidência....
Não é preciso ir à Alemanha de Goebbels para encontrar estes
princípios, muitos deles foram extraídos
da História do Império Romano e chegaram ao Brasil com os colonos portugueses:
1.- Principio da simplificação e do inimigo único.
Os romanos chamavam de "bárbaros" todos os povos
que viviam nas "terras incógnitas" (além das fronteiras). Eles eram
desprezados e, desde Políbio, deveriam ser civilizados, romanizados por Roma.
Cá chegaram uns colonos portugueses que descendiam de tribos
lusitanas reduzidas à submissão por Roma que foram se misturando aos soldados
romanos enviados para a Lusitânia. Eles tratavam centenas de povos por
"índios", muito embora não estivessem na Índia. Os costumes destes
povos eram desprezados, as diferenças entre eles eram irrelevantes.
"Sou reacionário. Minha reação é contra tudo que não
presta." Nelson Rodrigues.
Pesquisa:
Karlão-Sam.