MPF-DF INVESTIGA FALTA DE FORNECIMENTO DE REMÉDIOS DE
ALTO CUSTO
A aquisição desses medicamentos envolve valores que
somam quase R$ 20 milhões. Pessoas vítimas de doenças raras relatam piora em
seus quadros de saúde.
Os
contratos de compra de quatro remédios para atender pacientes com doenças raras
foram colocados sob suspeita em apuração do Ministério Público Federal (MPF) e
a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A aquisição de três desses
medicamentos envolve valores que somam quase R$ 20 milhões. Pessoas vítimas de
doenças raras têm reclamado de atrasos na entrega de remédios de alto custo
desde o fim de 2017 e relatam piora em seus quadros de saúde.
O MPF do
Distrito Federal investiga a compra de três remédios - Myozyme (para a doença
de Pompe), Fabrazyme (doença de Fabry) e Alurayme (Mucopolissacaridose tipo 1).
As três doenças são causadas por deficiências de enzimas e afetam múltiplos
órgãos. A empresa Global Gestão em Saúde venceu a licitação em outubro e não
entregou os medicamentos, mesmo tendo recebido R$ 19,9 milhões do governo
federal com antecedência.
A empresa
também não seria, segundo o MPF, uma distribuidora autorizada pelo fabricante
dos remédios, a empresa Sanofi Genzyme. O órgão afirma que 152 pacientes seriam
beneficiados pela compra.
Diante
disso, o MPF recomendou que o ministério convoque a segunda colocada na
concorrência para que ela forneça os remédios pelo mesmo valor ou que abra novo
processo de compra.
No outro
caso, a Anvisa detectou problemas com os documentos de importação da empresa
responsável por comprar o Soliris, indicado para quem tem a doença
hemoglobinúria paroxística noturna (HPN), mutação genética que destrói os glóbulos
vermelhos do sangue.
A empresa
Tuttopharma LLC não apresentou documentação necessária para importar o
medicamento. O fabricante do remédio também disse que a empresa não é
distribuidora autorizada do produto.
Os
problemas nas transações dos quatro remédios aconteceram entre janeiro e
fevereiro e se referem a processos de compra feitos em 2017. O Soliris está
entre os remédios que lideram o ranking de judicialização.
Sofrimento
Enquanto
isso, os pacientes com doenças raras têm sido prejudicados por problemas de
distribuição. Há quatro meses, eles estão sem o remédio e, segundo parentes e
entidades que os apoiam, apresentam piora de seus quadros de saúde. Ao menos
sete medicamentos estão em atraso - quatro deles são os que tiveram problemas
no processo de compra.
No dia 15
de dezembro, dez dias após completar 18 anos, Jucilene Pedrosa, que recebia um
dos medicamentos para Mucopolissacaridose do tipo 1, não resistiu aos efeitos
da doença. Segundo a família, ela ficou sem a medicação por dois meses, após
tomá-la por um ano.
"Interrompeu
de vez em novembro. A última infusão foi no dia 10 de outubro, depois, não
chegou mais. Notei que ela estava mais cansada e com mais dificuldade para
andar. No dia do aniversário dela, 5 de dezembro, ela pediu uma festa, mas teve
convulsão, parou de andar e de comer. Ficou internada e não voltou mais para
casa", contou a irmã, a estudante Janaíra Pedrosa, de 22 anos.
Agora, a
preocupação da família é com o outro irmão, Jucilan, de 14 anos, que tem a
mesma doença e também está sem a medicação. De acordo com balanço do Instituto
Vidas Raras, 15 pacientes de doenças desse tipo morreram desde outubro.
Um dos
pacientes que conseguiram na Justiça o direito de receber o remédio Soliris foi
o gerente administrativo Ricardo Ferreira, de 34 anos, que tem a HPN. Ele conta
que, desde a metade de 2017, os problemas com a distribuição tiveram início e
que ele precisou ser internado quatro vezes desde setembro. "Recebi doses
emergenciais do remédio, mas já acabaram. A tortura não acaba", diz.
Aquisições
emergenciais
Em nota, o
Ministério da Saúde informou que aquisições dos quatro remédios foram
realizadas em caráter emergencial por se tratar de uma demanda judicial e
seguiu concorrência prevista na Lei de Licitações. Também afirmou que a
Advocacia-Geral da União vai acompanhar o caso.
Sobre o
Soliris, o diretor-presidente da Anvisa, Jarbas Barbosa, disse que a
documentação faz parte das exigências básicas para importar medicamentos e é o
que garante que os pacientes vão receber remédios seguros. "O objetivo é
que não cheguem medicamentos falsificados."
A
reportagem não conseguiu localizar a empresa Tuttopharma LLC, responsável pela
compra do Soliris. A Alexion, fabricante do remédio, confirmou que a
Tuttopharma não é distribuidora oficial
Já a Global
Saúde, responsável pelos outros três remédios, disse que uma de suas empresas
parceiras é credenciada com a fabricante, mas que "foi surpreendida com a
recusa da Sanofi Genzyme em entregar os medicamentos". A Sanofi informou
que a Global não integra o grupo de distribuidores credenciados.
As informações
são do jornal O Estado de S. Paulo.