RAPAZ USA BECA E SALTO ALTO EM CERIMÔNIA DE FORMATURA NO CEARÁ.


O jovem Victor Kláus Queiroz de Oliveira, de 23 anos, acabou se destacando nas mídias sociais após mostrar sua espontaneidade na formatura do curso de tecnologia em agronegócio pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), em Quixadá (CE), cidade a cerca de 170 km de Fortaleza. A cerimônia foi realizada em 6 de junho deste ano e o formando, que é homossexual, vestiu beca, se maquiou e usou sapato de salto alto.
A imagem, em um primeiro momento, chama a atenção de quem não conhece Kláus, mas a fisionomia andrógina dele já é conhecida dos amigos, professores e familiares. Apesar de usar maquiagem, ele tem corte de cabelo estilo “militar”, raspado na lateral da cabeça. “Comecei a usar salto alto em maio de 2011, quando assumi esse estilo mais andrógino. Na minha formatura, não quis levantar a bandeira de uma minoria, embora eu seja gay, não quis fazer um protesto. Eu me visto assim, me maquio todos os dias”, disse ele ao G1.
Kláus foi escolhido para ser o orador da turma


(Foto: Victor Kláus/Arquivo pessoal)
Kláus é carismático e se comunica com facilidade. Por essa razão, foi escolhido para ser o orador da turma de tecnólogos. Do alto de um salto de 10 cm, ele caminhou até o púlpito e fez seu discurso. Em um trecho final, depois de citar memórias sobre os três anos de curso e convívio com colegas, ele falou sobre a dignidade humana.
“Esperamos nós todos que cada um de vocês aqui presente dissemine ao menos um pouco da mensagem que aqui está sendo repassada! Todo ser humano é digno de respeito, não por sua condição social, religiosa, racial, sexual ou qualquer outra que seja, mas sim pela sua condição humana”, disse Kláus.
Para a diretoria e professores do IFCE, a atitude de Kláus na formatura não causou surpresa. A solenidade foi organizada pela diretoria e pelo setor de cerimonial da instituição. “Nós sabiamos de tudo que iria acontecer. Ali, era o Victor que a gente conhecia. A gente nunca estranhou”, afirmou o chefe de gabinete do campus do IFCE de Quixadá, Saulo Rêgo.
Segundo a instituição, Victor Kláus era um dos estagiários bolsistas do gabinete e sempre foi um dos mais elogiados pela pró-atividade e criatividade. “Ele, inclusive, era motivo de admiração porque nunca negou a opção dele, principalmente aqui em Quixadá, numa região que é sertão com resquícios do machismo”, disse o chefe de gabinete. A diretoria do IFCE também afirmou que não recorda de nenhum episódio em que ele tenha sofrido preconceito dentro do campus.
Celebridade
Segundo Kláus, Ellen Camurça, prima de uma formanda, foi quem fez a foto que o tornou uma celebridade na internet. “Coloquei a foto em meu álbum restrito no Facebook, mas um amigo a copiou e tornou a foto pública. Por causa dela, me vestiram uma camisa homossexual, como se eu fosse uma liderança gay. Ótimo, estou gostando de assumir essa bandeira”, afirmou o tecnólogo, ainda assustado com a repercussão do caso. Segundo ele, muitos gays passaram a procurá-lo como referência.



Coleção de sapatos de Kláus (Foto: Victor Kláus/
Arquivo Pessoal)
Hoje, a foto é compartilhada em diversos perfis na rede social. Algumas até citando erroneamente que Kláus está se formando em direito, outros em administração de empresas. Em outros perfis até confundiram o diretor geral do campus da IFCE, Aristides Souza Neto, com o ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo Kláus, na cidade onde mora ele não conhece outro homossexual que ande pelas ruas de salto alto. “Sou o único por aqui. Alguns conhecidos meus já tentaram, mas é difícil. Hoje tenho 12 pares. Comprei todos pela internet, pois é difícil encontrar um do tamanho do meu pé. Eu calço 38/39 e as lojas convencionais só têm sapato até 37. Eu até olho vitrine, mas fico sem comprar. Atualmente tenho dois com salto de 15 centímetros e o restante é salto 10 e 7.”
Preconceito
O tecnólogo disse ao G1 que já sofreu preconceito em Quixadá. “E foi de heterossexuais e de homossexuais. A sociedade exige que se vista um rótulo, mas eu nunca me defini com uma imagem. Sempre fui consciente da minha identidade sexual. Moro na América do Sul, Brasil, Nordeste, Ceará, Quixadá. É muito difícil se expressar aqui pelo nível cultural das pessoas, mas a gente faz o que pode. Até mesmo entre os gays somos discriminados.”

Kláus, no entanto, disse que, apesar disso incomodar bastante, consegue suportar o preconceito. “Felizmente as agressões são verbais. Mas de uma forma ou de outra é sempre ruim ser discriminado. Felizmente nunca sofri violência física.”
Família de vaqueiros
Nascido em uma família de vaqueiros tradicionais na região de Quixadá, Kláus afirmou que a receptividade familiar quando anunciou que era gay não foi boa. “Não sou o primeiro homossexual da família. Os exemplos de homossexuais que tivemos não foram positivos. Um acabou virando garoto de programa e outro está com HIV. Por isso, minha família se assustou quando assumi ser gay. Com o tempo, vendo que eu estudava e não tinha o mesmo perfil desses meus parentes homossexuais, começaram a me aceitar melhor.”

Apesar disso, Kláus ainda não consegue manter um convívio tranquilo com o pai. “Para ele, seria mais fácil eu fosse mais feminino, me travestisse, se me caracterizasse como mulher. Eles não entendem o conceito de androginia. Minha mãe foi quem sempre me aceitou bem, mas não falo com meu pai desde os 15 anos.”
Ele disse ainda que usa maquiagem desde os 12 anos de idade e que viveu alguns anos tentando entender o que se passava com ele. “Dos meus 12 aos 15 anos eu ainda estava tentando me descobrir. Tive meu primeiro beijo homossexual com quase 15 anos. Foi aí que eu tive a certeza do que eu queria, do que eu sentia. Foi quando tornei público que era gay.”
Profissão
Mesmo formado como tecnólogo em agronegócio, Kláus ainda está desempregado. “Fui bolsista por 22 meses. Não teria como pagar a faculdade. No Ceará, por conta do nosso clima, o agronegócio ainda é fraco. A proposta do curso era justamente desenvolver esse setor no estado e em algumas cidades no interior”, afirmou.

Kláus espera que sua homossexualidade não seja fator impeditivo para seleção profissional. “Imagino que meu perfil sexual não seja empecilho para me empregar. Minha atuação é mais administrativa. Mas, infelizmente, as pessoas ainda olham os gays com certo tabu.”
Fonte: Estadão


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